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Delação da Ecovias sobre cartel em governo tucano é aprovada no Ministério Público

Acordos de empresa e ex-presidente preveem pagamentos em SP em troca de não serem processados

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São Paulo

O Conselho Superior do Ministério Público fez nesta terça-feira (15) a homologação final de acordos com a Ecovias e com um ex-presidente da concessionária nos quais eles apontam ilegalidades em contratos de governos do PSDB em São Paulo.

O acordo de não persecução cível da empresa com a Promotoria do Patrimônio Público foi fechado em R$ 638 milhões —valor que a Ecovias deverá bancar parte em obras e parte em dinheiro como compensação pelas irregularidades.

O ex-presidente da empresa Marcelino Rafart de Seras terá de pagar R$ 12 milhões ao Tesouro.

O acordo da concessionária já havia tido uma homologação inicial, mas precisou de correções. Agora, tanto a empresa quanto o executivo não serão processados.

O Ministério Público investigará ainda outras concessionárias de rodovias de São Paulo não contempladas pelo acordo. Antes, porém, será preciso fazer a homologação na Justiça.

Filas de carros no pedágio da rodovia dos Imigrantes, sentido Baixada Santista, administrada pela Ecovias
Filas de carros no pedágio da rodovia dos Imigrantes, sentido Baixada Santista, administrada pela Ecovias - Ecovias / Reproducao

Como noticiou a Folha na segunda (14), na parte criminal da delação à qual a reportagem teve acesso, são atingidos diversos políticos de partidos como PSDB, PT e União Brasil.

As acusações envolvem a concessão responsável pelas rodovias que abrigam as praças de pedágios com a tarifa individual mais alta do estado: R$ 30,20 para carros.

O valor cobrado dos motoristas na malha rodoviária paulista é alvo de seguidos embates políticos ou eleitorais desde a década de 1990, quando os primeiros contratos foram firmados, inclusive com a Ecovias, pelo governo Mario Covas (PSDB).

Segundo Marcelino, 12 grupos formados por 80 empresas que participaram de licitações em 1998 e 1999 para concessão de rodovias estaduais paulistas, na gestão Covas, fizeram cartel para conseguir os contratos.

A estimativa é que os prejuízos possam chegar a R$ 10 bilhões em valores atualizados.

O acerto foi possibilitado devido à nova lei anticrime, que possibilitou esse tipo de medida em casos de improbidade administrativa.

O órgão que aprovou o acordo é o Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo, que é um colegiado da cúpula da instituição paulista (com 11 integrantes) formado por procuradores que atuam em processos de segunda instância na Justiça.

A reportagem procurou os promotores responsáveis pelo acordo, Silvio Marques e José Carlos Blat, mas eles não quiseram se manifestar. Procurada nos últimos dias, a Ecovias também preferiu não fazer comentários sobre a delação. O governo paulista também não respondeu até a conclusão da reportagem.

Os valores serão aplicados em obras de interesse público não previstas originalmente no contrato de concessão da Ecovias, como a construção de um boulevard de cerca de 2 km nas proximidades do Complexo Viário Escola de Engenharia Mackenzie, em São Paulo, bem como em melhorias na rodovia Anchieta.

A empresa se comprometeu, no acordo, a não lucrar com essas obras. O boulevard inclui novas pistas, inclusive subterrâneas. As reuniões que decidiram sobre essa construção tiveram participação direta de João Octaviano Machado Neto, secretário de Logística e Transportes da gestão João Doria (PSDB).

As investigações sobre a concessão da Ecovias começaram em 2018, quando o Ministério Público instaurou um inquérito cível para apurar eventuais irregularidades. A empresa, então, procurou os promotores para celebrar um acordo.

Em 2020, a Ecovias assinou acordo cível com a Promotoria paulista em que afirma ter havido formação de cartel, pagamento de propinas e repasses de caixa dois em 12 contratos de concessão rodoviária firmados em São Paulo.

As irregularidades, segundo a empresa, duraram de 1998 a 2015, período que inclui as gestões Mario Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, todos governos do PSDB.

Na época da delação, o PSDB de São Paulo disse que "não tem qualquer relação com a empresa citada ou com os fatos mencionados e tem absoluta convicção de que os atos administrativos das gestões de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra seguiram estritamente o definido por lei".

nicialmente, o acordo firmado entre a Promotoria e a Ecovias que deveria resultar em redução no valor de pedágio. Um dos compromissos da empresa para não ser processada era a redução de 10% na tarifa de pedágios das rodovias Anchieta e Imigrantes, entre 21h e 5h. No entanto, esse acerto não foi adiante.

Questionado sobre a delação nesta semana, o governo estadual afirmou apenas que foi consultado pelo Ministério Público sobre a forma de ressarcimento e respondeu que pode ser realizado por meio de obras.

Em parte criminal à qual a Folha teve acesso, são citados políticos de uma CPI na Assembleia Legislativa em 1999.

Segundo o relato, "todos os parlamentares acima identificados teriam sido beneficiados pelo pagamento de vantagens ilícitas, arcadas pelas 12 concessionárias" de São Paulo na época. O pagamento, segundo ele, ocorreu "sob pena de elaboração de um relatório final [da CPI] desfavorável a elas".

O delator afirmou que as concessionárias resistiram às exigências, mas depois cederam após ameaças de convocação de sócios, dirigentes de bancos financiadores.

Desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo afirmaram que o caso relativo à CPI de 1999 prescreveu e, por isso, houve extinção da punibilidade dos políticos citados e arquivamento.

O documento, porém, volta a citar a Assembleia Legislativa no contexto de nova CPI relacionada aos pedágios das rodovias, ocorrida em 2014, na qual teria havido pagamento. Desta vez, a título de caixa dois, e não com a promessa de qualquer vantagem à empresa.

Entre os nomes citados no documento à qual a reportagem teve acesso, que relata os casos em 1999 e em 2014, estão o presidente da Câmara Municipal de São Paulo, vereador Milton Leite (União Brasil), o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando (PSDB), e os atuais deputados estaduais Edmir Chedid (União Brasil), Roberto Morais (Cidadania) e Luiz Fernando (PT), além de ex-deputados que se notabilizaram por críticas às concessões paulistas.

Todos os políticos negaram qualquer recebimento de dinheiro ilegal.

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