Geração Z avança no LinkedIn em busca de refúgio contra a polarização

Nascidos a partir de 1995 são a faixa que mais cresce na plataforma de contatos profissionais, que tem o Brasil como terceiro maior mercado

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São Paulo

Uma das práticas mais comuns de recursos humanos é promover o "Dia da Família" nas empresas: quando os filhos visitam os escritórios, fábricas ou comércios onde os pais trabalham para conhecer um pouco do dia a dia.

Em geral, as crianças são recepcionadas com um farto café da manhã, lanche ou almoço caprichado, um tour guiado pela empresa e recebem brindes como recordação.

Na rede de contatos profissionais LinkedIn, são os pais que vão à sede da companhia no Brasil para conhecerem o trabalho dos filhos. "A idade média da nossa equipe é 28 anos. Aqui nós não produzimos algo físico, nem prestamos um serviço tangível. Temos uma rede social que fatura fornecendo acesso a informações, ferramentas de recrutamento, publicidade etc. A gente traz os pais para entenderem o que os filhos fazem", diz Milton Beck, diretor geral do LinkedIn para América Latina e África, em entrevista à Folha na sede que fica na zona oeste de São Paulo.

homem branco, idoso e calvo, com camisa preta, diante de um grafite colorido, com imagem de pássaros
Milton Beck, diretor geral do LinkedIn para a América Latina e África. - Bruno Santos/ Folhapress

"Também explicamos como a companhia banca uma geladeira que oferece tudo de graça aos funcionários", brinca Beck, um dos poucos executivos 60+ (talvez o único) do LinkedIn no país.

Prata da casa da Microsoft, dona do LinkedIn, Beck aproveita a sua experiência em tempo integral com a geração Z –os nascidos entre 1995 e 2010, que hoje têm entre 14 e 29 anos– para guiar as estratégias de crescimento da rede social no país, onde os jovens vêm se tornando a maioria.

"Assim como os pais que vêm nos visitar, eu também tenho uma filha de 26 anos e um filho de 24. São nativos digitais, conhecem todas as redes sociais. Essa geração que já está na faculdade ou em começo de carreira usa cada vez mais o LinkedIn para auxiliá-la nas decisões profissionais", diz o executivo.

Em todo o mundo, a rede social acaba de conquistar a marca de 1 bilhão de usuários, 75 milhões deles no Brasil, seu terceiro maior mercado, depois dos Estados Unidos e da Índia. A geração Z é a que mais cresce na base brasileira: representa hoje 35,4% do total, contra 23% de 2019. O atual índice coloca o Brasil com a segunda maior proporção destes jovens na plataforma, só atrás da Índia (41%), à frente dos EUA (20%).

Vale lembrar que, na pirâmide etária brasileira, a geração Z representa uma proporção bem inferior, em torno de 23% da população, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Essa presença maciça de jovens chama a atenção pelo fato de a plataforma desestimular conteúdos virais e trabalhar o seu algoritmo para que o feed (fluxo de conteúdo) seja mais informativo.

"Em geral essa faixa etária procura o LinkedIn quando está entre o meio e o final da sua formação acadêmica, incentivada inclusive pelos professores", afirma Beck. Eles começam a seguir empresas que atuam nas suas áreas de interesse. "É uma rede mais segura que as demais, tem bem menos 'haters' [usuários que postam conteúdos de ódio], as pessoas não se escondem sob pseudônimos para publicar absurdos", diz. "No LinkedIn, os usuários têm nome, na maioria das vezes estão ligados a uma empresa, uma instituição, pensam duas vezes antes de fazerem uma postagem."

Beck discorda em parte das críticas que apontam os jovens da geração Z como pouco comprometidos com o trabalho e impacientes com a carreira, interessados apenas em empresas que se encaixam ao seu perfil, e não em se adaptar ao perfil da empresa.

"É verdade que eles estão muito mais preocupados com o que pensam os executivos da companhia hoje, pesquisam o histórico e a atuação da empresa", diz. "Querem trabalhar com propósito, saber que o que fazem é relevante", afirma. Ainda assim, diz, seria utópico pensar que a geração Z se guia apenas por ética e identificação. "Eles também precisam pagar contas e estão em busca de um bom salário."

Na opinião de Beck, trata-se de uma perspectiva diferente das gerações anteriores. "Quando comecei minha carreira, por exemplo, nem sabia quem eram os executivos da empresa, só os vi passando pelo corredor dois anos depois de entrar na companhia'", diz ele, um engenheiro mecânico de 61 anos, que começou em uma empresa de autopeças de São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, depois de ver um anúncio no mural da faculdade, que buscava engenheiros recém-formados.

"Não sabia nada sobre missão, visão, valores da empresa. Era uma oferta de trabalho dentro da minha área, pagava bem e era de fácil acesso. O suficiente para mim na época", diz.

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA BUSCA PELA MELHOR VAGA

Para ajudar o usuário a atingir seus objetivos profissionais, o LinkedIn vem investindo cada vez mais em ferramentas de inteligência artificial.

"Temos IA na plataforma desde 2007, para identificar contatos e vagas que sejam do mesmo perfil do usuário", afirma. "Mas agora os novos recursos contribuem para o público traçar melhor o seu planejamento de carreira."

Um analista de marketing, por exemplo, que sonha em chegar à vice-presidência da área pode descobrir quais habilidades e competências precisa ter a partir dos dados dos VPs de marketing disponíveis na plataforma, afirma.

Também é possível corrigir as lacunas na formação a partir de cursos: a divisão LinkedIn Learning soma 21 mil programas de curta, média ou longa duração, boa parte deles relacionados a habilidades comportamentais. É voltada às empresas, mas com conteúdo aberto a usuários premium –que pagam mensalidades a partir de R$ 49,90, contando com maior alcance de conexões e visualização das visitas ao seu perfil. "Temos ainda cursos gratuitos, como os de IA, que hoje somam 250."

As assinaturas premium são apenas parte do negócio –que também inclui soluções de talentos (LinkedIn Learning e ferramentas para seleção de candidatos), soluções de marketing (anúncios no "feed") e soluções de vendas (filtros que auxiliam vendedores), todas dirigidas às empresas.

No mundo, o LinkedIn faturou US$ 15 bilhões (R$ 77,4 bilhões) em 2023, alta de 10% sobre o ano anterior. O índice de crescimento é maior que o da Microsoft, que registrou no exercício de 2023 receita de US$ 211,9 bilhões (R$ 1 trilhão), alta de 7% na comparação anual. A Microsoft, por sinal, vem ganhando protagonismo na cena da inteligência artificial: é a principal acionista da OpenAI, criadora do ChatGPT.

Apesar dos bons resultados, o LinkedIn promoveu um corte de quase 1.400 profissionais em nível global, em duas fases (maio e outubro), como forma de equilibrar caixa. Parte das vagas seriam reabertas na Índia. A empresa não revela quantos foram dispensados no Brasil, onde emprega cerca de 200 pessoas. No mundo, soma cerca de 20 mil funcionários.

A CADA MINUTO, 9.000 CONEXÕES E OITO CONTRATAÇÕES NO BRASIL

Com 75 milhões de usuários no país, "cerca de 60% da força de trabalho nacional", segundo Beck, o LinkedIn atinge 9.000 conexões por minuto. Um pedido de conexão é feito sempre que alguém deseja fazer parte da rede social de outro usuário. Em média, são enviadas 5.400 candidaturas de emprego por minuto, período em que são realizadas oito contratações.

"Quando comecei no LinkedIn, em 2012, a gente somava 5 milhões de usuários no país e as pessoas tinham receio de aderir à plataforma, como medo de parecer que elas estavam procurando emprego", afirma Beck. "Da mesma maneira, as empresas viam o LinkedIn com desconfiança, e algumas queriam saber quais dos seus funcionários estavam inscritos na rede."

Mas à medida que profissionais e empresas perceberam que o "networking" proporcionado pelo LinkedIn poderia ser um aliado –seja para fazer contatos que antes dependiam de feiras e eventos, fechar novos negócios, reforçar a reputação empresarial, oferecer serviços, atrair talentos ou realçar as conquistas no currículo– as barreiras foram caindo, afirma.

A marca de 1 bilhão de usuários coloca o LinkedIn no topo das redes de mídia social, que incluem rivais TikTok (1 bilhão), Instagram (1,6 bilhão) e Facebook (2,1 bilhões), pródigas em vídeos e fotos.

O LinkedIn também permite vídeos e fotos, embora esses recursos não sejam os mais usados. "Se eu vou começar o diálogo com alguém, apresentar uma ideia, é natural que eu use o texto", diz Beck. "Mas nada impede que o usuário também use fotos para registrar um momento especial da carreira, poste um vídeo para apresentar um trabalho, ou até faça uma live", afirma. "Acredito na comunicação multiformatos."

O próprio executivo testou formatos novos. "Sempre fui muito de texto, mas na pandemia resolvi partir para as lives e depois para os podcasts, um projeto que mantenho até hoje, entrevistando personalidades sobre suas carreiras", diz Beck, referindo-se ao podcast 3In3, veiculado no próprio LinkedIn.

"Os vídeos começavam com uma audiência alta, mas depois de alguns minutos iam perdendo público". Qual o problema? "Eram longos demais, com uma hora de duração", diz. "Como não consigo lutar contra o sistema, me adaptei a ele. Hoje faço vídeos de três a cinco minutos, com três perguntas."


RAIO-X LINKEDIN

Fundação: 2003

Sede: EUA

Presença: escritórios em 35 cidades, atuação em 200 países

Faturamento*: US$ 15 bilhões

Número de funcionários: 20 mil

Número de usuários: 1 bilhão

Posição do Brasil no ranking: 3º maior mercado, depois de EUA e Índia

*Ano fiscal 2023

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