Ross Douthat

Colunista do New York Times, é autor de 'To Change the Church: Pope Francis and the Future of Catholicism' e ex-editor na revista The Atlantic

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Ross Douthat

Trump é movido a confronto, mas seus rivais do Partido Republicano não precisam ser

Nada ajudaria mais o ex-presidente do que lembrar aos eleitores indecisos que eles o preferem ao velho establishment

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

The New York Times

Pouco antes do Natal, escrevi uma coluna alertando sobre a decepção que muitos poderão sentir se Donald Trump deixar o palco político com um simples gemido —perder a primária presidencial republicana para alguém como o governador Ron DeSantis, da Flórida, e então obscurecer aos poucos, como normalmente fazem ex-presidentes— em vez de sair com o espetáculo de uma supernova.

Eu não estava prevendo que isso aconteceria necessariamente; Trump pode muito bem acabar sendo o candidato republicano em 2024. Em vez disso, eu previa que, se ele for derrotado, devemos esperar que será de maneira discreta, deixando muitos de seus antigos adversários ainda estranhamente famintos por uma luta.

Homem engravatado, o ex-presidente Donald Trumpo, fala em frente a um microfone
O ex-presidente Donald Trump fala em um evento em Columbia, na Carolina do Sul - Logan Cyrus - 28.jan.23/AFP

Podemos ver essa fome em vários artigos publicados na última semana. O primeiro é um na Atlantic, de McKay Coppins, relatando o fatalismo dos republicanos que querem que Trump saia, mas não querem combatê-lo ativamente.

Coppins sugere que o núcleo do partido basicamente caminha como um sonâmbulo para mais um cenário de 2016, quando Trump vence um campo dividido porque ninguém descobre como enfrentá-lo diretamente, ou para um desastre diferente, no qual ele perde as primárias, mas emerge forte o suficiente para concorrer por um terceiro partido, criando um cisma duradouro no Partido Republicano.

Depois, para The Daily Beast, Matt Lewis retoma o tema do sonambulismo, alertando os possíveis adversários contra um "cálculo falho" no estilo de 2016 de que o ex-presidente "desaparecerá aos poucos, por si só" e instando-os a "lançar um ataque constante" ou, caso contrário, que esperem a derrota.

Enquanto isso, Sarah Longwell, de The Bulwark, acrescenta carne ao cenário do terceiro partido, citando sua pesquisa que mostra que 28% dos eleitores republicanos apoiariam uma candidatura independente de Trump em vez de outro candidato republicano e afirmando que qualquer esforço anti-Trump eficaz precisa de um plano para desgastar esse bloco Sempre Trump "antes que seja tarde demais".

O desejo de confronto em todas essas visões faz absolutamente sentido como uma análise retrospectiva da situação republicana em 2016, quando os candidatos não Trump gastaram muito de seu tempo (e dinheiro) perseguindo um ao outro até que foi tarde demais para deter a consolidação do rival.

Mas o cenário de 2024 parece muito diferente. A consolidação já aconteceu; a maioria do eleitorado das primárias republicanas já terá votado duas vezes nele, encontrado coisas para gostar em suas políticas ou escolhas judiciais e se identificado com ele em várias controvérsias —o que significa que é muito mais provável que um republicano rival os conquiste por simples exaustão, como ocorre numa sucessão pós-presidencial, do que por tentativas firmes de derrubar a preferência por ele no Partido Republicano.

E os dados de Longwell mostram que a história de exaustão basicamente já está acontecendo: a mesma pesquisa que mostra a resiliência de uma retaguarda do Sempre Trump também mostra DeSantis derrotando o rival em um potencial confronto direto, por 52% a 30%, e vencendo-o facilmente mesmo num campo cheio de pré-candidatos. (E, como DeSantis está tão bem nas pesquisas, esta hipótese pode não acontecer.)

Em relação a outras pesquisas recentes, a vantagem de DeSantis na do Bulwark é excepcionalmente alta. Mas há levantamentos de alta qualidade suficientes que mostram o enfraquecimento de Trump para dizer que o governador da Flórida se tornou um candidato plausível, até mesmo possível favorito —e ele fez isso permanecendo em sua faixa e permitindo que os eleitores cansados de Trump o procurem por conta própria, sem exigir que rejeitem ativamente o ex-presidente e toda a sua pompa e obras.

É claro, se DeSantis realmente concorrer, precisará responder com mais firmeza aos ataques de Trump e se preparar para confrontos e debates. E se o governador murchar sob o escrutínio nacional o apoio central de Trump certamente é suficiente para que ele vença uma primária profundamente fraturada.

Mas não há razão para se pensar que DeSantis se beneficiaria de tentar afastar os principais apoiadores de Trump com ataques dirigidos a seu amado líder agora, quando todo o seu sucesso vem de deixar que o ex-presidente mantenha seu núcleo e ele, DeSantis, tornar-se atraente para o resto do eleitorado republicano. E definitivamente não há vantagem se um bando de doadores, políticos ou ex-autoridades eleitas se unirem numa frente pública Parem Trump; nada ajudaria mais a Trump do que lembrar aos eleitores indecisos que eles o preferem ao velho establishment.

Não: Trump pode desaparecer antes de uma consolidação de DeSantis ou pode conseguir uma vitória quando o próprio DeSantis desaparecer. Mas o cenário em que há um momento de verdade, um nocaute, um tijolo arremessado com perfeição que faça Trump parar de flutuar e simplesmente afundar, parece excesso de otimismo. O gemido, não o estrondo, é o único desfecho plausível.

Bem, exceto por este detalhe: a aposta em terceiros, que é vista pelos que buscam o confronto como a punição à espera do Partido Republicano se Trump for apenas derrotado, sem ser esmagado, é a coisa mais provável para acabar totalmente com a influência trumpiana, para realmente quebrar seu poder de uma vez por todas.

No Twitter, eu disse que tal aposta é improvável. Há todo tipo de razões —de dinheiro a autoimagem a leis do perdedor inconformado destinadas a impedir que candidatos derrotados nas primárias participem da eleição geral— pelas quais é difícil ver Trump realizando uma campanha de protesto numa corrida entre DeSantis e o presidente Joe Biden.

Mas é verdade que Trump não precisaria conseguir todos, ou mesmo a maioria, dos eleitores do Sempre Trump para inclinar uma disputa acirrada para longe do Partido Republicano, para dar a DeSantis uma derrota na eleição geral como vingança por tê-lo derrotado primeiro.

Trump seria o Ralph Nader de 2000 nesse cenário, embora provavelmente com uma porcentagem maior de votos.

Mas agora imagine, num ambiente consideravelmente mais polarizado do que aquele (no qual todos os democratas que eu conhecia amaldiçoavam Nader), republicanos acordando para um segundo mandato de Biden que aconteceria por causa de Trump de uma maneira mais direta e inegável até do que suas derrotas nas midterms de 2022. Eles sentiriam mais exaustão do tipo que atualmente beneficia DeSantis? Não: acho que nesse cenário a maioria dos republicanos se tornaria, finalmente, anti-Trump.

O que o torna um cenário que uma publicação como The Bulwark, amplamente comprometida em derrotar não apenas Trump, mas o atual Partido Republicano, deve considerar praticamente ideal. Mas, para os republicanos que poderiam preferir que Trump seja derrotado do que simplesmente vê-lo desaparecer, é um lembrete dos limites de seu poder após 2016.

Eles provavelmente não podem derrotá-lo; ele teria que derrotar a si mesmo.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.