Descrição de chapéu Folhajus STF

Toffoli anula suspeição de Eduardo Appio, juiz crítico da Lava Jato

Ministro do STF afirma que decisão da Oitava Turma do TRF-4 foi 'ilegalmente exarada' contra o magistrado

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Brasília e Curitiba

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli anulou nesta terça-feira (19) a decisão do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª região) que havia declarado a suspeição do juiz Eduardo Appio em processos relacionados à Lava Jato que tramitam na 13ª Vara Federal de Curitiba.

Toffoli disse que a decisão da Oitava Turma do TRF-4 foi "ilegalmente exarada".

Appio assumiu a titularidade da 13ª Vara em fevereiro e passou a se mostrar abertamente crítico aos métodos adotados pela Lava Jato em anos anteriores.

Desde então, expediu decisões críticas à operação, cujos protagonistas foram Deltan Dallagnol, ex-coordenador da força-tarefa, e Sergio Moro, ex-juiz responsável.

O advogado de Appio, Pedro Serrano, afirmou que a decisão do ministro é "uma vitória da Constituição", que "recoloca o trem da legalidade nos trilhos", e diz entender que o juiz deve voltar já à vara da Lava Jato.

"Nós entendemos que ele tem que retornar ao cargo porque foi suspenso o processo administrativo. Não há nenhum sentido jurídico manter uma pessoa afastada que não esteja sendo processada. É como manter alguém preso sem processo penal, sem acusação. Se assim não entenderem o TRF-4, nós vamos recorrer", afirmou.

Homem de terno e gravata sentado em frente a computador em sala de trabalho
O juiz federal Eduardo Appio, durante entrevista à Folha, em fevereiro - Catarina Scortecci - 14.fev.23/Folhapress

Em sua decisão, Toffoli ainda suspendeu o andamento do processo administrativo disciplinar aberto contra Appio, em trâmite na corregedoria-geral do TRF-4. A medida, segundo Toffoli, não tem prejuízo de eventual análise do caso pela corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

O ministro do STF afirmou em sua decisão que o caso foi relatado pelo tribunal regional "amparado basicamente em assunções (ou deduções)".

Toffoli disse ainda "não terem sido poucas as exceções de suspeição das defesas de acusados que pesaram sobre o então juiz Sergio Moro e a juíza substituta da 13ª Vara Federal Criminal (Gabriela Hardt)" e que, no entanto, "todas foram rechaçadas pelo TRF-4, em posicionamento jurídico diametralmente oposto".

O TRF-4 e Justiça Federal do Paraná informaram que não vão se manifestar sobre a decisão.

Em rede social, o ex-procurador Deltan afirmou que o recurso do juiz "jamais poderia ser julgado diretamente pelo ministro Toffoli, e muito menos neste processo".

"É inacreditável. Depois da enxurrada de críticas à decisão sobre a Odebrecht, Toffoli dobrou a aposta. Não há limites para um ministro do Supremo no Brasil, eles se colocam acima da lei. Isso é muito grave", afirmou.

A decisão favorável a Appio ocorreu na esteira da reclamação 43.007, na qual foram anuladas as provas do acordo de leniência da Odebrecht, no início do mês. O ministro agora atendeu a dois pedidos de extensão, um protocolado pela defesa de Appio e outro por um réu da Lava Jato, o empresário Raul Schmidt Felippe Junior.

Appio está afastado do cargo desde 22 de maio, por decisão da Corte Especial Administrativa do TRF-4. No dia 20 daquele mês, o juiz assinou a absolvição do empresário, acusado pelo MPF (Ministério Público Federal) de lavagem de dinheiro e corrupção passiva. Foi a primeira sentença de Appio no âmbito da Lava Jato.

Ao STF o empresário argumentou em sua petição, entre outras coisas, que o TRF-4 havia utilizado as provas do acordo da Odebrecht para justificar a suspeição de Appio. Ele se refere às planilhas de pagamentos da construtora na qual o pai do magistrado, o ex-deputado federal do PP-RS Francisco Appio, já falecido, estaria incluído, com o codinome Abelha.

Ao determinar o afastamento de Appio, os juízes do TRF-4 apuravam se o magistrado tinha telefonado para o filho de um ex-relator da Lava Jato na corte fingindo ser um funcionário da Justiça Federal.

Após ter suas decisões revistas, Appio havia tido atrito em abril com o ex-relator Marcelo Malucelli, do TRF, que passou a ser questionado na época sobre seu elo com Moro.

O filho de Malucelli, o advogado João Eduardo Barreto Malucelli, é sócio do senador e da deputada federal Rosangela Moro (União Brasil-SP) no escritório Wolff Moro Sociedade de Advocacia.

Em sua decisão, o ministro do STF criticou a parcialidade do juiz federal Loraci Flores de Lima, designado como relator da Lava Jato na Oitava Turma do TRF, em substituição a Marcelo Malucelli, que teve sua atuação criticada por seu elo com Moro.

Toffoli disse haver resistência do relator em dar efetivo cumprimento às sucessivas decisões do STF, "utilizando-se a corte regional de diversos expedientes, jurisdicionais e administrativos".

O ministro afirma que, em relação a todas as pessoas envolvidas em tais processos, "houve supressão total de ampla e prévia defesa, contraditório, paridade de armas". "As partes foram impossibilitadas de intervir em decisão, insista-se, sem oitiva prévia, qualificada", disse.

A decisão do TRF-4 contra Appio tinha sido tomada no mesmo dia em que Toffoli determinou que as provas obtidas na operação e que balizaram os acordos de leniência da Odebrecht são imprestáveis em qualquer âmbito ou grau de jurisdição.

A Oitava Turma do TRF-4 decidiu por unanimidade julgar procedente a suspeição de Appio em todos os processos relacionados à Lava Jato que tramitam na 13ª Vara Federal. Além disso, os magistrados declararam a nulidade de todos os atos praticados por ele nesses casos.

Segundo a corte, o Ministério Público Federal "apresentou elementos concretos e objetivos que revelam a parcialidade do magistrado para processar e julgar". Um deles era o fato de o juiz ter o usado na Justiça o login "LUL22", em referência ao presidente Lula, o que foi confirmado pelo próprio magistrado em entrevista.

Appio tem mais de 20 anos de trajetória na Justiça Federal. Ele foi escolhido para assumir a Vara Federal por critério de antiguidade entre magistrados que se inscreveram.

No início de maio, Appio havia anulado a sentença de 2017 contra o ex-governador Sérgio Cabral dada pelo então juiz Moro. A decisão foi revertida pelo juiz Carlos Eduardo Thompson Flores, da segunda instância do TRF-4. Segundo ele, Appio não respondeu a questionamentos sobre sua imparcialidade.

O magistrado havia concordado com o pedido da defesa de Cabral para considerar parcial a atuação de Moro no processo com base nas mensagens trocadas com o ex-procurador Deltan.

O TRF-4 também derrubou duas decisões de Appio que atendiam pedidos da defesa do ex-ministro Antonio Palocci. O juiz havia marcado uma audiência para que Palocci apontasse eventuais "excessos e erros" da Lava Jato e liberado R$ 35 milhões de uma conta ligada ao político.

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