Operação sobre Serra abala PSDB e cria dilema para Doria

Mesmo fora do centro de decisões do partido, senador é considerado um símbolo tucano

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São Paulo

A investida da Operação Lava Jato sobre o senador José Serra (PSDB-SP) abalou a cúpula do tucanato e apresentou um novo dilema para o maior expoente da sigla, o governador João Doria (SP).

Serra e Doria durante evento no Diretório Estadual do PSDB, em julho do ano passado
Serra e Doria durante evento no Diretório Estadual do PSDB, em julho de 2019 - Marcelo Chello - 24.jul.2019/CJPress/Folhapress

Amigos próximos do tucano não conseguiram conversar com ele, que está confinado em uma praia na Bahia desde o começo da pandemia da Covid-19, em um primeiro momento. O clima na velha guarda do partido é de desalento.

Não que a ação em si, que envolveu busca e apreensão e a denúncia do senador, tenha pego alguém de surpresa. Há meses aliados de Serra comentavam sobre a possibilidade, e se diziam preocupados especialmente com a mira sobre a filha dele, Verônica.

Mas, uma vez ocorrida, a ficha caiu de vez para dirigentes. É mais um grão-tucano, integrante da turma que fundou o partido e deu a estrutura para que ele se tornasse o principal ator da política brasileira a partir de 1994, ao lado do PT, abatido.

A avaliação inicial das lideranças é de que as acusações são graves e colocam Serra numa posição difícil, juridicamente.

Do ponto de vista político, independentemente do mérito do que a Lava Jato apura, o estrago parece irremediável. E isso afeta o PSDB como um todo, como de resto o PT e outros partidos já foram.

Basta ver as chances do partido de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições municipais deste ano para entender as dificuldades, mesmo com o desastre político do governo Jair Bolsonaro, de voltar ao jogo competitivo nacional.

Nos últimos anos, entre os tucanos caíram em desgraça figurões como Aécio Neves, que por muito pouco não virou presidente na eleição de 2014, e os ex-governadores Marconi Perillo (Goiás) e Eduardo Azeredo (Minas Gerais, que chegou a ser preso e deixou a sigla).

O nome do operador Paulo Vieira de Souza tornou-se símbolo da toxicididade do longo reinado do partido em São Paulo, que governa nominalmente desde 1995, com exceção de dois interregnos de vices aliados.

Para alento relativo da nova geração que comanda o PSDB, a velha guarda tem esse nome justamente por não estar mais dando as cartas como antes. Serra, apesar de ter mandato, não tinha mais peso decisivo em decisões internas da sigla há algum tempo.

O grupo histórico vinha apostando na figura do governador gaúcho, Eduardo Leite, como herdeiro de seu capital político dentro da sigla, já que a relação do grão-tucanato com o Doria nunca foi das mais próximas.

Na prática, contudo, é o paulista quem manda no partido. E por isso a conta do episódio com Serra preocupa seus aliados.

Doria, desde sua ascensão meteórica de relativo desconhecido a prefeito de São Paulo em 2016, sempre se pautou pelo discurso da intolerância no campo ético. Sempre foi um entusiasta da Lava Jato e do então juiz Sergio Moro, que encarnava a operação.

Afastou de seu governo, já no Palácio dos Bandeirantes, aliados vitais como Gilberto Kassab (PSD) e Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), enrolados com acusações diversas.

O tucano ensaiou um embate para expulsar Aécio do PSDB, e perdeu até aqui. Aliados dele se perguntam se teria coragem de fazer o mesmo com Serra, caso as denúncias tomem corpo como realidade.

O dilema aumenta em intensidade porque Doria é hoje o principal presidenciável na praça. O tucano assumiu o protagonismo na frente de governadores que se opõe ao governo Jair Bolsonaro, particularmente no manejo da crise do novo coronavírus.

Ele tem trabalhado em conjunto com o DEM e com o MDB para formar o embrião de uma aliança que o viabilize como candidato em 2022, ou que o posicione para uma disputa-relâmpago na hipótese de a chapa Bolsonaro-Hamilton Mourão ser cassada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Débitos no campo da corrupção, por maior que seja a distância entre Serra e Doria, cairão na conta do governador. Além do fastio do eleitorado com corrupção, do lado adversário poderá também estar não só Bolsonaro, mas o agora ex-ministro Moro e seu discurso moralizante.

O tucano está de mãos amarradas porque tudo o que surgiu até aqui contra o senador ainda precisa ser materializado.

Se Serra fosse culpado de forma indiscutível, Doria poderia defender um expurgo geral no PSDB. Como isso não está colocado, a tendência é sangrar junto com o partido. Ou, como sempre especulam seus aliados, buscar uma outra sigla para seguir seu projeto.

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