Descrição de chapéu Folhajus

PF indicia Bolsonaro no caso de cartão de vacina e vê elo com trama golpista

Investigação aponta suspeita de inserção de dados falsos e associação criminosa; defesa de ex-presidente nega acusações

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Brasília

A Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) e outras 14 pessoas no caso que apura a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19.

A investigação apontou a suspeita dos crimes de inserção de dados falsos em sistema público e associação criminosa, e a PF diz que a fraude pode ter sido realizada no escopo da tentativa de aplicar um golpe de Estado no país e impedir a posse de Lula (PT).

Cid disse em depoimento que a fraude no cartão de vacinação de Bolsonaro e da filha dele, Laura, foi feita a pedido do próprio mandatário na época e que os certificados foram impressos e entregues "em mãos" ao então presidente.

O ex-presidente Jair Bolsonaro, um homem branco de terno preto e camisa social clara
O ex-presidente Jair Bolsonaro - Ueslei Marcelino - 18.out.2023/Reuters

O relatório final da PF diz haver evidências de que "os investigados se associaram" para a falsificação nos sistemas do Ministério da Saúde. "Tais condutas tiveram como consequência a alteração da verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, a condição de imunizado contra a Covid-19 dos beneficiários."

A pena para associação criminosa é a reclusão de 1 a 3 anos. Já a inserção de dados falsos em sistema de informações tem pena de reclusão de 2 a 12 anos e multa.

A investigação está vinculada ao inquérito das milícias digitais, que tramita em sigilo no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes. No âmbito deste inquérito foi feito o acordo de delação premiada de Mauro Cid.

Moraes deu um prazo de 15 dias para a PGR (Procuradoria-Geral da República) definir se, a partir da conclusão da PF, denuncia ou não Bolsonaro por essas acusações.

A defesa de Bolsonaro reclamou do que chamou de vazamento da investigação, criticou o indiciamento e disse que o relatório da PF é precipitado. No seu depoimento à PF, o ex-presidente admitiu que não foi vacinado, mas negou ter dado ordem para a falsificação.

Este é o primeiro de três casos com Bolsonaro na mira e que a PF espera concluir até julho. Além deste, os investigadores apuram a participação do ex-presidente em trama para tentar dar um golpe de Estado e o caso sobre joias recebidas da Arábia Saudita.

No caso do cartão de vacina, a PF argumenta que o ex-presidente não apenas tinha ciência como ordenou a falsificação.

"Vários atos de acesso ao sistema ConecteSUS, inclusive a impressão de certificado de vacinação ideologicamente falso, foram praticados na residência oficial da Presidência da República, Palácio do Alvorada, ocupada na época dos fatos por Jair Messias Bolsonaro", diz relatório da PF.

Segundo a polícia, a falsificação dos certificados pode ter sido feita pelo grupo "para permitir que seus integrantes, após a tentativa inicial de golpe de Estado, pudessem ter à disposição os documentos necessários para cumprir eventuais requisitos legais para entrada e permanência no exterior (cartão de vacina), aguardando a conclusão dos atos relacionados a nova tentativa de golpe de Estado que eclodiu no dia 8 de janeiro de 2023".

Ainda de acordo com o relatório policial, Cid disse que Bolsonaro, após saber que o tenente-coronel "possuía os cartões de vacina para si e sua família, solicitou que o colaborador fizesse para ele também".

"O ex-presidente deu a ordem para fazer os cartões dele e da sua filha, Laura Bolsonaro. (...) Que o colaborador [Mauro Cid] confirma que pediu os cartões do ex-presidente e sua filha Laura Bolsonaro sob determinação do ex-presidente Jair Bolsonaro e que imprimiu os certificados", afirma a PF.

A Polícia Federal diz que "os elementos de prova obtidos" após busca e apreensão nos endereços dos investigados, "somados às oitivas realizadas, corroboraram as práticas criminosas, demonstrando que os registros de vacinação contra a Covid-19, inseridos nos sistemas do Ministério da Saúde, são falsos e foram realizados a pedido e no interesse dos investigados Jair Messias Bolsonaro, Sergio Rocha Cordeiro e Max Guilherme Machado de Moura [dois assessores do então presidente]".

