Relembre entrevistas e artigos de Affonso Celso Pastore

Economista era defensor agudo da responsabilidade fiscal e foi crítico de vários governos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Além de presidente do Banco Central e professor universitário, o economista Affonso Celso Pastore, que morreu nesta quarta (21) aos 84 anos, foi também um analista assíduo da economia brasileira, em livros, artigos e entrevistas. .

Nas páginas desta Folha, em sua entrevista mais recente, ele defendeu que o PIB (Produto Interno Bruto) de 2023 estava sendo puxado pelos gastos do governo, o que levava o setor privado a se retrair.

Na medida que a política fiscal ficou expansionista e o juro real de equilíbrio, chamado juro neutro, cresceu, não dá para ser otimista com relação ao investimento privado. Ele tem que encolher

Affonso Celso Pastore

Em entrevista à Folha em setembro de 2023

A crítica a gastos públicos sem respaldo nas receitas, com prejuízo para as contas públicas, foi a tônica de várias manifestações do ex-presidente do BC ao longo dos últimos anos.

Homem grisalho de bigode e camisa listrada de branco e azul, em escrivaninha com vários objetos e computador, com estante de livros ao fundo
O economista Affonso Celso Pastore durante entrevista em seu escritório no bairro de Pinheiros, zona oeste da cidade de São Paulo - Adriano Vizoni - 30.11.2022/Folhapress

Em 2022, também em entrevista ao jornal, quando o governo petista eleito defendia a aprovação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para ampliar gastos e criar exceções fora do teto, Pastore criticou o que considerava uma visão ideológica sobre gasto público.

O Orçamento do Brasil foi capturado por vários grupos. O grupo da Zona Franca de Manaus e o pessoal do Simples Nacional estão entre eles. O orçamento secreto é uma captura. Se você agir sobre as capturas, terá um enorme espaço fiscal para combater a pobreza

Affonso Celso Pastore

em entrevista à Folha em dezembro de 2022

No ano anterior, ao lançar seu novo livro, "Erros do passado, soluções para o futuro: A herança das políticas econômicas brasileiras do século 20", Pastore já alertava para o fato de que o câmbio depreciado não seria suficiente para resolver o problema de falta de competitividade da indústria brasileira.

Estamos muito mais aparelhados hoje para combater a inflação do que no passado. O Brasil não tinha um Banco Central ou, quando passou a ter, durante muitos anos não tinha autonomia. Nós progredimos. Essa lição, aprendemos. Mas o Brasil não conseguiu resolver o seu problema fiscal, de forma que ele interfere na política monetária e conduz a um tipo de solução [aumento maior de juros] que é muito mais custosa para a sociedade.

Affonso Celso Pastore

Em entrevista sobre o lançamento de seu livro, em outubro de 2021

Meses antes, ele afirmava que o BC, sob Roberto Campos Neto, havia errado ao demorar a subir a Selic, e exortava o governo Bolsonaro a "começar a governar".

Se eles [governo Bolsonaro] começarem a governar, as coisas melhoram. Mas se continuarem criando esses confrontos desnecessários, contra as instituições, a começar pelo presidente da República, que é o maior iludido com regimes autoritários, não tem como dar certo.

Affonso Celso Pastore

em entrevista à Folha em agosto de 2021

Em 2017, o economista viu o mercado financeiro "bêbado" com a situação externa favorável e risco grave na situação fiscal da então gestão Michel Temer.

Cumprir o teto não é uma escolha. Está na Constituição. Se o congelamento de gastos não for mantido, a dinâmica da dívida pública explodirá. Mas a primeira dúvida que surge para qualquer cidadão é como um governo que gasta boa parte do seu capital político só para se manter no poder vai conseguir apoio para isso [aprovar a reforma da Previdência].

Affonso Celso Pastore

em entrevista à Folha em agosto de 2017

Em janeiro daquele ano, depois de três anos de um duro ajuste na economia brasileira, Affonso Celso Pastore foi um dos primeiros a registrar o fim da recessão, embora ressaltasse que a recuperação seria bastante lenta.

Não adianta ficar aflito. Quando os juros começam a cair, os resultados na atividade demoram para aparecer. O canal do crédito está obstruído, porque o governo anterior [de Dilma Rousseff] gerou uma expansão tão grande dos empréstimos que elevou a inadimplência. Vai demorar até que as famílias absorvam suas dívidas e, por isso, o efeito da queda do custo dos empréstimos no consumo não será tão grande. Não saímos da recessão, mas estamos chegando ao seu fim. A queda dos juros vai ajudar o país a sair da recessão.

Affonso Celso Pastore

em entrevista à Folha em janeiro de 2017

Ao ser questionado sobre se havia muito tempo que não se sentia otimista, o ex-presidente do BC respondeu.

O pessimismo não é uma patologia. É só consequência da constatação de que se acumularam erros que levaram ao desastre. Um economista atento percebia que o Brasil se encaminhava para uma crise. No fim de 2013 e no início de 2014, apontávamos que o país ia para uma recessão, que depois se comprovou a mais longa e profunda da história. A previsão vinha da constatação dos erros do malfadado experimento da "nova matriz". Agora vejo um longo caminho de ajustes, cujos resultados, principalmente sobre o crescimento, não serão rápidos, mas o governo está seguindo no rumo certo.

Affonso Celso Pastore

Em entrevista em janeiro de 2017

Durante a discussão sobre o uso de reservas internacionais para combater a crise, Pastore escreveu artigo contra a ideia, defendendo que as reservas funcionam como um seguro: "garantem o cumprimento de obrigações externas, mas têm um custo, que é a diferença entre a taxa de juros da dívida pública e a taxa de remuneração das reservas. No Brasil, esse custo é alto, levando alguns a proporem uma redução das reservas".

O mau desempenho macroeconômico dos últimos anos eleva os riscos, tornando necessária uma maior cobertura do "seguro". Se o proprietário de uma casa muito exposta ao risco de incêndio deixasse de pagar o seguro para aumentar o consumo da família, correria o risco de perder seu patrimônio. Melhor seria tratar de reduzir a exposição ao risco, o que no caso do Brasil significa melhorar a política econômica.

Affonso Celso Pastore

em artigo na Folha, em janeiro de 2016

"Sem dúvida, o ajuste fiscal é a tarefa mais importante da nova equipe econômica", escreveu em 2014, sobre os desafios do governo Dilma, em artigo em coautoria com sua mulher, Maria Cristina Pinotti..De acordo com os autores, seria preciso permitir que a taxa de câmbio voltasse a seu patamar de equilíbrio.

Como em uma reforma que se faz em casa, primeiro aparecem os custos e só no fim se usufrui de uma casa melhor. A conclusão é que não bastam só a competência e a determinação, que certamente caracterizam a nova equipe econômica. É preciso também muito apoio político para enfrentar a sequência de custos que precederá em muito o surgimento dos benefícios.

Affonso Celso Pastore e Maria Cristina Pinotti

Em artigo na Folha, publicado em dezembro de 2014

Logo após a reeleição da presidente Dilma, Pastore defendeu com afinco a necessidade de um ajuste das contas públicas, ressaltando que isso levaria no curto prazo a recessão e desemprego.

Não é um desafio que discurso de palanque resolva. O governo evitou tudo o que foi politicamente nocivo e os problemas se acumularam. Só se ela [Dilma] fizer uma mágica, que está no campo da metafísica, e não da ciência

Affonso Celso Pastore

em entrevista à Folha em novembro de 2014

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.