Rússia acusa Israel de apoiar 'regime neonazista' na Ucrânia e amplia desgaste
Moscou retoma ataques a Mariupol, palco de retirada de civis, e exorta Ocidente a não apoiar autoridades de Kiev
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
O desgaste da diplomacia russa no exterior ganhou um novo capítulo nesta terça-feira (3), 69º dia de guerra no Leste Europeu, depois de o chanceler russo, Serguei Lavrov, acusar Israel de apoiar neonazistas na Ucrânia. A fala aumenta a tensão iniciada no fim de semana, quando o diplomata disse que Adolf Hitler tinha sangue judeu.
As falas do ministro vão ao encontro de uma das contestadas alegações de Vladimir Putin para iniciar a invasão do território vizinho: a de que era preciso "desnazificar" o Estado ucraniano. O país convive com células nazistas —como o Batalhão Azov, em parte incorporado às Forças Armadas—, mas especialistas dizem que a fala de Putin não se sustenta na realidade.
A acusação de Lavrov veio após seu homólogo israelense, Yair Lapid, condenar as falas sobre judeus e acusar o alto diplomata russo de fazer uso político do Holocausto. Ele pediu que Lavrov se desculpasse pelas declarações, que caracterizou como uma demonstração de racismo.
O episódio, além das trocas de farpas diplomáticas, arrisca mudar a posição de Israel, até aqui um agente neutro no conflito. Tel Aviv tem enviado ajuda humanitária a Kiev, mas hesitou em enviar armamentos, como fizeram outros países. Também despendeu poucas críticas consistentes a Moscou e não impôs sanções econômicas.
Ao subir o tom, Lavrov disse que Lapid fez comentários "anti-históricos" sobre o Holocausto que "deixariam claro o curso do atual governo israelense em apoiar o regime neonazista de Kiev". "Infelizmente, a história conhece exemplos trágicos de cooperação judaica com os nazistas", seguiu o ministro das Relações Exteriores.
A diplomacia do governo Putin ainda refutou argumento —também tido como marginal por especialistas— de que o fato de Volodmir Zelenski, o presidente ucraniano, ser judeu anularia a possibilidade de o país ser comandado por nazistas. "O antissemitismo na vida cotidiana e na política não parou —pelo contrário, tem sido alimentado", disse.
Dados atualizados do escritório de direitos humanos das Nações Unidas mostram que pelo menos 3.193 civis morreram desde o início da guerra, sendo que 227 das vítimas são crianças. Outros 3.353 civis teriam ficado feridos. As cifras, no entanto, são reconhecidamente subnotificadas. O número de refugiados do conflito se aproxima de 5,6 milhões —a Ucrânia tem cerca de 45 milhões de habitantes.
Em campo, a terça-feira foi marcada por uma em partes bem-sucedida tentativa de retirar civis da usina de Azovstal, em Mariupol —a cidade, em muitas medidas símbolo da guerra, está sitiada há semanas, e a planta é uma espécie de bastião das forças ucranianas restantes. Segundo o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, que mediou a abertura do corredor humanitário, mais de cem pessoas, incluindo dezenas de feridos, deixaram a usina e foram para Zaporíjia, na região central.
"Estive em Azovstal por dois meses e meio, e eles [os russos] nos atacaram por todos os lados", disse Olga Savina ao jornal americano The New York Times quando desembarcava de um ônibus do comboio humanitário. Ela afirmou que a luz do Sol chegou a queimar seus olhos após tantos dias vivendo no subsolo.
Ainda assim, o Ministério da Defesa russo, segundo a agência RIA, disse que, ao lado de tropas da autoproclamada república separatista de Donetsk, na região do Donbass, voltou a atacar Azovstal por terra e ar. A pasta alega que forças ucranianas aproveitaram o cessar-fogo para retomar posições no território, o que justificaria os ataques.
A Rússia também voltou a atacar Lviv, cidade do oeste ucraniano próxima à fronteira com a Polônia, o principal destino de refugiados, segundo o prefeito Andrii Sadovii escreveu em uma rede social. A infraestrutura de energia teria sido atingida, prejudicando o abastecimento em parte da região, e uma pessoa teria ficado ferida.
A destruição de uma ponte em Odessa, no sul do país, somada aos ataques a um aeroporto e a um depósito de armas fornecidas pelo Ocidente sinalizam ainda a intensificação da ação russa no mar Negro.
Em Kherson, primeira grande cidade tomada pelos russos ainda no início da guerra, há indícios de que Moscou agora controla a internet e os meios de comunicação. A Ucrânia e seus aliados acusam a Rússia de tentar forjar referendos para legitimar de alguma forma a ocupação.
Putin falou por telefone com o francês Emmanuel Macron —que, por sua vez, havia conversado com Zelenski no final de semana. O russo exortou o Ocidente a parar de fornecer armas à Ucrânia. Mais cedo, o presidente russo assinou um decreto impondo novas sanções de retaliação contra indivíduos e empresas consideradas hostis a Moscou.
O papa Francisco, em entrevista a um jornal italiano, disse que espera há mais de dois meses uma resposta formal da Rússia sobre sua possível visita ao presidente russo. "Temo que Putin não possa e não queira ter esta reunião", disse o pontífice, que também aconselhou o líder da Igreja Ortodoxa, o patriarca Cirilo, a não ser "coroinha de Putin".
Em Kiev, a sessão do Parlamento ucraniano contou com a transmissão de um discurso do premiê britânico, Boris Johnson. O primeiro líder ocidental a falar diretamente aos legisladores da Ucrânia anunciou um novo pacote de ajuda militar e afirmou que o país vencerá a guerra.
Com Reuters e The New York Times
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters