Saiba como surgiram figuras típicas do Carnaval como Rei Momo, arlequim e os clóvis

Em 1934, jornal A Noite colocou num barco um de seus funcionários, e deu assim uma 'cara' ao grande senhor da folia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Você sabe como surgiram alguns dos personagens mais famosos do Carnaval? A Folhinha conversou com Felipe Ferreira, professor do programa de pós-graduação em história da arte da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), autor de diversos livros sobre Carnaval, para conhecer as origens do arlequim, da colombina, da baiana, do Rei Momo e dos clóvis.

ARLEQUIM

O arlequim nasceu como um personagem da commedia dell'arte, um tipo de teatro que acontecia na Itália no século 17. Nele, havia vários personagens que sempre se repetiam no palco —um deles era o arlequim. Também havia a colombina e o pierrô.

Arlequim, uma das figuras mais clássicas do Carnaval no mundo - Blickfang

"O arlequim é o esperto, o que resolve tudo, o que enrola todo mundo e dá um jeito. Ele mata a cobra e dá um nó, digamos assim", brinca Felipe Ferreira.

"A roupa dele originalmente é de losangos coloridos, representando a ideia da multiplicidade. Porque o arlequim é uma pessoa em quem não dá para confiar muito. Ele resolve tudo, mas passa a perna em todo mundo. É um brincalhão, digamos assim."

Os personagens da comedia dell’arte acabaram inspirando as fantasias dos bailes de Carnaval no século 19 na França, junto com fantasias de reis, príncipes e rainhas da antiguidade. E, como estes bailes foram muito famosos, eles acabaram espalhando seus elementos pelo mundo –é assim que os personagens da comedia dell’arte vão chegar ao Carnaval de muitos outros países, virando praticamente um símbolo dessa festa.

COLOMBINA

Junto do arlequim, a colombina viaja dos carnavais franceses para o mundo, para se tornar uma das principais representantes da folia. Isso acontece a partir de 1830, mais ou menos, segundo explica Felipe Ferreira.

Ilustração de uma colombina, feita em 1683 - Wikimedia Commons

"Enquanto o arlequim é espertalhão, a colombina é a mocinha. Ela é um pouco namoradeira e vai sofrer algumas vezes as travessuras do arlequim", conta o professor.

REI MOMO

"Desde a Idade Média [que aconteceu entre os anos 476 e 1453], surgiu a ideia de que o grande senhor do Carnaval seria um homem gordo, feliz, brincalhão e festeiro", diz Felipe Ferreira. Esse personagem aparecia em algumas encenações (tipos de peças de teatro), e nelas ele sempre estava discutindo com a dona Quaresma —no calendário que segue o cristianismo, Quaresma é o nome do período entre o Carnaval e a Páscoa.

O Rei Momo recebe a 'chave' da cidade do Rio de Janeiro no Carnaval de 2017 - REUTERS

Aos poucos, essa figura do senhor Carnaval foi se espalhando e se juntando a algumas festividades. No século 19, por exemplo, na cidade francesa de Nice, surge um personagem com uma roupa bem parecida com a do atual Rei Momo, com uma coroa e roupa de rei. Não demorou muito para que ele também chegasse ao Brasil.

O nome, Rei Momo, pode ter sido inspirado em um deus grego, segundo conta Felipe Ferreira. "Havia dois deuses da festa, o rei Momo e o rei Komo. O Momo seria ligado a festividades civilizadas, e o Komo, às festividades descontroladas", conta.

Em 1934, um jornal do Rio de Janeiro chamado Jornal A Noite inventou de personificar (ou seja, "dar" uma pessoa ao nome) o Rei Momo, para que ele deixasse de morar apenas na imaginação das pessoas. "Eles resolvem fazer uma brincadeira: vestiram um jornalista com uma roupa que havia do Theatro Municipal, colocaram ele num navio que vinha pela baía de Guanabara, e disseram que naquele dia teria a chegada do rei Momo ao Brasil", lembra o professor.

