Descrição de chapéu Palanque Bandeirante

Tema de disputa com Bolsonaro, privatizações e extinções ficam aquém do previsto por Doria

Governo tucano afirma que gestão paulista tem marca liberal e lista grandes concessões de rodovias e do metrô

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São Paulo

De olho na disputa pela Presidência da República em 2022, João Doria (PSDB) e Jair Bolsonaro (sem partido) buscam viabilizar prometidas concessões e privatizações que renderam a ambos o apoio do mercado e a marca liberal durante a eleição.

O tema é considerado estratégico para os dois. Neste mês de abril, o governo Bolsonaro realizou uma série de leilões bilionários de infraestrutura —a arrecadação em bônus somou R$ 3,5 bilhões, e os vencedores dos leilões terão que investir R$ 10 bilhões.

Já Doria fará o leilão das linhas 8 e 9 da CPTM, além do edital de concessão de aeroportos estaduais.

Na esfera federal, o leilão dá forças para que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, seja cotado para ocupar a vaga de vice de Bolsonaro na eleição de 2022.

Não é diferente no âmbito do estado. O vice de Doria, Rodrigo Garcia (DEM), é o responsável pelas parcerias público-privadas (PPPs) e também busca se credenciar para o próximo pleito, quando pretende concorrer ao governo do estado.

Questionado pela Folha sobre a marca da gestão Doria/Garcia, o vice mencionou, além da vacinação e do combate à pandemia, a participação da iniciativa privada. “Um governo comprometido com o enxugamento da máquina pública e com as parcerias da iniciativa privada, atraindo investimentos que geram empregos e crescimento econômico."

A plataforma de privatizações de Doria, no entanto, sofre críticas até por parte de liberais, por ter ficado aquém do propagandeado pelo tucano.

As concessões e extinções programadas pela gestão esbarraram em entraves jurídicos e políticos, já que a Assembleia de São Paulo barrou parte do enxugamento previsto em órgãos estatais.

Ainda assim, auxiliares do governador afirmam que a austeridade, o envolvimento da iniciativa privada, a busca de doações e a credibilidade junto ao mercado são características do governo Doria.

Dizem ainda que o tucano é exemplo de gestor liberal no Brasil e que, em eventual campanha em 2022, a pauta de concessões e PPPs será central.

​“O nosso governo em São Paulo é um governo liberal, que aposta na livre iniciativa e que acredita que programas de concessões, parcerias público-privadas e privatizações melhoram a condição e a qualidade do serviço público”, declarou Doria em março de 2019, meses após assumir o governo.

Mas promessas em relação a privatizações, como a concessão de presídios e da hidrovia Tietê-Paraná, não devem sair do papel. A Secretaria de Governo, pasta comandada por Garcia e responsável pela área, afirma que os modelos de editais para os dois casos estão em estudos.

Assim que assumiu, em janeiro, Doria prometeu a PPP dos presídios ainda para 2019.

“O processo da PPP para a construção e administração de presídios em SP está em andamento. Já há um edital preparado para publicação do projeto através de gestão compartilhada. Nesse caso, o poder público constrói as unidades prisionais e oferece a gestão ao particular”, diz a Secretaria de Governo em nota.

Também houve entraves em grandes projetos. O trecho norte do Rodoanel, por exemplo, teve a licitação para a retomada das obras contestada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). A entrega de parte da obra estava prevista para 2022, e a administração da rodovia já havia sido entregue à iniciativa privada.

O governo Doria, então, resolveu relicitar as obras e a operação do trecho norte. A construção, agora, deve ter início em 2022, um revés para o tucano que tinha no Rodoanel uma vitrine de mobilidade e de parceria público-privada.

“Não há casos problemáticos, há decisões de governo. Com a suspensão da licitação, o conselho gestor de PPPs, com o propósito de acelerar a entrega desta obra tão importante para a logística do país, aprovou uma concessão que englobasse a finalização das obras e a operação do trecho pelo setor privado”, afirma a pasta.

O governo conseguiu aprovar na Assembleia Legislativa de São Paulo a concessão de parques em Campos do Jordão (SP), do Zoológico e do Jardim Botânico —avanços considerados tímidos. Outras privatizações de maior porte, como a do Ginásio do Ibirapuera, pararam na Justiça.

Procurado pela Folha, Garcia afirmou que a agenda de parcerias e concessões avançou muito, mencionando o lote Piracicaba-Panorama (concessão de 1.273 km de estradas pelo estado no valor de R$ 14 bilhões) e a linha 6-laranja do metrô (orçada em R$ 15 bilhões).

As próximas medidas na área de privatizações são o leilão das linhas 8-diamante e 9-esmeralda da CPTM, marcado para esta terça-feira (20), e o lançamento do edital, previsto para maio, para a concessão de 22 aeroportos no interior.

O leilão das linhas chegou a ser suspenso pelo TCE em fevereiro, mas foi liberado. De qualquer forma, há atraso em relação ao cronograma inicial, que previa a assinatura do contrato no início deste ano.

