Pedro Diniz

Jornalista com formação em comunicação audiovisual pela Universidade de Salamanca (Espanha).

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Descrição de chapéu Moda

Alta-costura faz do sonho um circo de absurdos

Temporada parisiense tece crítica ao racismo e à nobreza decadente com visual espalhafatoso

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Modelo desfila coleção de alta-costura primavera-verão 2019 da grife Christian Dior, em Paris

Modelo desfila coleção de alta-costura primavera-verão 2019 da grife Christian Dior, em Paris Gonzalo Fuentes/Reuters

O primeiro mandamento para entender a moda é aceitar que nada pode ser lido ao pé da letra, porque o bizarro anda de mãos dadas com a beleza.

Mas a questão maior da mais recente temporada de desfiles de alta-costura em Paris —que antecede o circuito prêt-à-porter, no próximo mês —é que o bizarro, propositadamente, virou falta de bom senso.

Como esponja da paisagem político-social, estetas importantes da passarela transformaram em pó o sonho embalado em tule e seda da alta-costura, o segmento mais exclusivo da moda, definido pela confecção sem limite de preço e feita sob medida.

É tudo um grande circo, advertiu a Christian Dior ao criar um picadeiro para um desfile carnavalesco de pierrôs e colombinas monocromáticas. 

A commedia dell’arte italiana inspirou a estilista Maria Grazia Chiuri na acidez virginal do desfile. Vestidos lânguidos, alguns com estrutura de anáguas, combinavam com toucas-capacete da Idade Média, lidas como referência ao cerceamento da liberdade ao estilo “O Conto da Aia”, livro de  Margaret Atwood que virou série.

Na mesma linha da estética do absurdo seguiram os holandeses da Viktor & Rolf, marca incensada entre modernos endinheirados. Se acontecer o improvável e conseguirem colar um look no Oscar, não haverá tapete suficientemente longo para fazer caber os volumes exagerados, as proporções disformes e as cores berrantes desse manifesto pop.

“Não”, “eu não sou tímida, só não gosto de você” e um irônico “menos é mais” foram colados aos vestidos exagerados de boneca, sonoros risos ao ativismo de fachada das dondocas que vociferam ao celular.

Nesse império da irrealidade, a Balmain imaginada por Olivier Rousteing estreou na passarela com exagero, uma ode à tesoura de plumas e silhuetas ajustadas de Pierre Balmain, morto em 1982.

Envernizada de futurismo, só que de gala, a coleção explode em bordados, ombros e babados rígidos.
Poucos tiram da Valentino, no entanto, a coroa da temporada.

O enorme vestido de Lady Gaga no Globo de Ouro foi um prólogo da história de glamour estonteante escrita pelo estilista Pierpaolo Piccioli, que pesou a mão nos brilhos, nervuras e plissados geométricos.

Enquanto fez berrar as cores dos vestidos, suas modelos negras saturaram a crítica à segregação racial que a alta-costura, invenção de um Ocidente que volta a discutir o tema nas páginas policiais, reproduzia ao preterir não brancos.

A base do roteiro é um clique emblemático de Cecil Beaton para a Vogue, em 1948, na qual nove mulheres de alta-costura se socializam em cenário palaciano —um tom segregante e condescendente que essa nova ordem fashion, pelo menos nos sonhos, diz desprezar.

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