Descrição de chapéu Eleições 2022

Lula será mais do mesmo e é tão danoso quanto Bolsonaro, diz Felipe D'Avila, do Novo

Candidato à Presidência afirma que fundo eleitoral perverte a política e enterrou chance de terceira via

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São Paulo

Presidenciável do Novo, Luiz Felipe D'Avila, 59, diz em entrevista à Folha que anulará o voto caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfrente no segundo turno o presidente Jair Bolsonaro (PL), ambos classificado por eles como populistas e igualmente danosos à democracia.

"Lula será mais do mesmo, o PT será mais do mesmo no poder, vai sabotar as reformas de uma organização do Estado, vai criar outros mensalões, como hoje tem o orçamento secreto", afirma.

O presidenciável Felipe D'Avila (Novo) durante entrevista à Folha - Gabriel Cabral/Folhapress

Presidenciável com maior patrimônio declarado (R$ 24,6 milhões), o cientista político não poupa críticas à elite à qual pertence. Atribui a ela uma série de atrasos e chama de centrão empresarial "essa turma da elite econômica que é puxa-saco de presidente da República não importa quem seja".

D'Avila reafirma ver a adoção de uma política liberal como saída para a estagnação econômica brasileira. Ele não pontuou na mais recente pesquisa Datafolha, mas tem dito que seu desempenho nas urnas será superior ao mostrado nos levantamentos.

O candidato, que tentou articular setores de centro em torno de uma candidatura única da chamada terceira via, culpa os dirigentes partidários, com sua prioridade na eleição de deputados federais, pelo fracasso da iniciativa. Ele diz que o fundo eleitoral, do qual o Novo abre mão, perverte a política.

D'Avila se filiou ao partido neste ano, após militar no PSDB. Em sua primeira campanha eleitoral, diz que nunca antes uma corrida ao Planalto foi tão vazia de debate de propostas e que, sendo Lula ou Bolsonaro o vencedor, o país terá "quatro anos muito difíceis".

Como seria a guinada rumo ao liberalismo que o sr. propõe, tendo em vista que pesquisas mostram rejeição de parte significativa do eleitorado a essa corrente? A pauta do Partido Novo, a pauta liberal, é para gerações futuras. Converso com a meninada de 20 a 35 anos. Eles têm exatamente o nosso DNA. Querem que tire o Estado das costas deles, têm um espírito empreendedor, essa turma não quer saber de auxílio. Nossa agenda é para o Brasil que se preocupa com meio ambiente, abertura comercial, educação pública de qualidade. Essa é a agenda do Brasil moderno, e isso a política velha rechaça.

Então ainda não chegou o momento para uma candidatura como a sua, que pontua em torno de 1%? A pontuação tem muito a ver com o desconhecimento. Numa eleição de 45 dias, se tornar conhecido é uma grande batalha. Ainda mais quando você não usa fundão eleitoral, não tem o mesmo tempo dos demais candidatos em televisão e na imprensa. No mundo da polarização, a tendência é ao reducionismo de votar em A para eliminar B. Esta é a eleição mais pobre que tivemos para a Presidência em termos de debate.

O candidato do Novo em 2018, João Amoêdo, teve 2,5% dos votos válidos. Se as ideias liberais têm tido mais adesão, o que explica essa dissonância? O [Romeu] Zema [candidato do Novo à reeleição no Governo de Minas Gerais] vai ganhar a eleição no primeiro turno. No caso da minha candidatura, o que beneficia esse flá-flu de Bolsonaro e Lula e prejudica demais o espaço para discutir novas propostas.

Segundo o Data Favela, 37% dos que empreendem têm CNPJ. Como combater a informalidade e a queda de arrecadação, se o Brasil entrar em um programa liberal? O Estado precisa facilitar a vida de quem quer empreender. Formalizar o trabalhador e o empreendedor, para dar acesso a crédito. O Estado só cria problema, porque é governado por gente que vive dele, e não do mercado. Aliás, o maior criador de desigualdade social no Brasil é o Estado.

Como é a nova reforma trabalhista que o sr. propõe, tendo em vista as resistências à reforma mais recente, associada à precarização do trabalho? Quem é contra é o sindicato, o trabalho organizado, não é a pessoa que quer emprego. A legislação trabalhista tem que entender a demanda do mercado e se adequar a ela.

O sr. é parte da elite, mas a critica. Seu programa prega a abertura da economia como indutora de pressão por reformas que tornariam o país mais competitivo. Não é contrassenso esperar que as elites financeira e política ajam automaticamente assim? Essa elite não quer mudança. Eles preferem ir a Brasília e ganhar mais uma reservinha de mercado a competir no mercado internacional. Já descobriram como se dar bem nesse sistema. O Brasil que dá certo, do agronegócio, da digitalização da economia, da tecnologia, quer se inserir no comércio global. Tudo tem que ser feito de forma gradual, com um cronograma de abertura que vai criar um senso de urgência no setor privado e ajudar a tirar as reformas estruturantes do papel.

Seu partido, que votou em boa parte com as propostas de Bolsonaro, vai sair de situação para oposição, caso Lula vença? O Novo votou com o governo nas reformas do Estado. Nas matérias importantes para o Brasil, vamos votar não importa se é o PT ou o Bolsonaro. E fomos radicalmente contra as matérias que envolvem o corporativismo da política e corroem a credibilidade das instituições.

