Ross Douthat

Colunista do New York Times, é autor de 'To Change the Church: Pope Francis and the Future of Catholicism' e ex-editor na revista The Atlantic

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Haverá uma volta por cima para Joe Biden?

Êxito ou fracasso do futuro do Partido Republicano são decisivos para futuro político do presidente dos EUA

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The New York Times

Algo incomum aconteceu com Joe Biden na semana passada. Uma pesquisa respeitável, da revista The Economist e do instituto YouGov, lhe deu um índice de apoio positivo, com aprovação de 50% dos eleitores registrados e desaprovação de 47%.

Talvez a pesquisa tenha sido um desvio que fugiu da regra: os números de aprovação do presidente vêm subindo desde que atingiram o ponto mais baixo, mas sua média de aprovação ainda não chega a 45%.

Talvez qualquer melhoria seja desfeita com a divulgação de novas revelações de documentos sigilosos de seus tempos de vice-presidente guardados incorretamente –se bem que seria difícil superar o fator cômico do fato de alguns dos papéis terem estado na garagem com o Corvette do político.

Joe Biden, presidente dos EUA, durante discurso na Rede de Ação Nacional Martin Luther King, em Washington - Andrew Caballero-Reynolds - 16.jan.23/AFP

Mas agora, com os republicanos no Congresso se preparando para um ano de disputas internas acirradas e manobras fiscais de risco, vale a pena refletir sobre o que seria preciso acontecer para Biden descrever uma verdadeira volta por cima –um retorno à popularidade real.

Antes das midterms, tentei identificar três pecados originais da administração Biden: três rumos seguidos que foram escolhidos livremente, reveleram-se desnecessários e contribuíram para os baixos números de aprovação do presidente. Foram: as decisões iniciais da Casa Branca de limitar a produção petrolífera e revogar algumas das políticas migratórias de Trump (que foram seguidas pelo aumento grande nos preços da gasolina e pela crise na fronteira); os gastos excessivos do plano de resgate, que contribuíram para a alta da inflação; e a ausência de qualquer moderação real sobre questões culturais, como a imagem original de Biden, de democrata católico moderado, havia sugerido que iria acontecer.

Uma questão que não incluí nesse rol foi a retirada caótica do Afeganistão. Não o fiz porque não foi uma questão que tenha tido grande influência na campanha para as midterms e porque achei que a retirada propriamente dita foi uma decisão necessária e corajosa, não obstante sua execução desastrosa.

Mas se olharmos para o arco dos índices de aprovação do presidente, a queda de Cabul parece ter assinalado um importante ponto de inflexão, o momento que semeou as primeiras dúvidas sérias quanto à competência da administração. Logo, visualizar uma volta por cima requer que se imagine que esses problemas tenham sido superados ou revertidos ou que sua importância e visibilidade tenham diminuído.

Na área da economia, um cenário desse tipo funcionaria assim: a Câmara sob controle republicano elimina qualquer possibilidade de novos gastos inflacionários, a inflação continua a cair sem que o desemprego aumente, a reabertura da China ajuda a normalizar a economia global, a arma energética de Putin mostra ser um golpe isolado, não um que tenha efeito contínuo, e conseguimos passar por esse período pós-pandêmico estranho sem sofrer uma recessão real.

Na política externa, o melhor cenário provavelmente envolverá mais avanços dos ucranianos e então alguma espécie de cessar-fogo estável, o que talvez permitiria a Biden ser saudado como responsável por frear a agressão russa e também por administrar com sucesso os riscos de uma Terceira Guerra Mundial.

Pode ser que em vez disso o impasse sangrento se prolongue, mas o tratamento dado pela Casa Branca à Guerra da Ucrânia é provavelmente sua melhor política até agora. Se dentro de um ano ainda parecer que é bem-sucedida, a memória do colapso de Cabul provavelmente será totalmente apagada.

Com relação à imigração e à crise de fronteira, está claro que a gestão pensa que, com a adoção de novas restrições ao asilo, está descrevendo um desvio à direita. Mas a eficácia política da medida vai depender de ela realmente ter resultados.

Sobre outras questões culturais, parece pouco provável que o democrata execute qualquer virada notável. Mas a Casa Branca pode esperar que um governo dividido alivie as ansiedades dos eleitores com o excesso de "modernidade", sem que a administração precise fazer quaisquer inimigos à sua esquerda.

O papel dos parlamentares republicanos geralmente é fundamental para o cenário da recuperação. A administração Biden pode se recordar das voltas por cima políticas descritas por Bill Clinton e Barack Obama, claramente facilitadas pela irresponsabilidade republicana. A julgar pelo que aconteceu até agora com a presidência da Câmara com Kevin McCarthy, a história pode estar começando a se repetir.

Mas com uma diferença importante: Clinton e Obama eram políticos de talento incomum e que estavam na melhor fase de suas vidas políticas, enquanto Biden é outra coisa —um insider político simpático, mas que evidentemente já está muito velho para o cargo que ocupa.

De vez em quando essa realidade pode ser inesperadamente vantajosa. Em casos como as revelações sobre documentos sigilosos ou os imbróglios de Hunter Biden, a ideia de o presidente fazer alguma coisa dúbia de modo acidental ou impensado, não com má-fé intencional, é mais plausível do que teria sido o caso em Presidências anteriores.

Mas principalmente a idade de Biden cria dificuldades com que as administrações Clinton e Obama não precisavam se preocupar. Quando os acontecimentos se voltarem contra seu governo, como foi o caso em 2021 e com certeza pode voltar a acontecer em 2023 se os cenários acima apresentados não se concretizarem, ele pode parecer sobrecarregado, mal preparado para liderar ou para imprimir uma virada ao país. E, mesmo quando as coisas vão bem –mesmo em um cenário claro de volta por cima–, a sombra das capacidades diminuídas de Biden ainda pode prejudicar sua base de apoio.

Isto é, se os republicanos conseguirem encontrar um candidato rival que forme um contraste claro com o atual presidente. Se, em vez disso, eles voltarem a um certo ex-presidente que o democrata já derrotou uma vez –bem, esse é o cenário que mais aponta para uma volta por cima de Biden e o caminho mais claro para outro mandato para ele.

Tradução de Clara Allain 

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