No início de maio de 2023, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão no endereço de Bolsonaro e de prisão contra Cid e Max Guilherme.

Na ocasião, Bolsonaro afirmou que só teve conhecimento da adulteração quando esse tema começou a ser divulgado pela imprensa, em fevereiro daquele ano.

A PF aponta que Cid inicialmente pediu ajuda a um sargento —também ajudante de ordens— para conseguir um cartão de vacinação preenchido com doses da vacina contra a Covid-19 em nome de sua esposa, o que foi obtido por meio da Secretaria de Saúde de Goiás.

Diante da dificuldade para inserir os dados no sistema do Ministério da Saúde, Cid procurou um major reformado que intermediou a emissão de nova carteira de vacinação pela Prefeitura de Duque de Caxias (RJ) —inicialmente para a sua família, depois para Bolsonaro.

O ex-presidente já foi condenado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral. Neste momento, ele está inelegível ao menos até 2030.

Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, Bolsonaro poderá pegar uma pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.

No caso das joias e no da trama golpista, as próximas etapas são a finalização da investigação pela PF, análise da PGR e definição por parte do STF se Bolsonaro se transforma em réu para ser julgado em seguida pelo plenário. Caso não se justifique uma preventiva até lá, a eventual prisão dele ocorreria somente após essa última etapa, caso condenado.

A defesa de Cid e do deputado Gutemberg não responderam aos pedidos de entrevista.

O advogado de Marcelo Câmara e Sergio Cordeiro, Luiz Eduardo Kuntz, afirmou por nota que a defesa se manifestará de modo completo após ter acesso aos dados da investigação, como "mídias, documentos", bem como ao conteúdo da delação premiada de Cid.

"Somente após ter acesso integral a esses elementos é que a defesa irá se manifestar de forma mais completa e assertiva, acreditando ser possível, sempre com o devido acatamento, demonstrar os equívocos que permearam a interpretação da autoridade policial para o indiciamento dos investigados, o que, certamente, desaguará na ausência de elementos para que o procurador-geral da República ofereça denúncia", completou o advogado.

O advogado do sargento Luis Reis também informou que só se manifestará após ter acesso aos dados da investigação. Questionado, o advogado de Max Guilherme, Admar Gonzaga, respondeu "vocês têm mais informações que os advogados, lamento".

Entenda inquérito das milícias digitais e próximos passos

Eixos 
São cinco: ataques a opositores, ataques às instituições, tentativa de golpe, ataques às vacinas e uso do Estado para obter vantagens

Cartão de vacina
Está no eixo de uso do Estado para vantagens; a PF indiciou Bolsonaro, Mauro Cid e mais 15 pelo caso

Joias 
Em decisão, o ministro do STF Alexandre de Moraes cita a investigação de peculato e lavagem de dinheiro; Cid teria dito em delação que entregou dinheiro da venda de dois relógios a Bolsonaro

Golpismo 
Ex-comandantes das Forças Armadas afirmaram que Bolsonaro envolveu-se em trama golpista para impedir a posse de Lula (PT)

Próximos passos
Bolsonaro pode ser indiciado e condenado por vários crimes; no caso do cartão de vacina, por associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informações

Veja a lista de indiciados:

  • Jair Bolsonaro
  • Mauro Cesar Cid Barbosa
  • Gabriela Santiago Ribeiro Cid
  • João Carlos de Sousa Brecha
  • Cláudia Helena Acosta Rodrigues da Silva
  • Célia Serrano da Silva
  • Gutemberg Reis de Oliveira
  • Ailton Gonçalves Barros
  • Sérgio Rocha Cordeiro
  • Max Guilherme Machado de Moura
  • Marcelo Fernandes Holanda
  • Camila Paulino Alves Soares
  • Luis Marcos dos Reis
  • Farley Vinícius Alcantara
  • Eduardo Cresp Alves
  • Paulo Sergio da Costa Ferreira
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