Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Marina Izidro
Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

A amarelinha é novamente de todos

Depois dos gols de Richarlison, talvez dê para encerrar esse assunto pelo menos até a próxima Copa ou eleições

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Demorei uns 10 minutos para encontrar a camisa amarela da seleção na minha casa. Eu tinha comprado para a Copa do Mundo da Rússia, e fazia quatro anos que não a usava –por motivos óbvios. Era a manhã da estreia do Brasil no Mundial e a partida começaria aqui na Inglaterra às 19h. Procurei nos armários, nas gavetas, e nada. Achei dentro de uma mala, tão abandonada que tinha cheiro de guardada. Botei para lavar e comecei a pensar se ia ter coragem de usá-la à noite.

Enquanto isso, procurei na internet uma camisa azul retrô. Achei uma linda, de 1958, do Pelé. Aí sim! Olhei a data de entrega...duas semanas. As amarelas chegavam no mesmo dia. Por que demorei tanto para me planejar?

Na hora de sair de casa para o lugar do jogo —um evento com torcida brasileira em Londres— hesitei um pouco antes de vestir a amarelinha, ainda meio envergonhada. Já faz bastante frio aqui e coloquei um casaco por cima. "Pelo menos ninguém vai me ver no metrô com ela", pensei.

Quando entrei no tal lugar, uma sensação de alívio e de pertencimento voltou. Era um bar enorme, com vários telões, no leste da cidade, e cheio de brasileiros legais —por "legais", entenda pessoas que estavam ali para curtir a noite e torcer pelo futebol do Brasil, não para usar o uniforme como símbolo político. Em meio a um mar de camisas amarelas, azuis e brancas, todos se sentiam à vontade.

Mas ainda tinha um motivo de angústia. Na estreia da Inglaterra, na última segunda-feira (21), Jack Grealish comemorou o primeiro gol dele em Copas do Mundo homenageando uma criança com paralisia cerebral que ele havia conhecido alguns dias antes. Uma estrela do futebol que, na competição mais importante da vida faz gol e, em meio à emoção, se lembra do menino!

Enquanto isso, o craque da minha seleção havia dito que homenagearia um homem que debochou de pessoas com Covid-19 que não conseguiam respirar. Como eu me sentiria se esse jogador marcasse e eu estivesse de verde e amarelo?

A agonia foi à toa. Richarlison, com dois chutes certeiros, ajudou o Brasil a se unir.

Richarlison ergue os braços em frente a arquibancada cheia de torcedores com camisetas do Brasil
Richarlison vibra depois de marcar contra a Sérvia e levantar a torcida na arquibancada; amarelinha recuperada - Amanda Perobelli/Reuters

Talvez você não aguente mais o debate sobre o sequestro da camisa amarela pela extrema direita e como ela pertence a todos os brasileiros. Quem sabe agora possamos encerrar o assunto —pelo menos, até a próxima eleição ou Copa do Mundo.

Até porque, é curioso ver como outros países torcem. Se você achou fofo ver os japoneses recolhendo o próprio lixo das arquibancadas em um ato de extrema civilidade, aqui na Inglaterra a empolgação é tanta que eles sujam tudo de cerveja.

Existe uma fascinação difícil de entender sobre entrar em uma fila, pagar o equivalente a R$ 40 por uma cerveja e imediatamente jogá-la para cima assim que sai um gol. Imagino que donos de pubs fiquem divididos: quanto maior o placar, mais bagunça. Ao mesmo tempo, os ingleses ficam mais felizes e gastam mais. Os galeses parecem mais comportados.

É uma Copa diferente para os britânicos. O torneio é sempre no verão europeu, eles estão acostumados a usar roupas leves e ver as partidas em áreas abertas e parques. Desta vez, já é quase inverno, está chovendo, a temperatura não tem passado dos 12 graus e escurece antes das 17h. A solução é colocar o casaco e o cachecol e ir para o pub mais próximo. Pelo menos, quem ficou aqui e não foi para o Qatar consegue beber cerveja de verdade.

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