Imagens só de 3 de 16 mortes investigadas em ação da PM mostram confrontos, diz Promotoria

Ministério Público recebeu gravações de seis casos da Operação Escudo, mas duas não mostram agressões e uma foi considerada irrelevante

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São Paulo

Imagens de câmeras corporais de policiais militares enviadas ao Ministério Público de São Paulo mostram registros de confrontos com criminosos em apenas 3 dos 16 casos iniciais em que houve mortes na Operação Escudo, na Baixada Santista.

Promotores confirmaram ter recebido imagens de seis ocorrências, mas em duas delas as gravações não captaram o momento dos disparos e, em outra, "não trazem nenhuma informação relevante para a investigação", disse a instituição.

Nesta terça-feira (15), outras duas pessoas foram mortas pela PM em Guarujá, fazendo com que o total de vítimas chegasse a 18. A Promotoria investiga, por enquanto, apenas as 16 mortes anteriores. Nos outros dez confrontos, a Polícia Militar afirmou que não havia imagens, segundo a Promotoria —anteriormente a PM declarou que 9 de 16 confrontos tinham imagens disponíveis.

Parece com buraco provocado por tiro
Marca de tiro na parede o ajudante de pedreiro Layrton Oliveira, 22, foi morto por policiais em Santos, em ação da Operação Escudo; família diz que ele não tinha ligação com o crime - Danilo Verpa - 2.ago.2023/Folhapress

A Escudo é a operação da Polícia Militar paulista mais letal desde o massacre do Carandiru. Ela foi deflagrada no fim de julho, após o assassinato do soldado Patrick Bastos Reis, da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar). Moradores denunciaram o assassinato de pessoas que estariam desarmadas, invasões de casas por policiais mascarados, ameaças a moradores e ao menos um caso de tortura. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) nega e afirma que não há evidências.

Ao todo, os promotores afirmam ter visto 50 horas de imagens e analisado 12 laudos do Instituto Médico-Legal. Agora, eles pretendem comparar as imagens com laudos, versão dos policiais e depoimentos de testemunhas. A análise das câmeras ainda não foi concluída, informou o Ministério Público.

O balanço foi publicado pela TV Globo e confirmado à Folha. Questionada, a Promotoria não respondeu quais das 16 são as ocorrências que têm imagens com confrontos.

Na semana passada, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) disse que gravações de sete casos haviam sido enviadas.

Em nota, a secretaria afirmou que "foram enviados ao Ministério Público as imagens das câmeras corporais pertencentes aos batalhões que participaram de sete casos de confronto com morte durante a operação Escudo, no litoral sul. De uma das câmeras, foi encaminhada a 'trilha de auditoria' que registra a utilização do equipamento desde o início do turno até o esgotamento da bateria. Das demais, foram encaminhados os arquivos com as imagens das ocorrências".

Para Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), não é aceitável que as gravações não tenham qualidade satisfatória. Ela afirmou que as câmeras corporais operam ininterruptamente e que existem dois modos de gravação —o chamado vídeo de rotina, que capta imagens em baixa resolução e sem áudio, e o modo acionado pelo PM no momento em que atende a ocorrência, com boa qualidade de imagem e som.

"Então teria que ter imagens de tudo, poderia até não ter o áudio de tudo, caso o policial não tenha acionado [a câmera], mas a gravação das imagens nós tínhamos que ter", afirma. "Essa operação na Baixada é a prova de que a gestão do Tarcísio está matando o programa Olho Vivo."

Na avaliação de José Vicente da Silva, coronel da reserva da PM de São Paulo e ex-secretário nacional de Segurança Pública, todas as ações do tipo exigem o uso de câmeras corporais.

"O que a gente sabe é que houve um emprego massivo de efetivo naquela região e nem todos tinham câmera. Mas a PM tem que saber que toda operação desse tipo, em que possam surgir dúvidas quanto à lisura e à legalidade de seus procedimentos, precisa ter câmeras", disse. "A ideia é aperfeiçoar, melhorar cada vez mais as condições de transparência das ações policiais. O uso da força precisa ser rigorosamente controlado e o governo faz parte desse controle."

Em nota, a Polícia Militar disse que conta com 10.125 câmeras operacionais portáteis (COP) que abrangem 52% dos batalhões do estado e que a seleção das equipes para apoiar as ações na Baixada Santista foi pautada por critérios técnicos e operacionais para manter ações de policiamento preventivo na região e em todo o estado.

As mortes na Operação Escudo, afirmou trecho da nota, são apuradas por meio de inquérito pelas polícias Civil e Militar. "Todo conjunto probatório apurado no curso das investigações, incluindo as imagens das câmeras corporais, está sendo compartilhado com o Ministério Público e o Poder Judiciário."

Na semana passada, o governador Tarcísio disse que a falta de imagens dos casos em que houve mortes em Santos e Guarujá, no litoral paulista, ocorre porque não há câmeras suficientes para serem colocadas nas fardas de todos os policiais militares.

"A gente não tem câmeras para todas as unidades", disse Tarcísio, em uma entrevista coletiva. "Temos 10 mil câmeras para 90 mil policiais. Existem batalhões que têm câmera, e que não têm câmera." Ele citou o caso do Batalhão de Choque de Presidente Prudente, que reforçou a Operação Escudo, que não conta com câmeras. O governador não disse se pretende comprar mais câmeras para as fardas da PM.

Samira Bueno afirma que o governo precisa agir com inteligência.

"São 90 mil policiais, mas isso não significa que a gente precisa de 90 mil câmeras. Policial administrativo, por exemplo, não usa câmera. Tem que ser estratégico. Quais são os batalhões prioritários? Tudo que é Baep [Batalhão de Ações Especiais da Polícia] deveria ter, porque são esses que estão expostos a mais riscos", afirmou.

Câmeras diminuíram mortes pela PM

Desde 2019, parte dos policiais militares usa câmeras acopladas nos uniformes.

Durante a campanha eleitoral ao governo estadual, Tarcísio chegou a dizer que iria retirar a obrigatoriedade de policiais terem uma câmera nas fardas, mas depois recuou.

Logo após a posse, o secretário da Segurança Pública, o PM da reserva Guilherme Derrite, afirmou em entrevista que o governo iria rever as câmeras corporais da Policia Militar. No dia seguinte, porém, disse que sua fala havia sido distorcida e que o "Programa Olho Vivo" seria mantido.

A implantação da tecnologia teve resultados positivos na redução das mortes de suspeitos e de policiais e se tornou um novo meio de coleta de provas.

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