Fase vermelha abre novo round na briga entre lojistas de shoppings e administradoras

Com dificuldade para renegociar aluguéis e taxas, comerciantes buscam novos formatos de negócio

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São Paulo

Assim que a fase vermelha voltou a vigorar em São Paulo, no último dia 6 de março, iniciou-se um novo round da luta entre lojistas e administradoras de shoppings.

A disputa teve início em junho de 2020, quando os shoppings retomaram as atividades e, gradativamente, foram suspendendo os benefícios concedidos na primeira fase da quarentena —entre março e junho, aluguéis ficaram suspensos e encargos foram reduzidos entre 40% e 60%.

“Em setembro, a maioria das administradoras já não concedia desconto algum, sem levar em conta que o faturamento dos lojistas nunca voltou ao patamar pré-pandemia”, afirma Mauro Francis, diretor jurídico da Ablos (Associação Brasileira dos Lojistas Satélites), que representa 130 associados —120 deles no estado de São Paulo.

Em dezembro, o 13º aluguel também foi cobrado integralmente, ressalta Francis. “Como o resultado do Natal ficou muito abaixo do esperado, pedimos o pagamento proporcional, mas nosso pleito não foi atendido. Grande parte dos lojistas simplesmente não pagou."

Praça de alimentação vazia
Praça de alimentação do shopping Cidade São Paulo no dia da reabertura dos centros comerciais em São Paulo no ano passado - Eduardo Knapp - 11.jun.20/Folhapress

Agora, estão sobre a mesa os contratos de aluguel em fase de renovação. Lojistas argumentam que a correção pelo IGP-M (Índice Geral de Preços Mercado), que chegou a 25,71% nos últimos 12 meses, é irreal para um setor que ainda não se recuperou das perdas de 2020 e, mais uma vez, está de portas fechadas.

“Não queremos mudar o índice em definitivo, só pedimos uma revisão neste momento de crise”, afirma Francis.

Diretor-geral da rede de hamburguerias Johnny Rockets Brasil, Álan Torres, 36, já refez o planejamento estratégico para 2021. A expansão, a partir de agora, será realizada por meio de lojas de rua exclusivas para delivery e retirada, batizadas de Johnny Go. A rede conta atualmente com 32 lojas no Brasil (27 delas em shoppings).

Em 2020, cinco unidades foram inauguradas em Campinas, Guarulhos e na capital, sempre em avenidas de grande circulação. Com 15 m², as lojas têm estacionamento, mas não dispõem de salão.

A previsão do executivo é dobrar o número desse tipo de unidade até o fim do ano.

“As lojas de rua têm alcançado resultado melhor. Tenho liberdade para operar o delivery durante a madrugada, o que o shopping não permite, e há mais flexibilidade para negociar com os proprietários dos imóveis”, diz.

Unidade da rede de hamburguerias Johnny Rockets exclusiva para delivery e retirada, localizada na av. João Saad, no bairro do Butantã, em São Paulo
Unidade da rede de hamburguerias Johnny Rockets exclusiva para delivery e retirada, na av. João Saad, no bairro do Butantã, em São Paulo - Divulgação

Presidente da rede de franquias Doctor Feet, com 70 unidades em 14 estados (60 delas em shoppings), Jonas Bechelli, 45, também relata um desempenho melhor das lojas de rua.

“Em 2020, enquanto as unidades de shopping atingiram, no máximo, 70% do faturamento anterior à pandemia. Já as de rua chegaram a 95%”, afirma.

Parte dos atendimentos da rede, especializada em cuidados para os pés, passou a ser feita em domicílio. O ticket médio, diz ele, continua o mesmo registrado no pré-pandemia: R$ 150.

A iniciativa, porém, não tem sido suficiente para manter as contas no azul. No último ano, a Doctor Feet demitiu 30% da equipe, passando de 1.000 para 700 funcionários, e 15% das franquias fecharam as portas definitivamente —todas em shoppings.

Em função da nova fase vermelha, o empresário acredita que as vendas voltarão a cair de forma acentuada.

“Já começamos a tentar negociar com as administradoras dos shoppings, mas a conversa está sendo dura e difícil. Se eu, que tenho tantas unidades, não consigo avançar, imagine o pequeno lojista. Meus franqueados têm sido bastante assediados e estão analisando com carinho a possibilidade de migrar para lojas de rua”, diz.

No caso das franquias, o vice-presidente da ABF (Associação Brasileira de Franchising), Tom Moreira Leite, defende que administradoras levem em conta a relevância do setor, que representa 40% das lojas satélites (de menor porte) de shoppings e considerem o baixo desempenho que esses comerciantes vêm registrando.

Ele cita como exemplo o setor de alimentação, um dos mais atingidos. Levantamento do Instituto Foodservice Brasil mostra que, desde a primeira semana de janeiro, as unidades de shoppings amargaram queda nas vendas de 26,4% em média, enquanto as de rua registraram aumento médio de 2,5%.

Em contrapartida, o custo de ocupação, que é a soma das despesas que o lojista tem para se manter no shopping, só subiu: equivalia a entre 10 e 12% do faturamento em 2019 e chegou a 20% em 2020.

“Agora, diante do novo cenário de restrições, essa equação está ainda mais desequilibrada. A sensibilidade das administradoras foi baixa em relação à cobrança do 13º aluguel, mas minha expectativa é que o setor demonstre mais cuidado agora, nessa fase mais aguda”, afirma Leite.

A Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), que representa cerca de 400 shoppings em todo o país, informou que "o IGP-M é um índice legal para reajustes de aluguéis e negociado por lojistas e shoppings em ambiente de livre negociação, todos com perfeita ciência dos elementos que compõem o indexador".

"Dessa forma, cabe aos empresários, que desejam usufruir de uma sociedade pautada pela livre iniciativa e pela liberdade de empreender, respeitar os contratos. As administradoras de shoppings abstiveram-se de mais de R$ 5 bilhões em adiamento e suspensão de despesas aos lojistas e eventuais renegociações devem ser feitas caso a caso", diz nota da entidade.

"As perdas acumuladas no intervalo de 4 de janeiro a 28 de fevereiro deste ano totalizam 18,2% em relação ao período equivalente de 2020, antes da pandemia. Esse resultado indica uma recuperação gradual, já que as perdas no setor chegaram a 90%", afirma a associação.

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