Câmara decide manter preso deputado suspeito no caso Marielle apesar de resistências ao STF

Placar foi de 277 a 129 votos; Chiquinho Brazão está preso desde março sob suspeita de ser um dos mandantes do crime

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Brasília

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (10), por 277 a 129 votos, a manutenção da prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), preso sob suspeita de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), em 2018. Foram 28 abstenções.

Eram necessários 257 votos (do total de 513 deputados) para manter a prisão. O PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro, orientou sua bancada pela revogação da prisão. Assim que foi proclamado o resultado da votação, governistas aplaudiram e gritaram palavras de ordem como "justiça" e "Marielle, presente".

A decisão dos parlamentares é uma vitória para a base do governo Lula (PT) e para o STF (Supremo Tribunal Federal), após dias de incerteza sobre qual seria o resultado da votação devido a articulações do centrão pela derrubada da detenção.

Parlamentares de esquerda comemoram a permanência do deputado Brazão na prisão, nesta quarta (10) - Pedro Ladeira/Folhapress

Pouco antes de começar a votação no plenário, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), convocou líderes partidários para uma reunião para explicar como se daria o processo. Ficou acordado que somente os partidos orientariam as bancadas, sem tempo de lideranças, e que o painel de votações ficaria aberto por 30 minutos. O governo Lula havia sinalizado que orientaria a favor da manutenção da prisão.

Mais cedo, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa já havia dado aval à manutenção da prisão, por 39 a 25 votos —o resultado mostrou uma divisão entre os partidos do centrão e uma unidade do PL (para rejeitar o pedido de prisão) e de partidos da esquerda (para mantê-lo preso).

Até poucos minutos antes do início da votação no plenário havia dúvida, entre parlamentares governistas, se haveria votos suficientes para aprovar o relatório do deputado Darci de Matos (PSD-SC), que defendia a manutenção da prisão.

Isso porque, nos bastidores, deputados afirmavam que a decisão do ministro do Supremo Alexandre de Moraes de mandar prender o parlamentar, em março, violou a Constituição, que prevê que deputados só podem ser detidos em flagrante por crime inafiançável. Membros do centrão e aliados do ex-presidente Bolsonaro defendiam usar o caso para dar um recado ao magistrado.

Outros pontos que eles citavam é que não haveria provas suficientes contra Brazão e que seria um equívoco respaldar uma prisão que tinha sido decretada apenas com base em delação premiada.

Além disso, havia um receio de que esse caso pudesse abrir um precedente para outros no futuro e, por isso, defendiam cautela sobre o tema.

O advogado Cleber Lopes, que atua na defesa de Brazão, criticou as condições da prisão do parlamentar e afirmou que ele não participaria da sessão porque não havia conexão de internet naquele momento no presídio.

"Estamos a viver a barbárie, tortura psicológica imposta a esse parlamentar. Meu cliente está preso por uma delação que eu não posso ter acesso. Não pode participar dessa sessão porque não tem conexão, está privado de participar desse ato", afirmou.

Líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ) disse em sua fala na sessão que Bolsonaro foi "injustiçado" por ter sido acusado de ter envolvimento com o assassinato e afirmou que, apesar de o Brasil esperar justiça para o caso, "esta noite não estamos tratando disso, mas sim da legalidade da prisão" do colega.

"Quero chamar os parlamentares aqui. Nós juramos à Constituição quando assumimos o mandato, e no nosso entendimento essa prisão é ilegal, fere a Constituição e, portanto o PL espera justiça nesse caso, mas orienta contrário", disse Côrtes.

O deputado Alencar Santana (PT-SP), um dos vice-líderes do governo na Casa, afirmou que derrubar a prisão daria um recado de que outras pessoas poderão ser vítimas do mesmo crime que atingiu Marielle e seu motorista Anderson Gomes. "Quem será a vítima de 2024? Qual ato mais será praticado para obstruir investigação?", disse.

Líder do PSOL, a deputada Erika Hilton (SP) enalteceu a vida da vereadora e criticou votos contrários à prisão. "Não é sobre Marielle, é sobre o Brasil injustiçado. Nós votamos por justiça, pela memória, pela vida e pela trajetória de Marielle e Anderson", afirmou.

Uma das principais lideranças do centrão e líder da União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA) declarou voto contrário à manutenção da prisão, na terça (9), e passou a fazer um corpo a corpo com parlamentares defendendo sua posição. A interlocutores afirmou que era preciso ter coragem para defender os deputados.

Nascimento é aliado próximo de Lira e um dos mais cotados para sucedê-lo em 2025.

Outros nomes próximos a Lira, como o presidente do Avante, Luís Tibé, não participaram da votação para tentar evitar que tivessem os 257 votos necessários para manter a detenção.

Parlamentares ponderam que a comoção social envolvida no assassinato da vereadora também pesou e que os deputados não votaram apenas com a ideia de dar ou não um recado ao Supremo e também sopesaram o desgaste que seria libertar Brazão.

Membros da base governista rebateram as críticas dos colegas e diziam que libertar Brazão representaria um sinal de impunidade. Eles apostavam que pelo fato de ser votação aberta (quando é registrado como votou cada parlamentar), os deputados ficariam constrangidos de se posicionar de modo contrário à prisão.

Também nesta quarta-feira, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara instaurou o processo de cassação de Brazão. O procedimento foi aberto por decisão do presidente do colegiado, Leur Lomanto (União Brasil-BA). Os deputados Bruno Ganem (Podemos-SP), Ricardo Ayres (Republicanos-TO) e Gabriel Mota (Republicanos-RR) foram sorteados para relatar o procedimento.

Na próxima semana, o presidente do colegiado anunciará qual dos parlamentares escolheu para relatar o processo.

Chiquinho, o irmão, Domingos, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e o ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa, foram presos por ordem de Moraes no último dia 24.

A operação da PF ocorreu dias após o magistrado homologar a delação premiada do ex-policial Ronnie Lessa, suspeito de ser o executor do crime.

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