Rotavírus causa um terço das internações por diarreia em menores de 5 anos de países pobres

Pesquisadores reforçam que vacinação reduz mais de 50% das hospitalizações que podem levar à morte infantil

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São Paulo

A infecção causada pelo rotavírus humano é responsável por 1 a cada 3 (33,5%) hospitalizações por diarreia infantil em crianças abaixo de cinco anos em países de média e baixa renda.

Quando separadas por faixa etária, o rotavírus continuou sendo o principal agente causador de internação por diarreia em todas as faixas etárias, de 0 a 59 meses, embora a infecção por Shigella (bactéria) fosse proporcionalmente maior em crianças mais velhas (chegando a 17,9% em crianças de 2 a 5 anos contra 14,3% quando consideradas todas as faixas etárias).

Criança é atendida em um hospital na Somália após sofrer de desnutrição causada por uma infecção de cólera
Criança é atendida em um hospital na Somália após sofrer de desnutrição causada por uma infecção de cólera - 16.ago.11/AFP

Em casos mais severos, as diarreias decorrentes da infecção podem levar à morte. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), cerca de meio milhão de crianças em todo o mundo morrem anualmente por complicações de diarreia aguda.

Os dados são de um estudo global publicado na revista científica BMJ Global Health. A pesquisa, que foi financiada pela Fundação Bill e Melinda Gates, analisou casos de hospitalização infantil em 33 centros de vigilância para doenças infecciosas (hospitais sentinela, com registro de ao menos cem hospitalizações por diarreia em crianças abaixo de cinco anos por ano) em 28 países de baixa e média renda em 2017 e 2018.

Dentre os países estão Bolívia, Equador, Paraguai e Peru na América do Sul. O Brasil não foi incluído, mas conta com centros de referência para sentinela dos chamados vírus gastroentéricos, incluindo a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), no Rio de Janeiro.

Para realizar o estudo, os pesquisadores analisaram amostras de fezes de quase 26 mil pacientes hospitalizados por diarreia abaixo de cinco anos e fizeram uma testagem aleatória em um quinto delas. As análises consistiram em um exame do tipo PCR, onde se busca o material genético do patógeno causador da infecção —que pode ser tanto viral, bacteriana ou outro.

Em 33,5% das amostras havia rotavírus, enquanto os demais agentes encontrados foram adenovírus (19,2%), norovírus (18%), a bactéria Shigella (14,3%) e sapovírus (10%). Outros 12 tipos diferentes de microrganismos, entre eles a bactéria Escherichia coli e o parasita Cryptosporidium, foram encontrados em até 1% dos materiais.

A Shigella também foi a principal responsável por hospitalização infantil nos países da América Central (19,2%), enquanto na América do Sul (o estudo não incluiu o Brasil) foram os vírus do tipo norovírus (22,2%).

Segundo os pesquisadores, o fato de nos países da América Latina o rotavírus não ser o principal agente causador de diarreia se deve à introdução de um programa nacional de imunização desde 2010. Ainda de acordo com o estudo, a introdução da vacinação reduziu em mais de 50% o número de crianças hospitalizadas nesses locais (taxa de hospitalização de 42,1%, onde não há imunização, para 20,8%).

Para José Paulo Gagliardi Leite, pesquisador do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e um dos autores do estudo, a introdução da vacinação muda o comportamento desse e de outros patógenos, que passam a ser mais prevalentes.

"A criança só vai ter maturidade imunológica de 3 a 4 anos, então o que vemos depois da imunização é uma hospitalização mais tardia, e isso é importante porque depois das infecções respiratórias agudas as diarreias são a principal causa de morbimortalidade [agravamento da saúde com risco de morte] em crianças abaixo de 5 anos", diz.

De acordo com outros levantamentos, a introdução da vacina contra o rotavírus humano teve eficácia de reduzir em 40% as infecções pelo vírus em crianças, o que coincide com o resultado apontado no estudo.

A cobertura vacinal do rotavírus no Brasil, porém, está em queda desde 2018, segundo dados do Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI, retirados do DataSUS). Após queda de 2016 para 2017, a aplicação chegou a crescer 2018, atingindo 91,33%. Depois, a taxa caiu para 85,40%, em 2019, 77,29% em 2020 e 70,53%, em 2021

Os dados de 2022, ainda parciais, mostram que menos da metade das crianças até o momento recebeu a vacina nos estados, com 45,33%.

Segundo os pesquisadores, mesmo com a presença da vacinação, algumas regiões do globo continuaram com uma alta circulação do rotavírus, o que pode ser explicado pela cobertura vacinal insuficiente, o alto custo que infecções por rotavírus continuam a apresentar na população e a baixa circulação de outros patógenos nesses países.

Os cientistas concluem com uma mensagem da importância de aumentar a cobertura vacinal nos países onde a prevalência de rotavírus ainda é a principal causa de hospitalização por diarreia em crianças e de buscar também vacinas mais eficazes —atualmente, a vacina disponível possui eficácia de 50% a 60%.

"Os dados confirmam a importância de continuar e estender a cobertura e introdução da vacinação contra o rotavírus, como preconizado pela OMS, que espera que todas as crianças com menos de 5 anos sejam imunizadas com pelo menos uma dose, mas pouco menos da metade das crianças nascidas em 2018 globalmente foram imunizadas", dizem os cientistas.

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