O candidato Ciro Gomes (PDT) disse que "o lulopetismo corrupto" matou o jornalismo brasileiro. O destempero do político, que culpa até a própria sombra pelo fracasso da quarta campanha à Presidência, provoca consternação. Ele sabe que, sem jornalismo investigativo, os crimes em curso no Brasil não teriam vindo a público.
Já Lula tem décadas de atrito com a imprensa, inclusive os justificados. O Lula autoritário queria expulsar um correspondente do jornal The New York Times que, em 2004, relatou preferências etílicas do então presidente. Prevaleceu o bom senso no entorno do Planalto e a cassação do visto de Larry Rohter foi revogada.
Já o Lula democrata, que não tentou se vingar de críticos violando a lei, deve ter tido tempo para refletir sobre esta ironia: o respeito à liberdade de expressão permitiu que parte da imprensa livre se transformasse em estenógrafa da lamentável facção do Judiciário de Curitiba. Sergio Moro considerava parte da elite da mídia política sua linha auxiliar.
Não acredito que um ex-presidente idoso combata um câncer agressivo, passe 580 dias numa cela e sofra perdas na família sem emergir transformado.
Torço para que o candidato que quero ajudar a eleger tenha uma relação com a mídia diferente da que tinha em 2010. Por tudo o que tem dito, pelos encontros que marcou, Lula sabe que, desta vez, o Brasil não está elegendo o mesmo PT, mas, acima de tudo, derrotando o fascismo teocrático.
No segundo mandato de Dilma Rousseff, o PT exerceu pressão maior para ocupar o espaço de comunicação do Planalto. Queria continuar apadrinhando sites leais, cujo "jornalismo", além de atingir um público risível, não passava de relações públicas. Há muito o que um presidente Lula possa fazer, se reconhece que uma imprensa independente, crítica e diversa é crucial para a democracia enfraquecida.
Nada de mesadas a blogueiros servis. O desaparecimento da reportagem local é grande aliado da violência política, da destruição ambiental e do crime organizado. Um governo Lula pode fazer diferença.
Em novembro passado, Joe Biden tentou incluir num ousado pacote de medidas econômicas, um programa de incentivo fiscal para Redações locais empregarem repórteres. Biden tem uma lista de realizações, em 19 meses de governo, de fazer inveja a seus antecessores na Casa Branca. Mas a cobertura a sua gestão, no mesmo período, foi bem mais negativa.
Ele é o primeiro presidente americano não autoritário a governar nesse ecossistema, em que boa parte do público só consome fatos que confirmem sua identidade ou crença em conspirações.
Espero que Lula compreenda que, a partir de janeiro de 2023, vai enfrentar uma artilharia crítica selvagem e diferente da de empresas de mídia cujas Redações usam critérios de jornalismo mainstream.
Ele assistiu ao espetáculo de comentaristas cunhando cretinices como bolsopetismo, sugerindo equivalência entre ele e Bolsonaro. Alguns dos mais conhecidos pertencem à safra produzida durante seus dois mandatos.
Uma assessoria de imprensa transparente, que não recompense jornalismo de acesso; um(a) porta-voz com sangue frio e intelecto para não morder a isca de provocações como as feitas diariamente pelo propagandista de plantão da Fox na Casa Branca; e a eficiência para distinguir jornalismo orgânico de campanhas de desinformação, com interferência de outros países, como é comum hoje, são importantes para Lula governar.
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