Charles M. Blow

Colunista do New York Times desde 2008 e comentarista da rede MSNBC, é autor de “Fire Shut Up in My Bones"

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Republicanos despreparados estão em toda parte na disputa pela Casa Branca

Diante da perspectiva de ser humilhado e preso, Donald Trump não vai hesitar diante de rivais do mesmo partido

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The New York Times

O desajeitado e desprovido de charme Ron DeSantis entrou na disputa presidencial na quarta-feira (25). As pesquisas para as primárias republicanas de 2024 o situam constantemente em segundo lugar, atrás de Donald Trump.

O governador da Flórida, Ron DeSantis, durante convenção republicana
O governador da Flórida, Ron DeSantis, durante convenção republicana - 19.nov.22 - Wade Vandervort/AFP

DeSantis construiu sua imagem em cima de uma reeleição fácil como governador da Flórida e um caminho fácil no qual ele promulgou uma série de leis "anti-woke" intimidantes e retrógradas, graças às supermaiorias dos republicanos no legislativo da Flórida.

Ele exibe seu histórico de realizações como evidência de sua eficácia, mas só o que fez foi vencer uma série de disputas em que seus adversários estavam com as mãos atadas, pelo fato de fazerem parte da minoria.

No entanto, muitos comentaristas e doadores republicanos que andam desesperados para deixar a toxicidade de Trump para trás optaram por DeSantis quando buscavam alternativas ao ex-presidente. Eles inflacionaram seu ego, convencendo-o de que sua presença forte na Flórida o tornaria um nome de peso.

DeSantis parece estar apostando na fadiga dos eleitores com Trump ou possivelmente na possibilidade de os problemas de Trump com a Justiça crescerem tanto que mesmo os defensores mais leais do ex-presidente concluam que ele carrega bagagem demais para conseguir vencer. Se DeSantis não conseguir avançar mais rápido que Trump, ficará à espreita para pegá-lo quando estiver mancando.

Ele não é o único que está apostando nisso. Os pré-candidatos (ou potenciais pré-candidatos) Mike Pence, Asa Hutchinson e Chris Sununu, todos atuais ou ex-governadores estaduais, estão nessa mesma pista. Eles são o grupo de nomes possíveis para o caso de uma emergência: se Trump acabar a caminho da prisão e os republicanos forem obrigados a buscar um substituto de último momento, eles esperam que os eleitores os vejam como alternativas sólidas.

Estão posicionados como candidatos que poderão defender as prioridades políticas republicanas, sem a bagagem e os dramas de Trump. Mas o drama que cerca Trump é justamente aquilo em que muitos de seus seguidores estão viciados. As políticas estão fundidas com a persona.

Trump oferece a seus seguidores a oportunidade de sentir e expressar sua gama completa de emoções: ele os diverte; canaliza a raiva deles; reflete seus anseios opressores; é porta-voz da visão que eles têm de si mesmos como vítimas e é o exemplo que eles seguem de um guerreiro que enfrenta um governo e uma cultura que eles sentem que está se voltando contra eles.

O trumpismo é uma experiência que envolve o eu por inteiro, espiritual em sua profundidade, de modo que o trumpismo sem Trump seria como pregar o cristianismo sem Cristo.

E há a outra pista dos republicanos, em que é oferecida a absolvição do racismo sem arrependimento do mesmo. Essa pista é ocupada por candidatos não brancos que defendem alguma versão desta absolvição opaca e simplista: "A América não é um país racista".

Deixe-me ser claro: todas as pessoas na América são racistas? Não. A raça é a consideração principal e o fator determinante de todos os resultados negativos das pessoas não brancas? Não. Mas o racismo foi um dos princípios fundadores de nosso país? O racismo ainda permeia a sociedade americana e suas instituições? Sim.

E o racismo detesta seu próprio nome. Detesta ser chamado daquilo que é.

Em ciclos eleitorais recentes, republicanos abraçaram candidatos que ofereceram uma versão dessa mensagem –Herman Cain em 2012, Ben Carson em 2016—, ao mesmo tempo que seu partido foi condenado, com razão, por sua obsessão anti-Barack Obama, como o falso escândalo sobre o uso de um terno bege pelo ex-presidente, uma obsessão que foi constantemente modulada pela raça.

Agora os republicanos têm dois candidatos que empregaram essas palavras exatas. Quando iniciou sua pré-candidatura, em fevereiro, Nikki Haley disse: "Acreditem em mim, a primeira governadora da história que faz parte de uma minoria étnica: a América não é um país racista". E quando Tim Scott –que Nikki Haley nomeou para sua vaga no Senado— anunciou a dele, na segunda, ele repetiu algo que havia dito num discurso em 1921: "A América não é um país racista".

As posições políticas de Scott –que abrangem a ala republicana Maga e a ala enfraquecida que segue as posições de Jack Kemp— não são seus argumentos para se fazer eleger. Ele defende uma narrativa, por distorcida seja –um sorriso congelado para um partido fanático.

Haley segue esse mesmo caminho.

Ela e Scott estão utilizando suas vitórias pessoais e políticas próprias não como exemplos excepcionais de pessoas superando obstáculos, mas para falar da altura dos obstáculos e questionar a força de vontade dos outros participantes na corrida.

E é provável que também estejam esperando um relâmpago legal cair, para Trump ficar politicamente incapacitado e o campo das primárias republicanas se abrir completamente.

Trump, porém, vai lutar até o último momento, possivelmente não porque queira tornar-se presidente outra vez, mas porque quer se proteger contra a possibilidade de virar prisioneiro.

Todos os pré-candidatos são movidos pela ambição, mas Trump hoje é movido por uma força mais poderosa: o pânico.

Sim, se ele for eleito outra vez, vai poder alardear que acabou derrotando Joe Biden. Mas ele também sabe que, se reconquistar a presidência, vai recuperar o poder de obstruir as investigações federais pendentes que o ameaçam e de gerar uma crise em torno de quaisquer procedimentos criminais ao nível estadual, como o processo que pode se concretizar na Geórgia.

Trump quer complicar quaisquer possíveis processos contra ele, despertando a fúria de seus seguidores e fazendo os institucionalistas que defendem o Estado de direito pararem para considerar as consequências de penalizar um presidente. Trump já demonstrou que não hesitará em arruinar o país para salvar a si mesmo e que o patriotismo, para ele, vem em segundo lugar distante, atrás da autopreservação.

Trump passou sua vida envolto em confortos e luxos, por cafonas e desajeitados sejam. Ele já desrespeitou as regras com tanta frequência que parece ter esquecido que o sistema legal possui uma gravidade da qual poucos podem escapar para sempre.

Agora, diante da perspectiva de ser humilhado e possivelmente até algemado, ele não hesitará diante de nada em seu esforço para zerar o campo republicano de adversários —e nenhum de seus adversários dá a impressão de estar preparado para isso.

Se você achou que os dois ciclos eleitorais passados foram brutais, aperte o cinto: este daqui provavelmente será pior. Todos os bichos ficam mais ferozes quando estão encurralados.

Tradução de Clara Allain  

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