O que é fato nas publicações de veículos jornalísticos derrubadas pelo TSE

Remoção de conteúdos gera debate sobre desinformação e liberdade de imprensa

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São Paulo

Recentes decisões do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que determinaram a remoção de conteúdos divulgados por veículos de comunicação sob a justificativa de serem inverídicos abriram debate sobre liberdade de expressão e o conceito de fake news.

Parte dos especialistas ouvidos pela Folha avalia que as decisões ferem a liberdade de imprensa. Outros dizem que, no atual contexto da desinformação e da mídia, as medidas se alinham às atribuições da Justiça Eleitoral.

Fachada do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em Brasília, prédio modernista
Prédio do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em Brasília, que julga ações sobre desinformação na eleição - Lalo de Almeida - 6.jun.17/Folhapress

No último dia 13, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, voltou a afirmar que "as notícias fraudulentas, ou fake news, não são primazia só das redes sociais, também existem na mídia tradicional".

"Não se pode admitir a mídia tradicional de aluguel, mídia que faz suposta informação jornalística absolutamente fraudulenta, para permitir que se replique isso e a partir dessa divulgação se diga, 'não, só estou replicando o que a mídia tradicional colocou'", afirmou.

Em nota no dia 7, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) comentou as decisões do TSE envolvendo O Antagonista e Gazeta do Povo.

Afirmou considerar grave "a publicação de conteúdos potencialmente desinformativos, especialmente neste período", mas também disse ver "com preocupação decisões que colocam o Judiciário na posição de decidir sobre o que um veículo jornalístico pode ou não publicar".

"Quando há erro, a determinação de que haja correção e qual deve ser essa correção é o mais correto a fazer", disse a entidade.

Nesta semana, em resposta a uma ação contra fake news movida pela coligação de Lula contra Bolsonaro e aliados, o TSE censurou filme sobre facada, puniu canais bolsonaristas e intimou Carlos Bolsonaro.

Na segunda (17), o tribunal também concedeu mais três direitos de resposta ao petista que devem ser veiculados em canais da Jovem Pan.

Os ministros aprovaram por 4 votos a 3 os recursos apresentados pela campanha para permitir que ele rebata afirmações de que mente, não foi "inocentado" e que irá perseguir cristãos.

A seguir, a Folha lista conteúdos derrubados pelo TSE e mostra o que é comprovado ou não em cada um.

O Antagonista e Jovem Pan

No dia 1º de outubro, véspera do primeiro turno da eleição, o portal O Antagonista publicou texto com o título: "Exclusivo: em interceptação telefônica da PF, Marcola declara voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 'É melhor, mesmo sendo pilantra'"

A reportagem reproduzia trechos de supostos diálogos monitorados pela Polícia Federal entre o líder do PCC e outras pessoas.

Moraes determinou a remoção do conteúdo, que chamou de inverídico e descontextualizado, e estendeu a determinação à reprodução do mesmo pela Jovem Pan. "Embora o teor dos diálogos revele uma discussão comparativa entre os candidatos, não existe declaração de voto, fato constante no próprio título da notícia".

O presidente do TSE também ressaltou que, por ter os direitos políticos suspensos após condenação transitada em julgado, o líder da facção criminosa não pode votar.

OS FATOS
Acompanhada de imagens com transcrições dos diálogos interceptados, a reportagem removida por decisão de Moraes mostra trechos em que integrantes do PCC manifestam preferência por Lula.

Entre eles está um de maio do ano passado, em que o líder da facção afirma: "É melhor o Lula no poder, mesmo ele sendo um pilantra e um zero à esquerda, que o Bolsonaro, porque ele é muito ligado com as polícias e a milícia".

As palavras "voto" ou "votação" não aparecem nos diálogos exibidos no texto.

Marcola de fato não pode votar.

