'Escrevo como quem constrói uma casa', disse João Cabral de Melo Neto à Folha em 1997; leia mais

Resenhas, entrevistas e colunas foram dedicadas ao poeta que faria cem anos nesta quinta ao longo dos anos 1990

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Retrato do escritor João Cabral de Melo Neto feito pelo fotógrafo Bob Wolfenson, em 1995. O retrato fez parte da exposição "Revelations" em 1997 Bob Wolfenson

São Paulo

Se vivo, o poeta João Cabral de Melo Neto celebraria, nesta quinta (9), cem anos. O escritor pernambucano, porém, morreu em outubro de 1999, no Rio de Janeiro.

Para marcar seu centenário, o mercado editorial lança, neste ano, uma fotobiografia, um livro de entrevistas e dois exemplares reunindo a obra completa na poesia e os textos em prosa. Uma coletânea bilíngue de poemas português-espanhol será lançada em novembro, na Feira Internacional do Livro de Quito.

Em dezembro de 1997, o extinto caderno Mais! visitou o escritório de 22 escritores brasileiros, entre eles João Cabral que, já tendo perdido a visão por conta de um problema na retina, disse não escrever mais. "Eu, para escrever, preciso ver. Não adianta eu ditar para alguém, porque eu preciso ver a minha letra construindo o verso", disse. Em maio de 1994, ele concedeu uma entrevista à Folha.

Leia abaixo entrevistas, críticas e colunas publicadas no jornal sobre o poeta. 

Em setembro de 1951, a Folha da Manhã publicou um texto de Sérgio Buarque de Holanda sobre a obra de João Cabral, no qual escreve: "o formalismo alcança uma expressão de rigor ascético sem precedentes talvez em toda a literatura de língua portuguesa. Desse arquiteto não é excessivo dizer que nos deu o verdadeiro equivalente poético das modernas 'máquinas de morar'. Tanto quanto os produtos de uma arte funcional, sua obra não se deixa facilmente medir segundo padrões unicamente artísticos".

http://almanaque.folha.uol.com.br/sergiobuarque_labareda.htm

Em janeiro de 1994, uma reportagem descrevia a divisão na qual se encontraria a ABL após o fim de seu recesso, em março, na escolha de um nome para indicar ao Nobel. "Ao voltarem das férias, em 17 de março, os imortais da ABL (Academia Brasileira de Letras) promoverão um chá das cinco para escolher um nome a ser indicado ao Prêmio Nobel de Literatura. Há duas correntes na ABL. Uma apoia o poeta João Cabral de Melo Neto e outra, o romancista Jorge Amado."

Já em maio de 1994, José Geraldo Couto entrevistou o poeta. A conversa foi assim apresentada ao leitor: "'Entre a dor de cabeça e a angústia, eu preferia a dor de cabeça.' A frase –que parece uma versão mais concreta da famosa 'entre a dor e o nada eu fico com a dor', de Faulkner– resume o humor agreste de João Cabral de Melo Neto. Depois de décadas tomando seis aspirinas por dia, ele viu seu mal físico desaparecer inexplicavelmente ao final de uma operação de úlcera. Em seu lugar, instalou-se a angústia".

O mesmo caderno Mais! publicou textos de Sebastião Uchoa Leite e de Boris Schnaiderman comentando a entrevista do poeta e sua obra. 

Em junho de 1994, João Cabral lançou, num evento em São Paulo, sua "Obra Completa". A reportagem sobre o evento descreve a presença da "crème de la crème" da cultura e destaca uma frase do poeta em que ele se diz "o menino mimado de São Paulo".

Em 1996, o colunista Marcelo Coelho escreveu sobre o lançamento do "Cadernos de Literatura Brasileira" do Instituto Moreira Salles, cujo primeiro número foi dedicado a João Cabral. 

Em junho de 1997, Heitor Ferraz escreveu sobre carta de João Cabral de Melo Neto enviada a Clarice Lispector nos anos 1940 na qual falava sobre o projeto de uma revista literária.

Já em dezembro de 1997, o caderno Mais! visitou 22 escritores brasileiros e fotografou seus escritórios. "Os gabinetes ora são pequenos, ora espaçosos, às vezes soturnos, outras vezes arejados. Podem ser bibliotecas muito organizadas, como a de Carlos Heitor Cony, ou um amontoado de livros espalhados por todo canto, como no gabinete de João Ubaldo Ribeiro. À mesa de trabalho, em busca da frase exata, escreve-se à mão como Nélida Piñon, com o lápis, como Campos de Carvalho, na velha máquina de escrever ou no computador. Esse último, aliás, já está perfeitamente acomodado na maioria das mesas dos escritores visitados, como na de José J. Veiga, que, aos 82 anos, ressalta a facilidade com que o aparelho lhe permite editar os textos. Dos 22 autores, apenas nove não cederam ao assédio da informática. Estão nesse grupo Ariano Suassuna, João Cabral de Melo Neto, Jorge Amado, Campos de Carvalho, Manoel de Barros, Rachel de Queiroz, Nélida Piñon, Hilda Hilst e Lygia Fagundes Telles, que ainda recorta e cola à mão seus originais."  

Na ocasião, João Cabral disse não escrever mais. "Eu, para escrever, preciso ver. Não adianta eu ditar para alguém, porque eu preciso ver a minha letra construindo o verso. Eu escrevo como quem constrói uma casa." 

Após sua morte, em outubro de 1999, Eder Chiodetto, que fez as fotos em 1997, retomou os trechos mais importantes da entrevista.

O poeta João Cabral de Melo Neto na sala de seu apartamento, no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro, em 3 de dezembro de 1997 - Eder Chiodetto/Folhapress

Bento Prado Jr., em janeiro de 1999, escreveu texto em que analisava a metafísica da luz solar em João Cabral de Melo Neto. 

O poeta morreu em outubro de 1999. Segundo descreve a cobertura de seu enterro, a religiosidade do escritor em seus últimos anos de vida foi o assunto principal das conversas e dos discursos de despedida.

Uma semana antes de morrer, o poeta aceitou dar uma entrevista por telefone à Folha sobre uma de suas grandes paixões: o futebol.

Segundo reportagem publicada dias depois, "os últimos dias de João Cabral de Melo Neto em seu apartamento no Rio de Janeiro foram, para a mulher dele, a poetisa Marly de Oliveira, de esperança.
Ela planejava levá-lo para a Suécia, onde, ouvira dizer, uma nova técnica cirúrgica poderia recuperar a visão do marido, perdida havia sete anos em consequência de uma degenerescência da retina".

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