Gelo e gim

Coluna é assinada pelo jornalista e tradutor Daniel de Mesquita Benevides.

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Gelo e gim

Era uma vez o Bloody Mary como solução para ressaca

Favorito de Hemingway e Hunter Thompson, drinque tem fama de ajudar no pós-bebedeira

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Logo no início de "Era uma vez em Hollywood", filme de Quentin Tarantino, o ator Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e seu dublê Cliff Booth (Brad Pitt) entram num bar/restaurante e vão para o balcão, onde seus drinques são preparados imediatamente.

A câmera passeia por seus rostos enquanto sugam os canudinhos. Um talo grande de aipo emerge como uma árvore do coquetel vermelho de Booth. Pacientemente ele acrescenta mais tabasco e sal ao drinque. É um Bloody Mary, que nos Estados Unidos tem fama de curar ressaca.

Já em 1956, na comédia "Sabes o que Quero", há uma sequência engraçadíssima —descontando-se o machismo evidente e um ingênuo mau gosto— que reforça a lenda.

A sereia Jane Mansfield caminha pela rua e provoca reações as mais diversas: um enorme cubo de gelo derrete sob a mão do entregador; a garrafa de leite jorra da mão do leiteiro; as lentes dos óculos do vizinho se espatifam. Ela é um estouro. Bate à porta de seu agente Tom Ewell e vai entrando. Ele, de ressaca, leva um susto e se fecha correndo no banheiro para se lavar. Quando está se enxugando, vê a mão dela pela porta com uma bebida vermelha. "Tome isso, vai se sentir melhor."

Alguns exageram nos efeitos benéficos do bloody mary no café da manhã. É o caso do jornalista, escritor e rei da Gonzolândia Hunter Thompson. Até aí, nenhuma surpresa. O autor de "Medo e Delírio em Las Vegas" nunca prezou pela moderação. Para ele, o café da manhã era algo sagrado. Um ritual, que começava com quatro bloody marys e seguia com omeletes, leite, doces, salsichas, duas margaritas e seis carreiras de cocaína a serem cheiradas na luz do sol, sem roupas, enquanto lia os jornais.

Alguns tentaram repetir o regime de Thompson, mas não sobreviveram para contar a história.

BALDE DE SANGUE

O fato é que muitos acreditam que as vitaminas do suco de tomate ajudam na recuperação do corpo e que a pimenta faz suar, eliminando as toxinas. A vodca, outro ingrediente importante do bloody mary, teria a função de tornar mais gradual a eliminação do álcool do sangue. A verdade é que, se as duas primeiras afirmações têm algum sentido, a terceira é, infelizmente, só lenda mesmo.

Acontece que, como muitos escritores notaram —e Hemingway é um deles— o bloody mary faz o ressacado sentir-se melhor. Por um tempo. Mas isso se passaria com qualquer bebida alcoólica. A ressaca começa quando o álcool no sangue acaba. Simples assim. (No Brasil, muitos têm o costume de rebater a ressaca com uma cerveja).

O melhor, então, é aproveitar o bloody mary como coquetel e não como remédio. Ótima pedida para brunches ou antes do almoço, sua origem é nebulosa, como a maioria dos drinques famosos. Teria sido criado no Harry's Bar em Paris nos anos 1920, mas há quem sustente que seu inventor foi o antigo astro de Hollywood George Jessel.

Há várias explicações para o nome. As mais divertidas são quase opostas. 1 - Referência à sangrenta Maria Tudor, rainha da Inglaterra no século 16 que mandou queimar centenas de protestantes. 2 - Homenagem a uma garçonete, Mary, do sórdido Bucket of Blood (balde de sangue). O bar na Chicago dos anos 1910 era palco de tantas brigas e facadas que seu assoalho precisava constantemente ser limpo do sangue que se espalhava.

O brinde vai para Willie Nelson. Na música "Bloody Mary Morning" ele canta: "Well it's a bloody mary morning/ Babe left me without warning", algo meio intraduzível. Seria uma manhã para se tomar bloody mary porque sua amada se foi sem avisar? Talvez.

Na dúvida —e sempre— saúde!

*

Bloody Mary

  • 60 ml de vodca
  • 120 ml de suco de tomate
  • 15 ml de suco de limão siciliano
  • 8 gotas de pimenta
  • 4 espirradas de molho inglês
  • 2 pitadas de pimenta-do-reino
  • 1 pitada de sal

Misturar tudo numa coqueteleira com gelo e passar o conteúdo de um lado para o outro, sem bater, umas vinte vezes. Coar para um copo Collins com gelo e acrescentar um talo de aipo.

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