Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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'Parece que todo o mundo combina de começar a te chamar de senhora', diz Andrea Beltrão

Interpretando uma mulher que acorda depois de 20 anos em coma, atriz aparece de cabelos brancos e sem maquiagem no filme 'Ela e Eu', conta que confundem a sua vivacidade com beleza e afirma que não abre mão de nadar em mar aberto todos os dias pela manhã

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A atriz Andrea Beltrão

A atriz Andrea Beltrão Nana Moraes/Divulgação

O filme "Ela e Eu", que estreia nos cinemas na próxima quinta-feira (21), era para ser uma comédia, com o mesmo argumento central, escrito pelo cineasta Gustavo Rosa de Moura ("Canção da Volta"). Bia, personagem de Andrea Beltrão, tem um problema durante o parto de sua única filha e entra em coma. Vinte anos depois, acorda. Seu marido, personagem de Eduardo Moscovis, está casado com outra mulher, Renata, vivida por Mariana Lima, a quem sua filha, Carol, interpretada por Lara Tremouroux, chama de mãe.

Virou um drama por causa de Andrea Beltrão, que foi convidada para ser a protagonista. "Ia chamar ‘Antes Tarde do Que Nunca’", conta Andrea, em uma entrevista por Zoom de sua casa no Rio. "Quando li o roteiro, achei o argumento muito bom, mas eu não concordava com a comicidade da história, achava excessiva. Então falei que eu não era a atriz ideal, porque gostaria de fazer o filme de outra maneira", conta.

Em vez de manter o roteiro e trocar a intérprete, Gustavo decidiu fazer o contrário: manter a atriz e mexer no roteiro. "Aí começamos a conversar. Eu dizia o que achava e ele falava: ‘Então eu vou mexer um pouquinho no roteiro’. Voltava com uma nova versão, a gente batia mais um papo e ele dizia: ‘Tá, então vou mexer mais um pouquinho no roteiro’. Uma hora ele falou: ‘Pô, trabalha comigo no roteiro’. Não sou roteirista, não tenho essa experiência. Mas acabei sendo convencida a criar a história junto dele".

A atriz Andrea Beltrão
A atriz Andrea Beltrão - Nana Moraes/Divulgação

Com o tom da história considerado adequado pela atriz, o diretor convocou os outros atores principais para trabalharem nos seus personagens. "A Mariana [Lima] construiu a personagem dela, o Du [Moscovis] criou o personagem dele e a Luisa Arraes, que ia interpretar o papel da filha, criou a personagem dela. Depois, por um problema de agenda, ela não pôde fazer o filme e entrou a Lara [Tremouroux], que também ajudou a construir a Carol da história. A Karine Teles, que faz a cuidadora da minha personagem, também colaborou no roteiro. Foi um grande barato, quase um cinema de grupo", afirma Beltrão.

"Mas claro que a assinatura final de tudo é do Gustavo, um diretor que presta muita atenção aos atores. Ele é muito livre para ouvir ideias, ao mesmo tempo sabe o caminho que quer tomar", conta ela.

O resultado é um filme que toca em muitos temas ligados às relações entre as pessoas, especificamente como uma família segue adiante quando um dos membros sofre uma limitação trágica, uma incapacidade total. "É muito difícil, e pode acontecer a qualquer hora, com qualquer pessoa. A gente está sempre sujeita a isso, a nossa vida é um fio."

Em cena, Andrea está de cabelo comprido e grisalho, sem maquiagem, com figurino sem nenhum glamour, diferentemente de quase tudo o que ela fez na sua longa carreira de mais de 40 anos de trabalhos no cinema, no teatro e na TV. "Adorei aquela peruca, me senti muito à vontade", conta a atriz. "E não tenho o menor problema de trabalhar sem maquiagem, acho tudo legal", afirma. Ela conversa com a coluna no final de um longo dia de trabalho, com vídeo ligado, de óculos, uma camiseta listrada e o cabelo nada arrumado, em que passa a mão e despenteia pra lá e pra cá enquanto responde às perguntas. E ri quando percebe que vai ficando cada vez mais descabelada.

Conta que tem muita vontade de deixar o cabelo branco, mas não já. "Ainda gosto dele pintado. Mas uma hora eu vou raspar a cabeça e deixar ele crescer branco, tenho muita vontade de fazer isso. Adoro raspar a cabeça", afirma. Andrea diz que se cuida, mas sem neurose. "Saio do banho e passo creme porque uso muita maquiagem no trabalho e minha pele resseca", diz. "E fiz uma plástica no pescoço que eu adorei, achei maravilhosa. Estava com uma pele solta, me chateando, aí fiz e gostei à beça. Mas foi essa e fim, nunca mais".

