Montadoras miram 2023 com investimentos de R$ 20,9 bilhões

Expectativa é retomar patamar de vendas de 3 milhões de unidades até 2030

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São Paulo

As montadoras instaladas no Brasil já estão em 2023. Investimentos anunciados nos últimos três meses somam R$ 20,9 bilhões e mostram que a indústria enxerga a retomada para além de um início de ano turbulento.

O aporte de maior vulto foi anunciado em janeiro pela chinesa Great Wall (R$ 10 bilhões), que vai produzir carros híbridos e elétricos em Iracemápolis (interior de São Paulo), na fábrica que pertenceu à Mercedes-Benz.

Causa espanto ouvir o setor automotivo falar de cifras altas em um ano de eleições majoritárias, quando empresas costumam pisar no freio diante do cenário de incerteza, mas essa indústria tem seus próprios ciclos e interesses.

Volta ao trabalho na montadora de caminhões Mercedes-Benz
Volta ao trabalho na montadora de caminhões Mercedes-Benz - Bruno Santos - 18.mai.2020/Folhapress

"A Great Wall está fazendo um investimento de longo prazo e adquiriu uma fábrica já instalada. Vieram aqui e compraram em uma época de baixa, com o real bastante desvalorizado", diz Cassio Pagliarini, sócio da consultoria Bright.

"Os chineses estão olhando para o futuro, e compensa fazer esse investimento. Se querem crescer globalmente, precisam do volume do Brasil, que não vai ficar sempre nesses 2 milhões [de unidades vendidas]."

O especialista acredita que o mercado interno vai voltar ao patamar de 3 milhões de unidades até 2030, e quem investe agora tem essa visão de longo prazo.

Mas se o retrato de momento fosse parâmetro para definir investimentos, talvez faltasse coragem às empresas. Segundo a Anfavea (associação das montadoras), a produção de veículos leves e pesados em janeiro teve queda de 27,4% em relação ao mesmo mês de 2021. O resultado foi influenciado pelos efeitos da variante ômicron nas linhas de montagem e por férias coletivas.

A entidade acredita que o PIB (Produto Interno Bruto) terá um crescimento de 0,5% em 2022 e projeta um crescimento de 9,4% na fabricação, com 2,46 milhões de unidades saindo das linhas de montagem. Como as montadoras dividem o mundo em macrorregiões, a visão de retomada não se limita ao Brasil.

Reiner Braun, presidente do grupo BMW na América Latina, vê um crescimento de 2,5% do PIB na América Latina. A marca vive um bom momento global, tendo registrado um crescimento de 98,4% nas vendas entre 2020 e 2021.

Em novembro, a montadora alemã anunciou um novo investimento na fábrica de Araquari (SC). Serão aplicados R$ 500 milhões entre 2022 e 2024 para produção dos utilitários X3 e X4, além de um modelo que ainda será revelado na Alemanha. A marca já investiu R$ 1,8 bilhão na produção local desde 2014.

Pagliarini explica que, no caso da BMW, aumentar o investimento na montagem local deve ter sido uma decisão tomada após considerar os impactos da redução de tributos mediante a maior nacionalização de suas operações. Esse é um dos pontos de incentivo previstos no programa Rota 2030.

A concorrente Audi também se movimenta. Após permanecer parada ao longo de 2021, a montadora alemã vai reiniciar a produção de veículos em São José dos Pinhais (PR).

A retomada está prevista para o início do segundo semestre de 2022, com a montagem dos modelos Q3 e Q3 Sportback. Os valores investidos ainda não foram revelados, mas a empresa divulgou que vai gastar R$ 20 milhões na instalação de pontos de recarga para carros elétricos em suas concessionárias.

Mas o exemplo da Audi mostra o quanto é complexo apostar na indústria nacional. A reabertura da fábrica estava vinculada ao recebimento de uma dívida gerada durante o programa Inovar-Auto, que vigorou de 2012 a 2017.

O valor deveria ser pago pelo governo como estorno de tributos. Dos cerca de R$ 300 milhões retidos desde o governo Dilma, entre 70% e 80% eram devidos à Audi.

Em dezembro, durante o anúncio da retomada, o então presidente da Audi no Brasil, Johannes Roscheck, disse que não foi fácil convencer a matriz. O pagamento da dívida segue em negociação.

Apesar dos senões do país, o potencial do mercado e a expectativa de crescimento forçam as marcas a pensar no futuro.

"Investimentos de montadoras nunca são de curto prazo, sempre são analisados cenários de longo prazo, bem como retornos nesse mesmo tempo", diz Milad Kalume, gerente de desenvolvimento de negócios da Jato Dynamics Brasil.

"O dólar em alta facilita os investimentos aqui, pois o país se torna ‘barato’. Outros anúncios certamente virão, e em breve."

No segmento de veículos pesados, os investimentos são facilmente explicáveis. O setor vive um bom momento devido aos resultados do agronegócio e da mineração, além da demanda por serviços de entrega.

Volvo, Iveco e DAF fizeram anúncios recentes, que somam aproximadamente R$ 3 bilhões em aportes.

As fabricantes também se movimentam para atender à próxima etapa do Proconve (Programa de Controle de Emissões Veiculares) para veículos pesados, que entra em vigor no próximo ano.

Outro ponto que vai estimular investimentos é o programa Finame Baixo Carbono, do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

A linha de crédito facilita a compra de veículos e maquinário movidos a eletricidade, a pilha de hidrogênio ou a biocombustível, como gás natural e etanol. Ao gerar o aumento da demanda por esses produtos, as montadoras terão de encontrar caminhos para nacionalizar carros menos poluentes.

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