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Descrição de chapéu Obituário Alain Delon (1935 - 2024)

Morre Alain Delon, um dos maiores astros do cinema francês, aos 88 anos

Ator de filmes de Jean-Pierre Melville e Visconti foi um dos mais brilhantes de sua geração e teve conexões com o crime

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São Paulo

Morreu neste domingo (18) Alain Delon, um dos maiores atores do cinema francês, aos 88 anos, informou a família do artista à agência de notícias AFP. Ele morreu em sua casa, em Douchy-Montcorbon, na França, e a causa da morte não foi divulgada.

Delon sofreu um acidente vascular cerebral há cerca de cinco anos, poucas semanas depois de receber uma Palma de Ouro honorária no Festival de Cannes, e desde então, enfrentava problemas de saúde.

O ator francês Alain Delon - AFP

Em março do ano passado, o ator, que definiu sua vida como bela, reivindicou o direito a uma morte assistida —ou seja, induzida. Queria evitar o sofrimento causado pelas internações em hospitais, pela dor e pelos remédios. Seu filho Anthony, do casamento com a atriz Nathalie Delon, que durou de 1964 a 1969, seria o responsável por assisti-lo.

Delon foi um dos atores mais famosos do mundo, é certo. Mas podia ter sido diferente. Em sua vida, o que não falta são acasos. Não tratemos das atribulações do menino nascido em Sceaux, em 1935, cujos pais se separaram quando tinha quatro anos. Nem da expulsão de seis colégios que frequentou. Nem de sua passagem pela Marinha francesa, onde fez o serviço militar na antiga Indochina, de onde foi expulso depois de roubar um jipe, dirigi-lo em alta velocidade e acabar com o carro tombado num córrego.

Estávamos em 1953, ele ainda não era famoso, mas já era conhecido pela insubmissão. Depois, viveu em Roma por um tempo, quando foi notado por David O. Selznick, o produtor de "E o Vento Levou", entre outros, que o convidou para ir a Hollywood, com um contrato de sete anos.

A condição era aprender a falar inglês. De volta a Paris, ele começou seu aprendizado da língua, ao mesmo tempo em que vivia de pequenos trabalhos, como o de garçom de bar, o que o acabou por aproximá-lo do mundo do crime —em particular da chamada gangue dos Trois Canards, nome do cabaré em Pigalle, bairro de Paris onde os criminosos costumavam se reunir.

Essa ligação marcou Delon para sempre como um associado do mundo do crime, já que da gangue fazia parte Jackie Imbert, morto há cinco anos, considerado um dos chefões do submundo de Marselha. Mas houve outra vida, em que o jovem Delon acabou lançado no cinema graças à atriz Michèle Cordue, casada com o cineasta Yves Allegret. Ela convenceu o marido a dar um papel ao jovem, de quem ela era amante.

Assim, em 1957, Delon estrela "Uma Tal Condessa". Mas Cordue durou pouco. Em 1958, o ator conheceu Romy Schneider, com quem manteve um romance até 1964 e a quem reencontrou em 1969 para filmar "A Piscina".

O estrelato chegaria algum tempo depois, com "O Sol por Testemunha", de 1960, famosa adaptação de "O Talentoso Ripley", de Patricia Highsmith, dirigida por René Clement. No mesmo ano, fez o papel central de "Rocco e Seus Irmãos", de Luchino Visconti, que venceu o prêmio especial do júri no Festival de Veneza.

Alain Delon e Romy Schneider em "A Piscina", de 1969 - Divulgação

Àquela época, não havia mais dúvida sobre seu carisma. Sobre a beleza nunca houvera. Ator? O próprio Delon disse certa vez que era um ator, não um intérprete —que era como via Jean-Paul Belmondo, a outra grande estrela masculina do cinema francês do período. Um intérprete estuda, se prepara, representa. Delon era diferente: "Eu vivo meus papéis".

Vida à beça, então, pois logo em seguida ele faria "O Eclipse", de 1962, com Antonioni; depois, outra vez com Visconti, "O Leopardo", de 1963. Após um intervalo em Hollywood, filmando com atores célebres em produções menores, voltou à França e a René Clement em 1966 com um papel em "Paris Está em Chamas?".

Em 1968, filmou com Louis Malle um dos episódios de "Histórias Extraordinárias", e no ano seguinte "A Piscina", de Jacques Deray.