O Rei Momo de brincadeira foi então recebido com grande pompa, e ali começa esse costume de se fazer a recepção a este personagem carnavalesco. "A ideia de um Rei Momo magro e negro é bastante recente, desde que começou a preocupação com a diversidade. Atualmente, sabemos que não é preciso ser gordo para ser bonachão. Mas uma característica fundamental é o Rei Momo saber sambar."

BAIANA

As baianas típicas das escolas de samba surgem a partir de uma personagem que ocupava as ruas do Rio de Janeiro no século 19. "É aquela baiana que vendia coisas pelas ruas, a chamada ‘baiana quituteira’. Essas senhoras negras que ganham sua vida vendendo comida passaram a se chamar ‘baianas’ porque muitas delas vinham da Bahia", explica Felipe Ferreira.

Sao Paulo, SP, BRASIL, 25-02-2014 - A baiana Lilamirtes dos Reis Miranda - Eduardo Knapp/Folhapress

As baianas, por mais que tenham nascido no nordeste do país, se tornaram famosas no sudeste, na capital carioca. "Na Bahia essas mesmas mulheres não se chamavam baianas, porque elas eram de lá mesmo", acrescenta o professor.

Na virada do século 19 para o século 20, elas começam a ser reconhecidas como símbolos da negritude e da cultura afro-brasileira. "Os intelectuais e a população em geral começam a respeitar muito as baianas. E, quando as escolas de samba surgem na década de 1930, essas baianas passam a ser reverenciadas e são incluídas nelas, porque estas escolas querem ser reconhecidas como organizações que respeitam as origens afro-brasileiras", afirma.

Desde 1934, a ala das baianas nas escolas de samba é obrigatória. Elas usam roupas típicas, com saias bem amplas, e têm uma série de movimentos que precisam realizar durante o desfile.

CLÓVIS

O clóvis é um tipo de palhaço que, durante o Carnaval, circula pelas ruas com suas roupas coloridas e uma bola pesada pendurada em um cordão, e que ele vai batendo no chão conforme passa. Sua aparência ligeiramente assustadora costuma despertar um pouco de medo nas crianças de várias gerações.

RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL, 18-02-2012, 19h00: Sandro Alessandro Galvao da Rocha com fantasia de bate-bola do Grupo Humildade, em Marechal Hermes, na zona norte do Rio de Janeiro - Daniel Marenco/Folhapress

O professor Felipe Ferreira explica que o clóvis surge por volta do começo do século 20. Seu nome vem do inglês "clown", que foi se modificando no português ao longo do tempo. Eles também são conhecidos como bate-bolas. "Em vez de ter a cara pintada do palhaço, o clóvis é mascarado. Eles brincam correndo e perguntando para as pessoas se elas sabem quem eles são", diz Felipe.

A história da bola que o clóvis bate por aí tem origem na região oeste do Rio de Janeiro, na área de Santa Cruz. Lá, havia um matadouro muito famoso onde todas as partes das vacas e bois eram aproveitadas —exceto a sua bexiga. As crianças daquela região pegavam as bexigas para brincar e as enchiam de água. Por isso, inclusive, o nome pelo qual chamamos os balões até hoje.

É lá que surgem os primeiros clóvis, a partir da brincadeira das crianças que amarravam a bexiga cheia numa corda, botavam uma máscara de arame cheia de furinhos, e saíam por aí brincando de assustar as pessoas. "Aos poucos, a brincadeira deixa de ser individual e grupos vão se formando em toda a zona oeste. E esses grupos vão disputando para ver quem é o mais importante e o mais assustador", afirma o professor.

Dava até briga entre os clóvis. Mas, aos poucos, todo mundo foi vendo que, em vez de brigar, era mais legal que eles fizessem uma disputa justa e bonita, se esforçando para ter a fantasia mais bem bordada, ter mais integrantes na turma, fazer coisas mais originais etc.

A tradição vive até hoje. "Alguns bate-bolas nem tem mais nada na mão, enquanto alguns continuam usando a bola, que agora é de plástico. Outros usam sombrinhas, outros usam leques, outros usam bonecos de pelúcia. É muito variado, não existe um regulamento", diz Felipe.

TODO MUNDO LÊ JUNTO

Texto com este selo é indicado para ser lido por responsáveis e educadores com a criança

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.