Versatilidade e raciocínio lógico dão estabilidade a profissionais que usam matemática

Em áreas de tecnologia, oferta de trabalhadores não atende à demanda de empresas, que competem globalmente entre si

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São Paulo

A possibilidade de atuar em diferentes setores e a aptidão para aplicar raciocínio lógico a questões do dia a dia são fatores que ajudam a explicar como profissões da matemática são mais estáveis em relação a outras, principalmente durante crises.

Os efeitos da pandemia de Covid-19, por exemplo, recaíram com menos força sobre esses trabalhadores, cuja queda máxima de ocupação no período de isolamento foi de 6,8%, enquanto a das demais profissões chegou aos 13,1%.

O retorno aos níveis de ocupação pré-crise também foi atingido mais rapidamente por esse grupo, em março de 2021, em relação ao índice geral —recuperado apenas em junho de 2022. Os dados são de um estudo lançado na terça-feira (20) pelo Itaú Social.

Jovem sorri dentro de uma sala envidraçada; ao fundo, é possível ver uma tela com gráficos
José Nunes, 22, escolheu cursar engenharia da computação por ter convicção de que sairia da faculdade empregado; hoje, ele é CEO da Start Carreiras, plataforma que conecta universitários a empresas - Keiny Andrade/Folhapress

No mercado financeiro, a capacidade de profissionais formados em matemática de analisar dados não costuma ser requisito para contratação, mas é vista como diferencial.

Segundo Lais Vasconcelos, especialista em seleção para posições financeiras, jurídicas e de recursos humanos da empresa de recrutamento Robert Half, essa habilidade leva a leituras macroeconômicas e conexões dos números com a realidade.

Diretora de administração fiduciária do Itaú, Roberta Anchieta, 46, conta que sua graduação em matemática aplicada e computacional pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) lhe apresentou a um modelo mental que, na rotina de trabalho, acaba sendo mais utilizado que a parte técnica.

"Eu não faço um monte de [operações] integrais e derivadas, mas a matemática definiu para mim o raciocínio lógico e crítico. Hoje eu trabalho muito com o ambiente regulatório e, na minha vida, penso tudo matematicamente", diz ela, que é responsável por zelar pelos direitos dos cotistas de cerca de 4.900 fundos —juntos, eles representam cerca de R$ 1,7 trilhão.

Na visão da cientista de dados Fátima Lemos, 59, que trabalha há mais de duas décadas em uma seguradora, um dos motivos por trás da estabilidade profissional desses profissionais é a importância estratégica em crises. Segundo ela, matemáticos e estatísticos podem facilitar processos e ajudar a trazer informações e relatórios relevantes para a tomada de decisões.

"Não sei se dei sorte de estar em locais que valorizaram bastante meu trabalho, mas realmente nunca fiquei muito preocupada com as crises econômicas [quanto à possibilidade de ser demitida]", afirma Fátima, que é formada em estatística pela USP.

Outro aspecto determinante para a empregabilidade de profissões relacionadas à disciplina é a demanda crescente do mercado por pessoas capazes de analisar dados e fazer inferências. De acordo com Milena Almeida, diretora de recursos humanos da Oracle Brasil, a possibilidade de se realocar em diferentes áreas também favorece a estabilidade dessas carreiras.

"Hoje temos grandes engenheiros em cadeiras estratégicas de recursos humanos, porque queremos, por exemplo, analisar o turnover [taxa de rotatividade de funcionários] de determinada área por meio de dados."

Foi a boa perspectiva de mercado que motivou José Nunes, 22, a escolher a engenharia da computação, em 2019. "Tinha a convicção de que eu sairia da faculdade empregado", diz ele, que se formou pelo ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica).

Mais do que empregado, ele é hoje CEO da Start Carreiras, plataforma que utiliza algoritmos de personalização para unir universitários a empresas em busca de estagiários.

Criada em 2022 por Nunes e dois colegas, a startup tem mais de 100 mil estudantes conectados, cerca de 50 instituições parceiras e 3.000 recrutadores. Em 2023, recebeu um aporte de R$ 7 milhões em uma rodada de investimentos.

Segundo estudo de 2021 da Brasscom (Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação), quase 800 mil novas vagas de trabalho devem ser criadas em tecnologia até 2025, mas 67% delas podem não ser preenchidas por falta de pessoal.

Há dez anos na Oracle, Almeida avalia que o mercado de tecnologia falha em buscar funcionários em fontes além das faculdades mais tradicionais. "Se continuarmos no mesmo celeiro, com essa disputa de remuneração entre empresas de tecnologia, a oferta de profissionais vai ser escassa mesmo", afirma.

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