O ator Alain Delon e a atriz Claudia Cardinale em cena de 'O Leopardo' (1963), filme dirigido por Luchino Visconti - Divulgação

Assim, parece que seus anos 1960 foram marcados exclusivamente pelo cinema de prestígio. Não, Delon mantinha um equilíbrio perfeito entre os filmes ditos de arte e os comerciais. Seu modelo de ator era, afinal, Jean Gabin, desde que o tinha visto em "Grisbi, Ouro Maldito", de 1954, dirigido por Jacques Becker.

Delon não chegaria a filmar com Becker, que morreu prematuramente, em 1960, após fazer a obra-prima penitenciária "A um Passo da Liberdade". Mas a ideia do filme policial o acompanhou na amizade e na fidelidade ao cinema de Jean-Pierre Melville, o mais independente dos cineastas franceses de sua geração —ao ponto de ter um estúdio próprio—, com quem filmou, para começar, a obra-prima "O Samurai", de 1967, e depois "O Círculo Vermelho", de 1970, e "Expresso para Bordeaux", de 1972, o último filme desse diretor que com frequência o revezava, no papel de estrela, com Belmondo.

De Melville, Delon dizia que foi o melhor diretor com quem trabalhou. Não é um elogio pequeno para quem trabalhou com Visconti, Antonioni, Clement, Malle e, nos anos 1970, também com Joseph Losey, com quem fez "O Assassinato de Trótski", de 1972, e o mais bem-sucedido "Cidadão Klein", de 1976.

Sem falar de Valerio Zurlini, que, com "A Primeira Noite de Tranquilidade", de 1972, revelaria um Delon cativante não pelos modos combativos, pelo desempenho atlético ou pela beleza desconcertante, mas pela profunda melancolia que marcava o personagem.

O ator Alain Delon em cena do filme 'A Primeira Noite de Tranquilidade' (1972), de Valerio Zurlini - Divulgação

Gângster, assassino, professor, nobre, burguês. Se foi apenas um ator —"acteur", em francês— e não um intérprete —"comédien"—, como pretendia, ele soube viver seus inúmeros papéis com intensidade e vibração. Mesmo a do mal-estar de existir, como o professor de "A Primeira Noite".

Mas seria pouco limitar a carreira de Delon a esses grandes diretores, mesmo que nessa lista ainda falte Jean-Luc Godard, com quem fez "Nouvelle Vague", de 1990, ou o alemão Volker Schlöndorf, de "Um Amor de Swann", de 1984. Ou mesmo o irregular Bertrand Blier de "Quartos Separados", de 1984.

É preciso lembrar que essa é uma época de ótimos artesãos no cinema francês. Outra ligação importante foi com Jacques Deray, com quem filmaria "Borsalino", em 1970, ao lado de Jean-Paul Belmondo, entre outros.

Delon trabalhou com cineastas de nome menos ilustre, mas nem por isso dignos de esquecimento, que o consagraram como um dos principais atores do filme policial moderno. Cineastas como José Giovanni, Georges Lautner ou, sobretudo, Herni Verneuil, que lhe daria o prazer de trabalhar com seu ídolo maior, Jean Gabin, no grande sucesso que foi "Os Sicilianos", que ainda tinha o italiano Lino Ventura e música do também italiano Ennio Morricone.

É também nessa época que suas ligações criminais, novamente, pareciam não se limitar ao cinema. Em 1969, quando filmou "A Piscina", viu-se envolvido no "caso Markovic". Stevan Markovic era seu guarda-costas e morreu assassinado. O acusado pelo crime, François Marcontani, era velho amigo de Delon, dos tempos de Pigalle. De todo modo, Delon estava longe do local do crime, filmando, e ficou o dito pelo não dito.

Domiziana Giordano e Alain Delon em cena do filme 'Nouvelle Vague' (1990), de Jean-Luc Godard - Divulgação

Mas, como que para confirmar sua proximidade com o submundo, ele abriu um haras, no mesmo ano, em sociedade com a atriz Mireille Darc e Jackie Imbert, o chefão marselhês. Suas ligações perigosas prosseguiram, mas não interferiram em sua carreira de ator, que prosseguiu, mesmo que em pequenos papéis ou aparições como ele mesmo, até 2019, e mesmo de diretor, tendo realizado quatro filmes nos anos 1980.

Depois de tudo que experimentou entre os anos 1950 e 1980, começava o tempo das homenagens, do filme com Godard, dos prêmios pelo conjunto da obra. Do mito, para resumir.

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