Descrição de chapéu Eleições 2022

Aproximação de Lula gera mal-estar entre aliados de Alckmin

PSD não terá candidato em SP se tucano topar vice, atrapalhando estratégia do PT e do PSB

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São Paulo

A aproximação proposta por PT e PSB a Geraldo Alckmin, sugerindo que o ainda tucano poderia ser o vice de Luiz Inácio Lula da Silva em 2022, está gerando insatisfação entre os aliados potenciais do ex-governador paulista.

Há dois tipos de irritação na praça. Primeiro, há um incômodo nas hostes dos dois partidos que podem dar guarida a esse projeto, o PSD e a União Brasil (fusão DEM-PSL em curso), com a indefinição de Alckmin. A todos seus interlocutores ele diz que "está para decidir" seu futuro em breve.

Segundo, entre aqueles que acreditam que o fato de Alckmin não ter rejeitado com um agradecimento a piscadela de Lula possa ter repercussões eleitorais negativas caso ele dispute o Governo de São Paulo.

Márcio França (esq.) conversa com Gilberto Kassab (dir.), tendo Alckmin ao centro, durante evento em Cajamar (SP)
Márcio França (esq.) conversa com Gilberto Kassab (dir.), tendo Alckmin ao centro, durante evento em Cajamar (SP) - Bruno Rocha - 25.set.2021/Agência Enquadrar/Agência O Globo

Na semana retrasada, como revelou a Folha, emergiu o balão de ensaio da aliança Lula-Alckmin. Ele foi gestado por dois interessados em tirar Alckmin do páreo em São Paulo, seu aliado Márcio França (PSB) e o rival Fernando Haddad (PT), que juntaram o ex-presidente e o ex-governador na conversa.

Fiel a seu estilo, o ainda tucano não rejeitou o namoro. Isso impactou o grupo já inquieto com a protelação de Alckmin e teve dois efeitos imediatos.

O PSD, partido do qual ele estava mais próximo para se filiar, avisou que não terá candidato a governador em São Paulo se Alckmin aceitar ser vice do Lula. Isso afeta França e Haddad, ambos à espera do apoio da sigla.

Neste caso, o foco do partido de Gilberto Kassab será a candidatura ao Planalto de Rodrigo Pacheco (MG), o presidente do Senado, e o pleito pelo Senado do apresentador José Luiz Datena.

No PSD, a ideia eventual de ter Alckmin filiado e na vice de Lula é descartada, pois reduziria o poder de barganha da sigla no segundo turno.

De todo modo, a sigla ainda trabalha com um cenário em que a chapa paulista será composta por Alckmin e França, que foi seu vice de 2015 a 2018, quando assumiu o governo e acabou derrotado nas eleições por João Doria (PSDB).

Já na União Brasil, a metade PSL da criatura tem se mostrado cada vez mais refratária a Alckmin, preferindo manter o apoio a Doria no estado. O temor de não controlar a sigla e, principalmente, recursos dos fundos partidário e eleitoral, foi o que evitou a filiação do ex-governador até aqui.

O plano de Alckmin após a submersão posterior à sua humilhação nas urnas em 2018, quando amealhou a pior votação presidencial da história do PSDB, era voltar a disputar o governo paulista, que ocupou de forma mais ou menos ininterrupta por duas décadas.

Só que o atual governador tinha outros planos. Visando seu projeto presidencial em 2022, ele elegeu-se com o compromisso de entregar o governo para o vice, Rodrigo Garcia, então no DEM —partido que ficaria amarrado ao roteiro, num arranjo que incluía o MDB.

Não deu muito certo quando o DEM implodiu, no começo deste ano, com a derrota do grupo de Rodrigo Maia na disputa da Câmara dos Deputados para Arthur Lira (PP-AL), um dos cônsules do centrão.

Doria operou um rearranjo, filiando Garcia ao PSDB para lhe garantir a legenda em 2022. Maia tornou-se secretário de seu governo e tem sido instrumental no mapeamento e conversão de deputados tucanos arredios ao governador paulista nas prévias presidenciais do PSDB, marcadas para domingo (21).

Com isso, o espaço de Alckmin tornou-se exíguo na sigla que ajudou a fundar. Isso, nas palavras de aliados, o deixou com um inusual "sangue nos olhos" —tanto que cometeu o que é visto até por eles como um erro político, que foi credenciar-se para votar nas prévias, só para atormentar Doria.

O ex-governador pode esperar uma eventual derrota do desafeto para Eduardo Leite (RS) nas prévias para retomar uma disputa interna, mas o fato é que o PSDB paulista está todo fechado por Doria.

O canto de sereia petista surge nesse contexto. Alguns aliados de Alckmin dizem que o impacto potencial no eleitorado paulista, de extração antipetista em sua maioria, poderá ser grande se ele disputar o Palácio dos Bandeirantes.

Até antigas críticas de Alckmin ao PT, sigla contra a qual o tucano disputou a Presidência em 2006 (Lula) e 2018 (Haddad), estão circulando para relembrar o passado da relação.

Na campanha de 2018, por exemplo, o tucano disse no Twitter ao rival na corrida presidencial: "Caro Fernando Haddad, não é o meu partido que é comandado de dentro de um presídio. Nem minha campanha foi lançada na porta de penitenciária. Em São Paulo, bandido pega cana dura."

A Folha colheu um exemplo anedótico desse mal-estar em um almoço com políticos próximos de Alckmin em um tradicional reduto da elite paulistana, nesta semana. O dono do lugar aproximou-se dos comensais e, após mesuras, cobrou duramente aqueles aliados sobre "a traição do Geraldo com o PT".

Outros, contudo, dão de ombros e dizem que o desgaste é pontual, desde que o namoro fique onde está. Eles avaliam que o balão de ensaio, contudo, ganhou voo o suficiente para dar tempo a Alckmin para tomar sua decisão.

Se o ainda tucano resolver topar a empreitada, uma incógnita mesmo para aqueles mais chegados a ele, a montanha a ser escalada será outra.

No PT, há aqueles que alimentam a chapa como uma saída para ampliar tanto a base eleitoral de Lula no Sudeste e no Sul contra Jair Bolsonaro, quanto para ajudar a montar uma governabilidade que estaria ameaçada de saída em 2023.

Mas uma maioria ruidosa na sigla, ciosa de perda de espaço, já lança teses delirantes segundo a qual o "mercado", aí com aspas compulsórias, vê Alckmin como um "cavalo de Tróia" que facilitaria a derrubada de Lula no futuro.

É uma teoria que, além de desconectada da realidade política, ignora que agentes do mercado financeiro nunca gostaram de Alckmin e tiveram fases de grande enriquecimento sob Lula. Mas reverbera, em especial nas alas mais ideológicas do PT.

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