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Fim da Saraiva e da Cultura abre caminho para mercado editorial mais moderno

Criticada por dificultar vida de livrarias de rua, ascensão da Amazon trouxe práticas mais saudáveis ao segmento

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São Paulo

Parece uma questão de tempo até o fim definitivo das operações das duas redes de livrarias que, até há pouco tempo, davam as cartas no mercado editorial brasileiro.

A Saraiva decidiu fechar todas as lojas e demitir seus funcionários, o que deixa a existência da empresa por um fio. Já a Cultura está aberta porque conseguiu reverter sua falência momentaneamente no STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Loja da livraria Saraiva fechada na Praça da Sé, em São Paulo
Loja da livraria Saraiva fechada na Praça da Sé, em São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress

O senso comum olha para a dolorosa crise dessas duas redes e costuma apontar um culpado: a Amazon. Uma explicação que está longe da verdade.

Saraiva e Cultura enfrentaram um período de mau desempenho econômico do Brasil e uma pandemia, mas a situação que vivem agora é fruto de escolhas de gestão que deram errado. A Amazon soube apenas ocupar o espaço deixado por elas.

Em vez de um prenúncio do apocalipse, o fim das duas redes abre espaço para a modernização do mercado editorial brasileiro —em partes por influência do site americano, que trouxe algumas práticas saudáveis para o setor no país.

Não é raro que se acuse a Amazon de agir de forma predatória, especialmente por causa de descontos agressivos que, de fato, tornam difícil a vida de livrarias pequenas e médias. Mas a Saraiva em seu auge, quando chegou a representar mais de um terço das vendas do país, era conhecida pela postura agressiva.

A posição de liderança abria espaço para a empresa exercer uma cobrança cada vez maior por descontos, pressionando a margem de lucro de editoras e dificultando que livrarias menores competissem em iguais condições.

Editores só reclamavam à boca pequena, com receio de boicotes a seus lançamentos —o que a Saraiva, é claro, sempre negou fazer.

No mundo inteiro, entende-se que o risco do investimento em um livro é dos editores. No Brasil, isso se traduz no sistema de vendas em consignação, pelo qual as livrarias só pagam pelo que conseguirem comercializar.

O sonho de todo editor brasileiro é superar esse modelo de negócios. No caso da Saraiva, não era incomum editores relatarem pagamentos com cada vez mais prazo, dificuldades em receber prestações de contas ou falta de clareza sobre estoques.

Em resumo, a Saraiva foi adquirindo fama de má pagadora. A Cultura, que sempre foi o exemplo positivo, foi pouco a pouco ganhando a mesma reputação.

Já a relação de boa parte dos editores com a Amazon é diferente. Para começar, o site costuma pagar antecipado —e realiza compras em grande volume. Por isso, hoje em dia não é raro que casas editoriais pensem em produtos exclusivos para a empresa estrangeira.

Passada uma desconfiança inicial, hoje a relação nos bastidores é de previsibilidade e confiança. Há quem estime que, no segmento de livros, os americanos já sejam maiores do que a Saraiva jamais foi —o que obriga outros livreiros a também azeitarem suas operações na internet.

O debate sobre os descontos —e se eles são sustentáveis a longo prazo— vai continuar válido, é claro. Nesse campo, a discussão que une o setor é a ideia de uma lei do preço fixo, no molde do que existe em países europeus.

Mesmo se algo assim for aprovado, talvez os defensores de uma norma do tipo se surpreendam. O crescimento da Amazon no país não está calcado só em preço, e saber disso é importante para imitar o que pode ser imitado.

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