Algemado, de roupa azul e óculos escuros, Marcos Camacho, o Marcola, é escoltado por militares armados após ser atendido em hospital em Brasília
Marcos Camacho, o Marcola, é escoltado em Brasília, onde estava antes de ser transferido para Porto Velho - Sergio Lima - 21.jan.2020/AFP

Gazeta do Povo

No dia 4 de outubro, sob a justificativa de coibir a circulação de informações "manifestamente inverídicas", o TSE determinou a remoção de uma série de links que relacionavam Lula à ditadura da Nicarágua e/ou à perseguição de cristãos no país.

Entre eles, estava um tuíte da Gazeta do Povo com o texto "Ditadura apoiada por Lula tira sinal da CNN do ar" e link que remetia à reportagem com igual enunciado. Não houve pedido de remoção da reportagem, que segue no ar.

OS FATOS
Com o Daniel Ortega no quarto mandato consecutivo e seus principais opositores presos, a Nicarágua não tem eleições livres. No ranking do instituto sueco V-Dem, o país é considerado uma autocracia eleitoral.

O serviço da emissora CNN em espanhol de fato divulgou que seu sinal foi cortado na Nicarágua.

Em novembro do ano passado, em entrevista ao jornal El País, Lula inicialmente disse que "quem acha que é imprescindível e insubstituível começa a nascer um ditador" e defendeu a autodeterminação dos povos. "Se o Daniel Ortega está errando, o povo da Nicarágua que puna o Daniel Ortega", afirmou.

Na mesma entrevista, porém, ele afirmou. "Por que Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e Daniel Ortega não? Por que o Felipe González [primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996] pode ficar 14 anos no poder? Qual é a lógica?", indagou.

Após as entrevistadoras dizerem que nenhum desses líderes havia, como Ortega, encarcerado opositores, Lula respondeu lembrando a sua própria prisão em Curitiba.

"Eu não sei o que as pessoas fizeram para ser presas. [...] Se o Daniel Ortega prendeu a oposição para não disputar a eleição, como fizeram no Brasil contra mim, ele está totalmente errado."

No debate presidencial do último domingo (16), Lula voltou a defender a alternância de poder e a autodeterminação da Nicarágua. "Se o Daniel Ortega está errando, o povo da Nicarágua que puna o Daniel Ortega".

R7

Em 5 de outubro, o TSE determinou a remoção de conteúdos que associavam Lula ao satanismo sob a justificativa de que veiculavam informações evidentemente inverídicas e prejudiciais à honra e à imagem de Lula.

Entre esses conteúdos, estava link do portal R7 com o título "Satanista diz que forças malignas se uniram por vitória de Lula, mas erra resultado da eleição".

OS FATOS
Em vídeo ainda disponível na internet, Vicky Vanilla, que se apresenta como mestre luciferiano, diz, diante de bandeira de Lula, que "amanhã não tem pra ninguém, já está decretado".

Ele cita a união de "terreiros de quimbanda, os terreiros de axé, as irmandades luciferianas do país, os segmentos satanistas, os satanistas ateístas, os satanistas gnósticos, os luciferianos ateísta" com o propósito de derrotar Jair Bolsonaro (PL). A live foi feita, segundo o jornal O Globo, em 30 de setembro, dois dias antes do primeiro turno.

Após a repercussão, a campanha de Lula voltou a dizer que o petista é católico, crismado e frequentador da Igreja Católica. Vanilla também afirmou que o petista não tem nenhuma relação com sua "casa espiritual".

JOVEM PAN

No dia 7 de outubro, o TSE determinou a remoção de vídeo da Jovem Pan com entrevista da senadora Mara Gabrilli sob a justificativa de conteúdo desinformativo e violador da imagem.

Em sua fala, a parlamentar afirmava que Lula havia pagado para não ser envolvido no caso do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel.

OS FATOS
Em abril de 2002, a Polícia Civil encaminhou à Justiça a conclusão do inquérito sobre a morte do ex-prefeito. A constatação foi que se tratou de crime comum, cometido por integrantes de uma quadrilha de criminosos que tinha como base a favela Pantanal, na zona sul de São Paulo. Seis homens foram presos, e um adolescente, apreendido. Os adultos foram julgados e condenados em júri popular, e o caso está encerrado na Justiça.

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