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Caio Guatelli

Revisão do Plano Diretor precisa ser rejeitada

Processo participativo não foi adequado e novo texto não corrige distorções do plano em vigor

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Antes de começar qualquer grande mudança em uma sociedade democrática, o mínimo que se espera é respeito à vontade do povo.

No âmbito municipal, a premissa é garantida pelo Estatuto da Cidade: "gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano".

Poluição encobre o centro de São Paulo; ao fundo a zona leste - Caio Guatelli/Folhapress

O PL 127 do município de São Paulo, da forma como está apresentado, deixa evidente que essa etapa não foi respeitada. Portanto, aos vereadores de São Paulo, que votarão o texto nesta segunda-feira (26), não há outra saída se não a de rejeitar completamente a atual revisão do Plano Diretor Estratégico.

Tanto a Prefeitura quanto a bancada governista no legislativo municipal dizem que os paulistanos tiveram oportunidade de participar. Apoiados na retórica, seus argumentos expõe dados distorcidos e um apelo desenvolvimentista para sustentar o projeto.

Do outro lado estão renomados institutos de pesquisa e profissionais de urbanismo, conselheiros municpais e movimentos sociais que alertam para uma política pública irresponsável e insustentável, capaz de aumentar em até 160 vezes a verticalização de alguns bairros, o que comprometerá a infraestrutura urbana, aumentará a emissão de gases do efeito estufa e piorará o processo de gentrificação, podendo levar a cidade ao caos, mesmo após as novas adaptações do texto, feitas de última hora.

Iniciado sob as restrições da emergência de saúde pública da pandemia de Covid-19, o processo participativo sofreu imensurável impacto negativo do modelo virtual, por videoconferência, ao qual a maioria da população de São Paulo não estava preparada para aderir.

Estudos realizados pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil dão conta que 75% dos paulistanos (8,5 milhões de pessoas) não tinham acesso à internet de banda larga quando o executivo municipal iniciou os ritos de participação popular. A plataforma escolhida, Microsoft Teams, e os "hotsites" criados às pressas pela Câmara e pela Prefeitura, também foram motivo de reclamação de quem tentou participar.

Os inúmeros atropelos e falhas causadas durante o processo, como agenda concomitante de reuniões e a geração de múltiplos protocolos no SEI (Sistema Eletrônico de Informações), contribuíram para dificultar a vida dos conselheiros municipais.

Fica impossível, portanto, tornar democrático o modelo participativo como foi posto.

Infelizmente a situação acabou beneficiando um minúsculo grupo de interessados nas modificações propostas no Projeto de Lei, a indústria do setor imobiliário —maior financiadora de campanha de diversos vereadores paulistanos.

Tal descompasso, entre proposta e quantidade de interessados, ficou patente na última audiência pública realizada pela Câmara Municipal de São Paulo, em 15 de junho. Das 50 pessoas que participaram, apenas duas se manifestaram a favor da revisão levada ao debate. Na ocasião, também chamou a atenção o modo autoritário e preconceituoso do vereador Rubinho Nunes (União), que conduziu a sessão.

O propósito do Plano Diretor de 2014 —diminuir a desigualdade e melhorar a qualidade de vida na cidade— ainda não foi alcançado. Ao invés de corrigir as distorções do texto anterior, a atual revisão continua beneficiando habitação para classe alta, incentiva o uso do carro, não protege o patrimônio cultural, não se baseia em estudos e não soube ouvir a população.

Vereadores, o povo pede um novo debate.

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