Igor Gielow

Repórter especial, foi diretor da Sucursal de Brasília da Folha. É autor de “Ariana”.

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Bolsonaro faz jogada esperta e de risco ao atacar Congresso em duas frentes

Governo acredita que um pacote Moro imbatível pode ajudar Guedes, mas realidade é bem distinta

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Como era esperado, o governo Jair Bolsonaro começou de fato com o lançamento de duas agendas ao Congresso Nacional: a da segurança pública e anticorrupção de Sérgio Moro e, mais importante, a versão 1.0 da reforma da Previdência de Paulo Guedes.

Sergio Moro e Paulo Guedes no dia em que o então juiz aceitou ser ministro de Bolsonaro
Sergio Moro e Paulo Guedes no dia em que o então juiz aceitou ser ministro de Bolsonaro - Ian Cheibub - 11.nov.2018/Folhapress

Há diferenças naturais na velocidade das coisas. O pacote de Moro já veio com propostas prontas para serem apreciadas, algumas boas, outras perigosas, e até sugestões já consideradas inconstitucionais pelo Supremo. E sem apelar a mudanças constitucionais de trâmite demorado. Já Guedes valeu-se de um vazamento para testar a potência de seu remédio, ou veneno, ao gosto do cliente.

Há uma esperteza aqui, que parece combinar com a euforia que tomou conta das hostes bolsonaristas pela vitória do desconhecido Davi Alcolumbre (DEM-AP) na eleição para a presidência do Senado: a ideia de que a pressão popular irá funcionar sobre bancada ou novatas, ou acuadas pelo rolo compressor das redes sociais.

Não é bem assim. Numa conta da consultoria Patri, 13% da Câmara e 11% do Senado são realmente neófitos, sem nunca ter posto o pé na política. Ex-ocupantes de outros cargos ou mandatos somam 38% dos deputados e 45% dos senadores. O resto, gente reeleita.

Como disse um experiente senador, sim, o plenário que usualmente elegeria Renan Calheiros (MDB-AL) na estapafúrdia eleição da Casa tremeu. Uma última marola da onda de direita de outubro, na sua vertente moralizadora, pressionou o alagoano. Ela se somou à soberba de Renan na condução do processo e pronto, Alcolumbre ficou com a cadeira.

Não que o amapaense seja qualquer novidade política. É apenas um baixo clero que chegou lá circunstancialmente e consolidou a incrível ressurreição do DEM. A missão anunciada por Lula em 2010, quando o petista disse querer “extirpar da política brasileira” a sigla, praticamente estava cumprida em 2016.

Agora, o partido controla ambas as Casa do Congresso e tem o PSDB, que por anos o tratou como uma incômoda linha auxiliar “de direita” (aspas, por favor), como um apoiador coadjuvante —os tucanos deverão ter a vice-presidência do Senado e estão no blocão governista para buscar ocupar as comissões na Câmara. E Lula, bem, Lula está preso.

Na prática, caberá ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) o papel de chefiar o Congresso, ainda que tecnicamente o cargo seja de Alcolumbre em sessões específicas conjuntas. Sua tranquila reeleição o autoriza a isso.

Maia é outro Lázaro do DEM: de um humilhante terceiro lugar com 3% na disputa da prefeitura carioca em 2012 ao posto de fiador da sobrevivência de Michel Temer (MDB) na crise de 2017 e, agora, de porto seguro para reformas de Bolsonaro (PSL).

Isso, claro, se o plano do Planalto der certo. Ele sugere que a Câmara de perfil mais conservador vai abraçar a agenda Moro com entusiasmo, e nada indica que o Senado irá rejeitá-la. Ajustes virão, mas nada muito substancial. A profecia autorrealizável de um Moro imbatível pelo respaldo popular poderá estar cumprida.

Mas a versão dura de reforma de Guedes é outra conversa: uma coisa é contar com entusiasmo de um plenário medroso com PMs atirando por aí, outra é aumentar a idade das aposentadorias.

Como tudo em política, você primeiro coloca o elefante na sala e depois negocia a saída do bicho. Só depois se fala na permissão para que rinocerontes ou quiçá hipopótamos ocupem o espaço. Ao menos, é o que todas as sugestões dadas por figuras como Onyx Lorenzoni e Hamilton Mourão indicam.

O mercado financeiro está arrepiado com a possibilidade de Guedes, por ter colocado seu paquiderme na praça, acabar por vê-lo fatiado pelas hienas antes de entrar no plenário. Esse seria um cenário de pesadelo para Bolsonaro: uma reforma diluída na véspera poderia ter o mesmo fim daquela de Temer, as calendas gregas. O mercurial ministro da Economia poderia pedir o chapéu.

Não é, contudo, a hipótese mais provável. A solubilidade da reforma de Guedes é um dado da realidade, apenas o gradiente disso de forma tolerável ao ministro é que se desconhece. Aqui entra Maia, o ressurrecto, para entendermos qual o risco real para a aposta do governo Bolsonaro.

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