Andrea acredita que ir muito à praia e ser muito animada, gostar de rir, trazem a ela uma vivacidade que faz as pessoas confundirem com beleza. Ela vai à praia todos os dias, entre 6h e 7h30 da manhã, nadar em mar aberto. No sol do Rio de Janeiro. "Se não vejo o sol, fico doida", conta. "E no mar eu vejo tartaruga, vejo cardume de peixes, vejo sardinhas, tem arraia".

Ela não nada sozinha, faz parte de uma equipe que tem vários professores que acompanham os nadadores em pranchas de stand-up paddle. "Eu tenho um certo cuidado e muito respeito pelo mar. E também não quero que apareça uma baleia e me coma", diz. "Esse momento do dia, para mim, é insubstituível. Se aparece um trabalho que começa de manhãzinha eu minto que tenho um compromisso muito importante e só posso chegar depois das 8h15. Acordo antes das seis, nado, volto pra casa, tomo um banho, engulo um suco e vou embora".

Aos 58 anos, Andrea conta que a única coisa que percebeu de diferente na vida foi ter começado a ser chamada de senhora "uns três, quatro anos atrás". "E é um complô, né? Parece que todo o mundo combina de começar a te chamar de senhora ao mesmo tempo", diz. "Mas para mim isso não é uma coisa ofensiva porque eu chamo todo o mundo de ‘senhor’, ‘senhora’. Se vou no mercado, por exemplo, e não conheço a pessoa do caixa, eu pergunto: ‘O senhor sabe o preço disso aqui?’. Acho que é respeitoso, um bom começo de relação. Mesmo que a pessoa tenha 20 anos, ela vai se sentir confortável com uma demonstração de civilidade. Eu acho".

Contratada da TV Globo há 35 anos, Andrea diz que não sabe até quando vai continuar na emissora, que nos últimos anos tem rompido contratos longos com atores, atrizes, apresentadores e jornalistas. "As coisas estão mudando lá, e eu espero que seja para melhor", afirma. "Tenho muito respeito e admiração pelo que a Globo fez de dramaturgia", conta a atriz, que foi revelada com o papel da jornalista Zelda Scott, que namorava dois surfistas melhores amigos, no seriado "Armação Ilimitada", dirigido por Guel Arraes, que foi de 1985 a 1988.

Além do trabalho como atriz, Andrea é empresária há 17 anos. Em parceria com a atriz Marieta Severo, é sócia do teatro Poeira, num casarão restaurado no bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro. "Só consegui construir o Poeira porque tive a sorte de ficar contratada pela Globo por muito tempo, senão não teria uma condição financeira tão Estável", afirma.

"E tivemos bons patrocínios, durante muito tempo. Até que, com a chegada desse novo governo, nós e todos os artistas perdemos muitas possibilidades", conta.

O teatro ficou fechado durante dois anos, pela pandemia, e não demitiu nenhum funcionário nesse período. Reabriu no final de junho com as duas sócias em cena e na produção da peça "O Espectador", escrita pelo dramaturgo romeno Matéi Visniec.

"Foi a Marieta que teve a ideia de a gente procurar uma peça do Matéi, e chegamos a essa, que chama ‘O Espectador Condenado à Morte’. Mas acabamos cortando o ‘condenado à morte’ do título, porque o que a gente quer é vida para todos, não a morte", afirma.

Com direção de Enrique Diaz e Marcio Abreu, "O Espectador" tem, além de Andrea e Marieta, as atrizes Renata Sorrah e Ana Baird no elenco. Definido como um "espetáculo-encontro", a peça se passa em um tribunal em que o espectador é o réu e está sendo julgado, mas não sabe o porquê. As atrizes se revezam nos papeis de advogadas de acusação e de defesa, juízes e testemunhas.

A atriz Andrea Beltrão
A atriz Andrea Beltrão posa para um retrato - Nana Moraes/Divulgação

"A gente escolheu essa peça porque ela tem uma relação muito direta, muito reta, com o espectador. As personagens falam com o público o tempo todo, provocam, chateiam, fazem piada. Era tudo o que a gente queria, ir ao encontro do público, fazer uma festa para celebrar a abertura do teatro, com todo mundo junto", conta Andrea.

A peça está com ingressos esgotados até setembro, programada para ficar em cartaz até o dia 2 de outubro. Depois disso, deve viajar para outras capitais, e o plano é que vá para São Paulo com o elenco original no começo de 2023.

Andrea é casada com o cineasta Maurício Faria há 28 anos, com quem tem três filhos, todos já na casa dos 20 anos. Com a atriz e colunista da Folha Fernanda Torres, fez uma parceria de cinco anos durante a gravação do seriado "Tapas & Beijos", da Globo, que estreou em 2011 e ficou no ar até 2015. E com Marieta Severo tem uma sociedade de 17 anos. A coluna pergunta qual o segredo para manter relacionamentos pessoais e profissionais tão longos. Ela pensa um pouco e diz que não sabe. Então arrisca: "Acho que é sorte".

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