O sr. classifica o Estado assistencial como algo que cria "viciados em governo". Sua gestão aboliria qualquer projeto de transferência de renda? Não, sou muito a favor dos programas de transferência de renda, mas com critério de focalização naqueles realmente mais necessitados. Aumentar [a distribuição] de dinheiro e gasto público, sem foco, não ajuda a resolver nada, está comprando voto.

O sr. é a favor de privatizações amplas, gerais e irrestritas? Me fale um setor que precise estar sob a guarda do Estado que presta serviço de qualidade para a população. Privatização é aumento de concorrência, o que sempre faz o preço cair e a qualidade melhorar.

O governo Bolsonaro prestou algum serviço ao liberalismo? As reformas que o Partido Novo votou a favor no Congresso [são exemplos] de que prestou serviço, sim. Mas o principal das promessas do posto Ipiranga, que virou frentista do corporativismo [ministro Paulo Guedes], não andou nada: cadê as privatizações? A abertura comercial? A descentralização do poder?

Diante das ameaças de Bolsonaro de não respeitar o resultado, acredita que o processo eleitoral vai terminar a contento? Espero que esta eleição termine com respeito ao resultado. Confio plenamente no sistema eleitoral brasileiro e nas urnas eletrônicas. O ataque às urnas é preocupante porque é um ataque à legitimidade às eleições democráticas. Isso não pode existir.

Como o sr. se posiciona caso se confirme Lula x Bolsonaro no segundo turno? A primeira coisa é passar pelo primeiro turno. Evidentemente, com essa postura nossa de votar as pautas do país, não é o populismo [que vamos escolher]. As duas opções não representam o Brasil que o Partido Novo quer.

O sr. mantém a defesa de voto nulo? Sim, essa é a minha postura pessoal. Não voto de jeito nenhum em populista. Sei o desastre que o populismo é para o Brasil, e para mim não importa se é de direita ou de esquerda. Com certeza, o partido vai estar neutro no segundo turno.

Como avalia o apoio a Lula por figuras reformistas e simpáticas ao liberalismo, como Geraldo Alckmin e Henrique Meirelles? Eu não participo de autoengano, entendo como as coisas são. Lula será mais do mesmo, o PT será mais do mesmo no poder, vai sabotar as reformas de uma organização do Estado, vai criar outros mensalões, como hoje tem o orçamento secreto. Essa turma não vai trabalhar para o setor privado brasileiro avançar, eles não conseguem fazer isso.

O que é mais danoso, esse governo Lula que o senhor traça ou a continuidade de Bolsonaro? Por isso que eu sou candidato a presidente da República: porque rechaço o populismo de direita e de esquerda. Os dois são um desastre para o Brasil.

Igualmente danosos, mesmo com todos os ataques às instituições e à democracia promovidos por Bolsonaro? Lógico. Bolsonaro ataca as instituições, mas o Lula é a saúva, ele vai devagarzinho. [Faz] o mensalão, o petrolão, e o aparelhamento do Estado vai [sendo construído] devagar. Não adianta nos iludirmos. O eleitor brasileiro não pode cair no autoengano de achar que esses mesmos [candidatos] que nos conduziram ao buraco são capazes de nos tirar desse buraco do baixo crescimento econômico, do aumento da miséria. Não vai acontecer. Nós vamos ter quatro anos muito difíceis.

Como vê as campanhas apelando ao voto útil? Minha questão é: voto útil para quem? Para eles, os candidatos. Não é para o eleitor. Voto útil para o eleitor é fazer a economia voltar a crescer e gerar renda e emprego. Mesmo para essa turma da direita, que acha que tem que tirar o Lula de qualquer jeito, o voto útil é a aposta errada.

Que erros o sr. aponta na tentativa de construção de uma terceira via unificada, que fracassou? O insucesso tem uma razão: fundo eleitoral. Conversei naquele tempo com o [Sergio] Moro, a Simone [Tebet], dizendo que precisávamos fazer rodadas de conversas sobre propostas, senão essa conversa seria sequestrada pelos presidentes de partidos, e aí acabou a terceira via .

Os presidentes só pensam em quantos deputados vão eleger, por causa do fundo eleitoral e do tempo de TV. Para garantir o quinhão. O fundo eleitoral vem pervertendo a política brasileira. Está mantendo as oligarquias políticas no poder.

O que o sr. aprendeu na campanha? Estou muito otimista que essa nova geração vai acabar com o reinado da minha, que foi um desastre total na política. Essa meninada dos 20 aos 35 anos quer um Brasil aberto, liberal, com igualdade de oportunidades. Ninguém quer viver em reserva de mercado.

Daqui a pouco [o representante dessa geração] será o presidente das grandes empresas e vai tirar do poder o centrão empresarial, essa turma da elite econômica que é puxa-saco de presidente da República não importa quem seja. É uma vergonha. Nossa elite não tem senso de dever, de espírito público. É imediatista e pensa em estar bem com quem está no poder. Isso atrasou a maturidade democrática e a abertura econômica do Brasil.


RAIO-X

Luiz Felipe D'Avila, 59
É graduado em ciências políticas pela Universidade Americana em Paris, com mestrado em administração pública pela Harvard Kennedy School. Fundador do Centro de Liderança Pública (CLP), foi coordenador do programa de governo de Geraldo Alckmin para a Presidência em 2018 e diretor-superintendente da editora Abril, além de autor de livros sobre história e política. Foi filiado ao PSDB e entrou no Novo em 2022 para disputar a Presidência da República, em sua primeira campanha eleitoral

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