Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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CPI do golpe e seus riscos são obra do início confuso de Lula 3

Começos de governo são confusos, mas Lula 3 está criando muito conflito desnecessário

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São Paulo

Começos de governos são confusos. É assim até com gente experimentada, como Lula 3, seus ex-colegas de Lula 1 e 2 e tantos ex-governadores.

Costuma ser assim até por motivos aparentemente banais, como falta de entrosamento entre ministros e de tempo para afirmação de uma liderança que coordene a administração. Ou também porque não se firmou um relacionamento com o Congresso. Não quer dizer que, com o tempo, a máquina de governar se assente, sem mais. Quer dizer apenas que algum tempo é necessário.

Com os olhos fechados e a mão no rosto, próxima ao olho esquerdo, o presidente Lula está de terno escuro e gravata listrada, durante a celebração dos cem dias de governo
O presidente Lula, durante celebração dos cem dias de governo - Evaristo Sá/AFP

Por outro lado, é possível que se bagunce esse período de sedimentação, deixando a água turva. A falta de clareza sobre o programa de governo é um problema. A multiplicação de conflitos, ainda mais conflitos contraproducentes, também, assim como a desconsideração de alianças. Dar assunto para a oposição é mais problema. O governo Lula tem dado chance para o azar.

Lula 1 (2003-2006) foi confuso pelo menos até meados de 2004. Mas teve a sabedoria de estabilizar a economia, consolidando um programa apenas iniciado sob FHC 2, o conhecido e agora abalado tripé de superávits, metas de inflação e câmbio flutuante. Teve a boa sorte de governar em anos bons na economia mundial. Não tinha a prevenção de quase metade do país. Etc.

Lula 3 começou queimando as pontes de boa vontade que, na eleição, o conectaram a parte do eleitorado e elite antibolsonaristas. Nesse fogo, foi-se a grande e surpreendente boa vontade dos credores e da finança, até outubro animados em derrubar as taxas de juros.

Ao dar caneladas na ideia de controle da dívida pública e na meta de inflação, Lula degradou as condições financeiras. Foram até aqui mais seis meses de taxas de juros desnecessariamente altas e de confiança perdida. Seu governo e o país pagarão mais caro até que Lula consiga resultado, ora motivo de muita dúvida, apenas atenuada pela nova regra fiscal.

Não há clareza sobre o que será da política externa nem o resultado dessas caneladas temerárias de Lula no dito Ocidente e de acenos para ditadores. Quem sabe a loucura tenha método e razões secretos. Por ora, vê-se apenas o risco de o Brasil perder a oportunidade de tirar vantagem do conflito EUA-China e de se tornar parceiro econômico confiável no mundo desglobalizado.

Lula 3 decerto governa um país destroçado e convocado para uma involução reacionária, violenta e antidemocrática. Foi bem ao isolar os golpistas terroristas. Mas está sem rumo algum no Congresso e não administra a própria cozinha, caso do GSI, por exemplo. Há uma CPI que pode ser um palanque para a extrema direita até agora desnorteada.

A horda estava sem assunto, com seu líder facinoroso perdido e ameaçado de cadeia. Agora, pode fazer um salseiro lunático de redes sociais com a ideia de que o levante terrorista foi armação da esquerda, por exemplo.

O governo pediu a aliados que não apoiassem a CPI do 8 de Janeiro. Então sobreveio o escândalo do general-ministro do GSI que passeava em um Planalto tomado por golpistas. De hora para outra, o governo aceitou a CPI sem ao menos avisar parlamentares amigos. Há como ganhar esse jogo, com risco maior de cadeia para bolsonaristas. Mas o governo tomou um contra-ataque.

O MST volta a fazer bobagem. Lula diz disparates, como falar de "gordos", de "desparafusados da cabeça", da escravidão que provocou miscigenação, dos capiaus paulistas que seriam como Bolsonaro. Sempre foi assim. Mas não se dá conta de que vive em um mundo de hordas de redes sociais enraivecidas pelo confronto político em um país rachado de ódio, com direitas grandes e organizadas.

Precisa de alianças, de um pacto sociopolítico para ao menos isolar reacionários e financiar seu plano econômico, que precisará de muito imposto, sempre motivo de conflito agudo. Mas não tem se importado de fazer adversários e inimigos desde que foi eleito. Assim, vai ser difícil.

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