Lula,
Deus e o Diabo na terra do sol
Nada como
uma eleição depois da outra. Até pouco
tempo atrás, Lula e o PT eram apontados pela Igreja
Universal do Reino de Deus como "forças do mal"
e "representações do Diabo" - ataques
que contribuíram para a vitória de Fernando
Collor de Mello, encarado, então, como espécie
de providência divina.
As "forças
do mal" transformaram-se literalmente em salvação.
"O PT é uma esperança", disse na semana
passada o deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ), coordenador político
da Universal - o que significa subordinação
ao bispo Edir Macedo.
De Paris,
Lula negou que tivesse marcado um jantar com Edir Macedo,
destinado a selar um entendimento. O fato, porém, é
que o PT e o PL, este dominado pelos evangélicos da
Universal, caminham para o mesmo altar político. Nas
conversas de bastidores, articula-se entregar a vaga de vice
na chapa de Lula ao senador José Alencar, que acaba
de filiar-se ao PL - numa cerimônia prestigiada pelos
petistas.
É
uma jogada e tanto. Apoiado num discurso mais moderado, a
tal "versão light", Lula ultrapassou a linha
dos 30% de intenção de voto, mas, acostumado
a derrotas, sabe que o segundo turno é uma nova eleição.
Os evangélicos não são a maioria dos
eleitores brasileiros, mas aparecem como a força política
mais organizada do país, o que é visível
no tamanho de suas bancadas parlamentares.
De acordo
com as pesquisas de institutos de opinião, os evangélicos
compõem 20% do eleitorado no Brasil, ou seja, respondem
por cerca de 22 milhões de votos. É uma cesta
apetitosa quando se leva em conta que uma disputa pode ser
decidida por poucos pontos no segundo turno.
Tão
importante quanto a quantidade é a qualidade. Diferentemente
do que ocorre com a Igreja Católica, vários
grupos evangélicos não se sentem incomodados
em fazer campanha para candidatos. Abrem-se todos os canais:
os cultos e as emissoras de rádio e de TV. Só
a Universal, proprietária da rede Record, estima ter
4 milhões de fiéis.
Uma pesquisa
do Instituto Vox Populi mostra que essa articulação
resulta em fidelidade política. Apenas 3% dos católicos
votariam "com certeza" num presidenciável
que se apresentasse como representante dos católicos;
a porcentagem sobe para 9% entre os evangélicos.
Essa relação
é de 6% dos católicos para 18% dos evangélicos
quando convidados a responder se "provavelmente"
votariam num candidato mais identificado com suas convicções
religiosas. A proporção é de 5% para
9% quando lhes é perguntado se levariam a questão
em consideração.
Traduzindo:
quase 30% dos eleitores evangélicos levariam em conta
o critério religioso no momento de votar. São,
portanto, 6,6 milhões de votos.
É
natural que qualquer político se sinta atraído
pelas forças evangélicas -é o que, entre
outros fatores, faz Lula olhar com interesse para um eventual
vice como José Alencar, que, além de ligado
ao PL, é empresário e de Minas Gerais, um dos
maiores colégios eleitorais do país.
A aproximação
com os evangélicos é um sinal - das urnas, não
dos céus - de que Lula foge dos erros do passado como
o Diabo da cruz, preferindo dar adeus às ilusões
do purismo político.
Deixou
sua imagem aos cuidados de Duda Mendonça, de inegável
talento, e desconsiderou as críticas de que o publicitário
tinha trabalhado para Maluf. Aliás, as tarefas são
semelhantes para Duda: ele suavizou, na época, a imagem
de Maluf e agora tenta (e vai bem, diga-se) suavizar a de
Lula. Sai a feição carrancuda, entram os sorrisos.
Lula é
reflexo do seu partido. À medida que o PT ganha mais
poder, dá adeus às ilusões. Como todos
sabemos - mas o eleitor quase sempre esquece -, é fácil
denunciar, o difícil é construir.
Por sua
importância política e pelo tamanho de seu orçamento,
a Prefeitura de São Paulo é uma espécie
de "minipresidência". Pode-se acusar Marta
Suplicy de muitas coisas, menos de falta de disposição
de acertar. Ninguém que tenha um mínimo de honestidade
será capaz de dizer que São Paulo piorou ou
que está do mesmo jeito. Mas não há percepção
de melhora - ainda mais se compararmos as realizações
com as promessas de campanha.
Depois
de vencer, Marta sentiu na pele o que já sabia: as
devastadoras limitações orçamentárias.
Até ensaiou, timidamente, não jogar as regras
do jogo, ameaçando suspender o pagamento das dívidas,
mas percebeu que o rompimento traria ainda mais danos à
cidade.
É
exatamente o que vai acontecer com qualquer presidente - seja
de direita, seja de centro, seja de esquerda. Há limites
determinados pelas dívidas externa e interna, e as
demandas sociais, especialmente em educação
e em saúde, são gigantescas. O crescimento econômico
tropeça e dificulta o aumento da arrecadação.
Se não
quiser ser pisoteado, quem chegar ao Palácio do Planalto
terá de fazer alianças. A história do
Brasil tem uma boa quantidade de casos de presidentes que,
por falta de apoio no Congresso Nacional, caíram.
Lula e
Fernando Henrique Cardoso ficam, de certa forma, mais próximos
- afinal, FHC, como tanto denunciou o PT, teve de negociar
e, muitas vezes, ceder ao Diabo para poder governar.
PS - Os
candidatos e pré-candidatos, da oposição
e da situação, ainda não ofereceram,
em suas propostas, saídas originais e consistentes
para amenizar a crise social brasileira. É bom lembrar
que o eleitor está, segundo as pesquisas, mais pragmático:
menos sensível aos jogos de marketing, quer saber de
soluções.
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