Doações no Brasil superam R$ 3,24 bi e desafiam setor pós-coronavírus

Filantropia e responsabilidade social mobilizaram volumes inéditos de recursos, mobilização que deve continuar, dizem especialistas

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São Paulo

Após quebras sucessivas de recordes no volume de doações no país que, nesta quarta-feira (22), somam R$ 3,24 bilhões, a pandemia coloca um grande desafio para o setor filantrópico.

Passada a emergência sanitária, econômica e social provocada pelo novo coronavírus, sociedade, ONGs, empresas e governo vão continuar se mobilizando de forma articulada para a superação da desigualdade?

A pergunta é feita por expoentes do setor, como filantropos e dirigentes de organizações e entidades que fomentam a cultura de doação no país.

Entre pessoas jurídicas, o destaque continua sendo a quantia recorde de R$ 1,2 bilhão doada pelo Itaú Unibanco para diversas ações durante a pandemia.

O montante colocou o setor financeiro na dianteira no Monitor das Doações Covid-19 (https://www.monitordasdoacoes.org.br), com um total de R$ 1,6 bi doados.

São computados apenas os valores anunciados publicamente pelos doadores e checados pela ABCR (Associação Brasileira de Captadores de Recursos).

Nos últimos dias, cresceu o volume direcionado por empresas de mineração que já doaram R$ 534 milhões em resposta à Covid-19. O setor de alimentação e bebidas aparece em terceiro com R$ 223 milhões.

Em quarto lugar estão as campanhas, via lives e plataformas de crowdfunding. Elas respondem por R$ 172 milhões, 5% do total de doações, pulverizados em 188 iniciativas mapeadas até o momento.

Famílias e doações individuais somam outros R$ 53 milhões, valor subdimensionado em razão de muitos filantropos não divulgarem suas iniciativas pessoais.

Entre os doadores pessoas físicas, o maior aporte foi feito por Elie Horn, dono da Cyrela, que doou R$ 23 milhões no último ano para projetos sociais e ações de combate à Covid-19, em diversas frentes capitaneadas pelo Movimento Bem Maior.

Elie Horn usa terno azul marinho e discursa segurando microfone na mão
Elie Horn, fundador da construtora Cyrela e idealizador do instituto Liberta, durante Fórum "Exploração Sexual Infantil", em São Paulo - Reinaldo Canato/Folhapress

Horn é um dos fundadores do movimento, ao lado de outros empresários como Rubens Menin, da MRV Engenharia e CNN Brasil, que desembolsou R$ 16 milhões em ações durante a pandemia, conforme monitoramento da ABCR.

“Temos que trazer isso para o nosso dia a dia”, diz Horn, primeiro e único brasileiro a aderir ao The Giving Pledge, liderado por bilionários como Bill Gates, ao se comprometer a doar 60% de sua fortuna em vida.

O Movimento Bem Maior criou há um mês o Fundo Emergencial da Saúde - Coronavírus, em parceria com o IDIS e BSocia, que já captou R$ 5 milhões, e atraiu 4.000 doadores pessoas físicas.

O valor arrecadado é revertido em materiais como respiradores, testes rápidos do coronavírus, máscaras, luvas, equipamentos hospitalares para UTI. Os beneficiados atuais são Fiocruz, Santa Casa de São Paulo, Comunitas, Hospital Santa Marcelina e Hospital São Paulo.

“Este é um movimento que engaja além de empresas e grandes filantropos, a sociedade como um todo. É uma união inédita em torno da saúde pública”, explica a presidente do IDIS, Paula Fabiani.

Os bancos ABC Brasil e Pactual, por exemplo, estão promovendo ações de matchfunding com seus colaboradores, quando cada valor doado é complementado com uma doação das instituições para o fundo.

“Vamos ganhar ainda mais escala com uma série de acordos em negociação, que devem ser fechados nos próximos dias", afirma Carola Matarazzo, presidente do Movimento Bem Maior.

A Ação Cidadania é outra iniciativa apoiada pelo movimento, que já arrecadou mais de R$ 3,5 milhões, utilizados na compra de 575 toneladas de alimentos e material de higiene para famílias de alta vulnerabilidade social.

“Temos sido uma ponte entre doadores e receptores, mobilizando o setor de filantropia, além de atuar no direcionamento e captação dos recursos de combate à pandemia e fazer a conexão com a ponta”, explica Carola.

Para ela, um esforço que precisa continuar para além desse momento histórico da filantropia brasileira.

“Estamos tendo a a oportunidade de ressignificar o valor das relações e do dinheiro, e refletir sobre o que fizemos até aqui no coletivo e individual, para entender que temos um inimigo comum, que é a desigualdade social.

A aposta é que com a consciência ampliada por uma doença que ameaça a vida de todos, não dá para voltar ao patamar de antes.

“A era da solidariedade veio para ficar, já vivemos isso em Brumadinho e Mariana”, afirma Paula, do Idis. A presidente do instituto que atua no fomento ao investimento social privado no país, teme
que parte dos novos doadores desapareça passada a emergência sanitária.

“Minha grande dúvida é se vai haver retração de doação futura. Muitas empresas estão fazendo direcionamento, cancelando projetos para focar em coronavírus”, relata. “O que vai acontecer, por exemplo, com as ONGs que não estão envolvidas com a pandemia, que atuam em outras causas importantes como direitos humanos e meio ambiente?”

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