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Cruzamentos Literários promove encontro entre escritores lusófonos

Em meio a debate sobre taxação de livros, podcast é escapismo para aspectos mais felizes da literatura em língua portuguesa

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Cruzamentos Literários

Em tempos em que o Brasil pondera aumentar o imposto sobre livros com a justificativa de que ler é coisa de rico, o podcast Cruzamentos Literários é um providencial escapismo para aspectos mais felizes da literatura em língua portuguesa.

O idioma comum é o ponto de partida para a produção, que explora a realidade –cultural, econômica, política e social– dos países lusófonos a partir de entrevistas com um time de autores de primeiríssima linha.

A temporada, publicada quinzenalmente ao longo do primeiro semestre de 2021, traz conversas aprofundadas com 12 escritores de cinco países –Angola, Brasil, Cabo Verde, Moçambique e Portugal.

A cada episódio, a entrevista é conduzida por um curador. Para ajudar o ouvinte a embarcar no universo literário do entrevistado, o diálogo é intercalado com leituras de trechos das obras dos convidados.

Além da qualidade do bate-papo, com perguntas afiadas e pertinentes, os episódios –que têm entre 45 minutos e uma hora de duração– permitem uma viagem pelos diferentes sotaques e expressões do português falado em cada canto do mundo.

Cristóvão Tezza, escritor e crítico literário catarinense radicado em Curitiba
Cristóvão Tezza, escritor e crítico literário catarinense radicado em Curitiba - Theo Marques/Folhapress

O capítulo de estreia tem como convidada Paulina Chiziane, de 65 anos, primeira mulher a publicar um romance em Moçambique. A entrevista, conduzida pela jornalista portuguesa Isabel Lucas, é recheada de considerações sobre a realidade e a solidariedade feminina no continente africano, algo ainda muito pouco discutido no Brasil.

A conversa é pontuada com trechos de “Niketche”, interpretados pela escritora brasileira Veronica Stigger. Publicado em 2002, este segundo livro da autora explora o universo da poligamia –uma prática ainda aceita em várias regiões de Moçambique– e fala abertamente de sexualidade e empoderamento das mulheres.

Criticada por certos acadêmicos moçambicanos por "espalhar o feminismo" com a obra –em que o principal personagem masculino tem um destino um tanto quanto vexatório– Chiziane diz se divertir com a mudança de percepção em relação ao livro nos quase 20 anos desde sua publicação.

O podcast também ajuda a matar a curiosidade dos ouvintes sobre o processo de criação literária dos autores. Convidado do quarto episódio, o brasileiro Cristóvão Tezza diz gostar de acordar cedo para trabalhar, concentrando a produção nas primeiras horas da manhã.

O trabalho de construção por trás dos livros é um tema recorrente nas conversas. Entrevistada pelo autor angolano Ondjaki, a brasileira Ana Maria Gonçalves conta que sua aclamada obra “Um Defeito de Cor”, epopeia de 952 páginas, foi completamente reescrita 19 vezes. Nas seis primeiras, até a estrutura narrativa era diferente, com a história contada na terceira pessoa.

No quarto episódio, o podcast entrevista um dos principais nomes da literatura africana, o angolano Pepetela, de 79 anos. Numa conversa conduzida pela professora de literatura Rita Chaves, da Universidade de São Paulo, o autor reflete sobre sua extensa produção –são 21 livros publicados– e também sobre o impacto que a participação na guerra de independência de seu país teve sobre sua obra e seus personagens.

Os autores também são convidados a refletir sobre o atual momento da literatura lusófona. Um spoiler –apesar da internet e das facilidades de movimentação, o idioma em comum não é considerado suficiente para garantir o intercâmbio entre as obras dos países lusófonos.

Essa situação, aliás, pode ser um ponto de frustração para os ouvintes que se interessarem pelas obras portuguesas e africanas discutidas nos episódios, já que muitas não foram editadas no Brasil.

Embora a pandemia ainda nos obrigue a manter o distanciamento físico, o podcast promove uma bem-vinda aproximação do universo literário entre os países de língua portuguesa.

Cruzamentos Literários é uma parceria entre o Instituto Camões, a Fundação Calouste Gulbenkian e a Associação Oceanos e faz parte da programação cultural da presidência portuguesa da União Europeia.

A lista completa de escritores entrevistados é a seguinte: Paulina Chiziane (Moçambique), Mário de Carvalho (Portugal), Ana Maria Gonçalves (Brasil), Pepetela (Angola), Cristovão Tezza (Brasil), José Luiz Tavares (Cabo Verde), José Luís Peixoto (Portugal), Milton Hatoum (Brasil), Noemi Jaffe (Brasil), José Eduardo Agualusa (Angola), Dulce Maria Cardoso (Portugal) e Mbate Pedro (Moçambique).

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