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Não
vou dizer que a imprensa esteja ''distorcendo'' as coisas. E talvez
a comparação que eu vou fazer não seja muito válida. Mas vamos lá.
Domingo passado, houve a Parada do Orgulho Gay na avenida Paulista.
Juntou gente pra burro; parou o trânsito etc. Um evento muito legal.
Claro que a imprensa deu grande destaque.
Há não muito tempo, contudo, houve uma concentração de evangélicos
na zona Norte da cidade. Era coisa de um milhão de pessoas, me disseram.
Claro que a imprensa também deu destaque. Mas o assunto repercutiu
muito menos que Parada do Orgulho Gay.
Muito bem, o leitor vai dizer, são coisas totalmente diferentes. Uma
reunião religiosa pode juntar muita gente, mas não produz tanta polêmica,
tantas fotos curiosas, tantas surpresas quanto uma manifestação GLS.
Concordo. Não é preciso haver um "lobby gay'' na imprensa nem
um preconceito dos jornalistas contra os evangélicos para que os dois
eventos tenham tratamento distinto nos meios de comunicação.
Acontece que, embora mais interessante do ponto jornalístico e comportamental,
a Parada do Orgulho Gay é pouca coisa diante do número de evangélicos;
um movimento alegre de classe média tende a ser menos ponderável do
que a vasta procissão dos moralistas.
Por que estou fazendo a comparação? Porque tento responder a uma outra
pergunta: como alguém pode (ainda) ser malufista? Com todas as irregularidades
de Pitta, com toda a empáfia com que Maluf diz ter "errado''
ao prometer nunca mais ser candidato se Pitta não fizesse um bom governo,
ainda assim Maluf tem 20% dos votos segundo as pesquisas de opinião.
Como pode alguém ser malufista? Faço algumas suposições. Não é que
o sujeito seja mal-informado. Até a propaganda eleitoral de Maluf,
não me lembro em qual campanha, reconhecia que ele "não era nenhum
santo''. O raciocínio provável, depois desta constatação, é dizer
o seguinte: "Ah, mas todos roubam. Não há nenhum político honesto.
Portanto, voto em Maluf.''
Desconfio, entretanto, que só esse argumento não basta para fazer
alguém votar em Maluf. Pode-se anular o voto, por exemplo. E, se todos
os políticos são iguais, por que não variar de vez em quando?
Pode ser delírio meu, mas imagino que há algo de vingativo, de raivoso,
no ato de votar em Maluf. Penso na empregada doméstica, por exemplo.
Sabe que sua patroa, esclarecida, de classe média, assinante da Folha,
não votará em Maluf. Talvez a empregada vote, então, no candidato
da direita até por espírito de revolta, ou espírito de porco...
Maluf fala de segurança sem parar. O povão, que sofre nas mãos dos
bandidos mas também nas da polícia, quer a Rota nas ruas. Quer ver
sangue _mesmo que seja o próprio.
O fato de Maluf ser tão desprezado pela mídia tenderia a torná-lo,
paradoxalmente, um representante dos "humilhados e ofendidos''.
Do mesmo modo, nós, da classe média alta e instruída, ignoramos a
vasta corrente subterrânea dos evangélicos da periferia enquanto,
animadamente, vemos o sucesso da Parada do Orgulho Gay na Paulista.
O apartheid social é tanto, que não vou além de suposições e chutes
sobre a psicologia malufista. Acho que Maluf perde as eleições municipais.
Mas não será a primeira vez que nos surpreendemos com o número de
malufistas que se escondem dentro do armário. Qualquer dia, inventam
a Parada do Orgulho Malufista.
PS- Em julho, estarei de férias.
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02/06/2000 - A raiva de Covas
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