Secretários ouvidos pela Folha afirmam que a orientação de trazer recursos privados para financiar projetos vale para todas as pastas. Uma das principais entregas de Doria na pandemia, inclusive, foi totalmente bancada por doações.

A nova fábrica do Butantan ultrapassou a meta de doações de R$ 160 milhões e deve ser inaugurada em setembro. No total, mais de 30 empresas contribuíram. O governo, no entanto, sob o argumento de que a verba é privada, não informa o valor cedido por cada companhia.

A reforma do Museu do Ipiranga também é bancada com recursos privados –R$ 188 milhões e 16 empresas patrocinadoras. O museu estava fechado desde 2015 e tem inauguração prevista para setembro de 2022.

Na área do Meio Ambiente também há uma série de projetos que dependem da iniciativa privada, como a Usina SP (espaço de lojas e restaurantes no Rio Pinheiros), a ciclovia da marginal Pinheiros e a instalação de uma roda gigante na zona oeste da capital.

Ainda no campo da diminuição do estado, promessas de Doria a respeito de extinção de estatais tiveram entraves políticos e burocráticos. O governador já extinguiu nove estatais, mas o encerramento das atividades leva tempo e muitos processos devem se arrastar até o fim do ano.

A Dersa, por exemplo, que Doria tentou extinguir em maio de 2019, mas não teve maioria na Assembleia, acabou extinta em setembro daquele ano após recomposição da base no Legislativo. Mas o processo de liquidação da estatal só deve terminar no fim deste ano.

Em outubro passado, Doria só obteve maioria na Assembleia para aprovar seu projeto de ajuste fiscal depois que o governo desistiu de extinguir quatro estatais: Furp, Fosp, Imesc e Itesp.

O ajuste acabou extinguindo outras estatais —Fundação Parque Zoológico de São Paulo; Instituto Florestal; CDHU; EMTU; Sucen e Daesp. Em 2019, Codasp, CPOS e Emplasa foram extintas. A Imprensa Oficial foi absorvida pela Prodesp.

Segundo a Secretaria de Governo, a extinção de Codasp, Emplasa, Fundação Zoológico, Daesp e Sucen representa economia anual de cerca de R$ 210 milhões –mas mais de 1.200 funcionários foram demitidos.

“CPOS e Dersa representam um prejuízo acumulado de R$ 573 milhões. A CDHU e EMTU são empresas que somam mais de mil funcionários e prejuízos acumulados de R$ 5,7 bilhões e terão a sua completa liquidação em 2022”, diz a pasta.

A extinção da Dersa, estatal de desenvolvimento rodoviário que está no centro de um escândalo de corrupção de governos tucanos, era prioridade para Doria, que queria desvincular sua gestão das denúncias.

Para Alberto Leonardo da Rosa, diretor jurídico do Sincohab (sindicato de trabalhadores de empresas e cooperativas habitacionais), as extinções são um equívoco e atendem a empresas interessadas em explorar o patrimônio das estatais.

“A CDHU é superavitária, não depende dos cofres públicos. Então essa justificativa de economia vai por água abaixo”, diz Alberto à Folha.

Alberto vê prejuízo não só para 500 funcionários e 1.000 terceirizados que serão demitidos, mas também nas entregas de moradias populares e, sobretudo, na imagem de Doria para a próxima eleição.

“Dizem que a CDHU vai ser suprida por empresas privadas, mas a CDHU nunca concorreu com empresas privadas, porque o enfoque é a população de baixíssima renda. A extinção é um processo que ignora o bem-estar da população”, diz.

“Não vejo como isso trazer benefício eleitoral, porque a CDHU sempre funcionou como cabo eleitoral, por estar presente em todos os municípios, enquanto grandes obras não estão”, completa,

Para o deputado estadual Ricardo Mellão (Novo), entusiasta das privatizações, as extinções de estatais são “para inglês ver”, já que o processo para encerrá-las é lento.

“Doria iniciou o mandato com um ímpeto de privatizações, mas promete muita coisa e peca pelo excesso de promessas. Diante da expectativa que ele gerou, vai faltar muita coisa”, afirma.


Concessões e privatizações de Doria

EM ANDAMENTO OU REALIZADAS

  • linhas 8 e 9 da CPTM
  • 22 aeroportos estaduais
  • parques em Campos do Jordão (SP)
  • Zoológico e Jardim Botânico
  • lote de estradas Piracicaba-Panorama
  • linha 6-laranja do metrô

PARADAS OU ATRASADAS

  • presídios
  • hidrovia Tietê-Paraná
  • trecho norte do Rodoanel
  • Ginásio do Ibirapuera

Extinções de órgãos estatais

Extintas (mas parte ainda não foi liquidada)
Fundação Parque Zoológico de São Paulo; Instituto Florestal; CDHU; EMTU; Sucen; Daesp; ​Codasp; CPOS; Emplasa e Dersa​

Não extintas após pressão no Legislativo
Furp, Fosp, Imesc e Itesp

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