Descrição de chapéu
Beatriz Bevilaqua

Big techs intimidam startups e organizações

Quando um negócio privado se torna tão grande quanto o Estado, precisamos estar em alerta

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Beatriz Bevilaqua

É jornalista e comunicadora de startups

É cada vez mais notório o poder e a presença das big techs —maiores empresas globais de tecnologia— em nossas vidas. Com a crise da Covid-19 e a aceleração da digitalização, nossas informações ficaram ainda mais concentradas em dados —o Brasil, aliás, é um dos países que mais passam tempo na internet e nas redes sociais.

Uma pesquisa da Ericsson sobre o comportamento de consumidores durante a pandemia revelou que os brasileiros estão utilizando quatro horas a mais de internet fixa por dia —o dobro da média mundial registrada nesse mesmo período.

Atualmente, vivemos uma espécie de relação “simbiótica” com o universo online. Muitas PMEs nascem dentro das redes sociais antes mesmo de terem aberto o primeiro CNPJ. O digital surge então como uma alternativa para validar o negócio, impulsioná-lo e gerar escalabilidade —no entanto, as regras do jogo são decididas pelas big techs, que dominam a tecnologia, os dados, a inovação e a economia global.

No dia 10, a mLabs, plataforma que presta serviço de gerenciamento de mídias sociais, afirmou que o Facebook tirou do ar 39 milhões de posts de clientes a partir de seu sistema para agendamento de publicações, impactando todas as pequenas e médias empresas brasileiras em cadeia. O Facebook afirmou que “a mLabs estava envolvida em coleta não autorizada de dados e de credenciais de usuários, o que são violações dos termos de uso do Facebook e do Instagram”.

Após todo o imbróglio dos últimos dias entre Facebook e mLabs, a startup joseense finalmente retornou a conexão com a rede social e conseguiu recuperar todos os posts dos clientes. Os serviços do Instagram na mLabs foram homologados pelo Facebook, no entanto com limitações impostas pela API oficial.

As big techs parecem ser o “Pac-Man” do mundo digital ou os novos “deuses” dos tempos atuais, que podem tomar decisões arbitrárias e sem nenhuma consulta ao seu usuário, parceiro ou cliente.

Neste mesmo ano, o Facebook bloqueou milhares de páginas de notícias de veículos de comunicação e de organizações públicas e privadas na Austrália, em uma surpreendente retaliação a uma proposta de lei que permite que as empresas de mídia cobrem pelo compartilhamento de seus conteúdos.

Naquele momento, o governo australiano condenou a ação do Facebook, que resultou até no bloqueio de alguns portais de comunicação do próprio governo que divulgam mensagens de emergência. Atos intencionais ou não intencionais das big techs podem impactar o mundo inteiro. No fim do ano passado, uma falha do Google deixou bilhões de usuários em todo o planeta sem acesso a serviços como YouTube, Gmail e Google Drive.

O problema técnico durou cerca de algumas horas e gerou um grande choque na rede. Em um mundo cada vez mais dependente dessas companhias, cada erro pode ser fatal e irrecuperável, sobretudo para os pequenos negócios.

Se as nossas vidas “físicas ou jurídicas” dependem cada vez mais dos gigantes globais de tecnologia, está mais do que na hora de discutirmos também práticas anticompetitivas de organizações que têm um poder irrestrito.

Em abril, a União Europeia acusou a Apple de manter práticas anticompetitivas em sua loja de aplicativos. A famosa marca da maçã impôs a taxa de 30% sobre todas as vendas dentro da Apple Store. Qualquer aplicativo é obrigado a dar esse percentual do faturamento para a Apple. O Spotify, o Facebook e outras empresas seguem em pé de guerra com a Apple em razão disso.

O documentário “O Dilema das Redes”, da Netflix, traz uma crítica sobre como esse poder ilimitado pode ser devastador até mesmo sobre a democracia e a humanidade. Nos Estados Unidos, o tema sobre o direito básico de livre concorrência está sendo discutido dentro do Congresso Nacional. Se, em um primeiro momento, a internet e as redes sociais foram uma grande revolução para nos conectar entre as pessoas, marcas e governos de várias regiões do planeta, hoje nos damos conta de que vivenciamos uma censura travestida de liberdade.

O Facebook é usado por mais de 70% da população brasileira, e o WhatsApp, por 99% dos smartphones no país. Quando um negócio privado se torna tão grande quanto o Estado, precisamos estar em alerta.

É preciso um olhar urgente sobre os limites do poder das big techs, sobretudo num cenário em que estamos totalmente imersos no digital. Somos ao mesmo tempo reféns e parasitas de um ecossistema de inovação muito complexo e em transformação. Que tenhamos sabedoria para novas regulamentações mais justas e inclusivas.​

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.