Contador permanece relevante com IA, mas deve se atualizar

Especialistas discutem tamanho da categoria e impacto da inteligência artificial

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São Paulo

O Brasil tem 532 mil profissionais de contabilidade, segundo o conselho da categoria. O total engloba contadores e técnicos —trabalhadores que, desde 2015, por força de lei, não recebem mais certificação.

Em número, o país supera China, Índia e França e está atrás dos Estados Unidos, que contam com 672 mil profissionais certificados.

"A contabilidade sempre foi uma válvula de escape", diz César Tibúrcio Silva, professor de ciências contábeis da UnB (Universidade de Brasília). "As pessoas faziam o curso técnico porque significava uma espécie de garantia de emprego no futuro."

Homem negro apoiado em mureta no topo de um prédio. Conteineres ao fundo
Formado em contabilidade, Fábio Correia é gerente de finanças do terminal de contêineres da Wilson Sons em Salvador (BA) - Rafaela Araújo/Folhapress

Outro fator, afirma, é a complexidade das normas e da legislação, que favorece a existência de um número tão expressivo desses profissionais.

Para Aécio Dantas, presidente do CFC (Conselho Federal de Contabilidade), "é um mito" que o número de contabilistas no país seja sinal de burocracia.

"O contador moderno vai no sentido oposto, é um analista de dados." Esses profissionais podem trabalhar em uma série de funções no setor público e no privado, como auditoria, perícia contábil e atuária, entre outras.

Esse é um dos fatores que ajuda a garantir os 93% de taxa de ocupação na área, calculados em 2013 por uma pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Não há dados mais recentes. No mesmo estudo, o instituto calculou em R$ 6.000 (valor atualizado pela inflação) o salário da categoria.

"É difícil ver um bom contador desempregado", diz o presidente do CFC, acrescentando que os profissionais também podem abrir os próprios escritórios de contabilidade.

Vania Borgerth, 59, queria ser guia de turismo, mas foi dissuadida pelo irmão. Formou-se em ciências contábeis na Faculdade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro, e se tornou contadora-chefe do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). De 2004 a 2011, chefiou uma equipe de 120 pessoas.

Ela considera insuficiente o número de contadores no Brasil. "O mercado precisa de mais informação, com maior velocidade, e de contadores com formação ética, estatística, que se expressem bem."

Outra discussão é o impacto da inteligência artificial sobre a profissão. Fábio Correia, gerente de finanças do terminal de contêineres da Wilson Sons em Salvador (BA), avalia que a IA exigirá atualização dos profissionais, mas não eliminará cargos.

Com a implementação da tecnologia, ele vê o contador se deslocando para funções analíticas e de maior protagonismo. "O sistema dá a informação, mas o desafio é entender o negócio, explicar as variações nos números."

Silva, da UnB, acredita que a profissão seguirá existindo, embora a redução de postos seja inevitável. "Toda revolução tecnológica teve um impacto na contabilidade, que lida com a automação há bastante tempo", diz.

O professor lembra da tabuladora, máquina de processamento de dados baseada na leitura de cartões de papel perfurados, inventada pelo engenheiro americano Herman Hollerith no século 19. O dispositivo permitiu acelerar o censo populacional americano de 1890 e deu origem ao apelido paulista do contracheque, o holerite.

"A tecnologia não vai ocupar o papel do contador", diz Dantas, presidente do CFC. "Ela vai fazer a parte burocrática, dos cálculos, e liberar o contador para a função de análise de dados."

Mulher negra de blusa e calças cinzas sorri para a câmera no centro de uma sala de aula
Gabriela Nascimento, 25, é aluna de ciências contábeis na Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto (SP) - Ricardo Benichio/Folhapress

"Cada vez mais nossa função vai ser automatizar as tarefas, em vez de fazê-las por conta própria", afirma Gabriela Nascimento, 25, aluna da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, da USP.

Ela conta que alguns docentes incentivam os alunos a usar o ChatGPT, software de IA generativa, na resolução de exercícios. "Vai ser um requisito. Quem não tiver a habilidade vai ficar em desvantagem."

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