Descrição de chapéu Eleições 2022

De Anitta a Gusttavo Lima, por que influência de artistas nestas eleições não é decisiva

Apoio de Pabllo Vittar a Lula e manifestação de sertanejos a favor de Bolsonaro não convenceram eleitor no primeiro turno

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Obra do artista Gustavo Torrezan Gustavo Torrezan/Divulgação

São Paulo e Brasília

Na semana anterior à eleição, a coreografia dos artistas foi rígida. Nas redes sociais, primeiro, indicador e polegar formavam uma arminha. Depois, os dedos faziam o "L", de Lula. O candidato do PT chegou à frente, mas Bolsonaro demonstrou força. Já os artistas parecem ter um um poder de influência menor do que muitos imaginavam.

Mesmo com apoio de nomes conhecidos, de Pabllo Vittar e Anitta a Xuxa e Bruna Marquezine, a campanha para eleger Lula no primeiro turno não saiu como esperado. Os 43,2% dos votos para Bolsonaro e a derrota de Alessandro Molon, candidato do PSB ao Senado pelo Rio de Janeiro, apoiado por Anitta e Caetano Veloso, põem em dúvida a capacidade dos artistas de mobilizar votos em meio ao pragmatismo da política institucional.

escultura de dedo podre apertando tecla verde de urna eletrônica
Dedo podre aperta tecla verde de urna eletrônica em parte da instalação 'Com o Coração Saindo pela Boca', de Jonathas de Andrade, no pavilhão brasileiro da Bienal de Veneza 2022 - Ding Musa/Fundação Bienal de São Paulo

Na visão de Fernanda Vicentini, professora de redes sociais da Escola Superior de Propaganda e Marketing, a ESPM, o apoio da principal artista pop do país não garante vitória a um candidato. "Ninguém converte ninguém", diz ela. "Isso seria reduzir o poder do eleitor, porque a decisão se dá por um conjunto de informações que ele tem durante a campanha."

Segundo o analista de redes Pedro Barciela, o movimento de virar votos não foi espontâneo. Boa parte dos artistas declarou apoio a Lula porque sentiu a demanda —e a autorização— de seus próprios fãs.
Ele acompanhou a movimentação das redes no momento da vitória de Lula por uma margem menor do que apontavam as pesquisas.

Segundo ele, a postagem do influenciador Felipe Neto representou o sentimento de perplexidade dos usuários antibolsonaristas. "Foi preciso reunir todas as forças de comunicação no Lula para conseguirmos superar a força do reacionarismo na luta pela Presidência", ele escreveu no Twitter.

Já a eleição de tantos nomes bolsonaristas ao Congresso era esperada para quem acompanha as redes sociais. De acordo com Barciela, os apoiadores do presidente tinham consciência de que era preciso consolidar o bolsonarismo como força política no país.

Na véspera do primeiro turno, sertanejos como Gusttavo Lima e Bruno & Marrone declararam apoio a Bolsonaro. Eles demoraram para embarcar na campanha por medo de retaliação após as críticas aos shows pagos com verba de prefeituras, a "CPI do sertanejo".

Entre os famosos pró-Bolsonaro, o nome de maior destaque nos últimos dias foi Neymar, que também declarou voto na reta final. Segundo Barciela, o analista, o jogador de futebol mostrou que pessoas importantes apoiavam o presidente —e a postagem do atleta chegou até mesmo a cortar o debate ao redor da corrente do "vira voto" nas redes.

Na visão de Rafael Zacca, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a influência de um artista no debate público mudou com as novas tecnologias na indústria cultural. Ele conta que os artistas ocupam o papel de comunicadores, misturando vida e obra, tendo a ilusão de exercerem uma influência tão grande quanto no passado.

"Mas, da mesma forma que eles têm acesso às redes sociais, nós também temos, a internet é um meio comum", diz. Ao contrário do que se imagina, o presidente tem uma estética bem definida, tentando comover as pessoas. Zacca diz que quase todo ministro de Bolsonaro exerce uma função apelativa.

É o caso do ex-ministro Gilson Machado, do Turismo, que se notabilizou por ser o sanfoneiro do Planalto, ou da senadora eleita Damares Alves, que usou tiara como se fosse uma princesa.

"Há artistas que são a favor do governo, mas sertanejos, por exemplo, não são vistos pelos bolsonaristas como integrantes da elite, mas sim pessoas simples. O que Bolsonaro fez foi transformar o trabalho na cultura e no pensamento como uma função elitista."

Mas, se não foi suficiente para encerrar a corrida presidencial, o posicionamento de artistas em favor de Lula teve um peso. O petista teve a maior votação de um candidato à Presidência no primeiro turno no período da redemocratização, superando a própria votação em 2006, e precisando de menos de 2% dos votos para evitar um segundo turno.

"Fátima Bernardes, que os seguidores não sabiam em quem vota, agora sabem. Não significa que todos eles vão seguir a opinião dela, mas eles são muito influenciados", diz Fátima Pissarra, CEO da Mynd, agência que cuida da relação de famosos com marcas.

Segundo ela, um artista com muitos seguidores —como Anitta, Bruna Marquezine e Gusttavo Lima— não fala necessariamente para fora de uma bolha, mas tem uma ascendência em seus segmentos. "A Fátima é vista como uma pessoa que pesquisa, pondera, e que não tem polêmicas. Então, ela dizer que vai votar no Lula é claro que influencia pessoas que estão indecisas."


Pissarra também destaca a influência do artista no engajamento político de parte da população. "O Brasil tem uma população que não se posiciona. No domingo, 30 milhões de pessoas não foram votar. Se
você se posiciona, pode perder o trabalho, apanhar na rua. O artista se posicionando incentiva essa movimentação."

As declarações de Bernardes, Lima e Xuxa vieram muito tarde para influenciar o pleito de domingo —mas podem ter peso no segundo turno. "Agora, essa estratégia do ‘vira voto’ no Instagram acabou para o segundo turno. Ninguém vira voto do Bolsonaro e vice-versa", diz Fernanda Vicentini.

A disputa agora, afirma a professora, vai ser pelos indecisos — e promete elevar ainda mais a temperatura das redes. "No primeiro turno, as redes sociais ficaram tranquilas. Toda essa energia vai explodir agora, no segundo turno."

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