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Resta ver se celebrações na China vão impulsionar reformas em vez de abafar desafios

Sob os reluzentes estandartes, nem tudo está sob controle no regime comunista

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Adriana Abdenur
Rio de Janeiro

Por si só, a saraivada de propaganda autoelogiosa que acompanha as celebrações das conquistas do Partido Comunista chinês não será novidade. A cada 1º de outubro, líderes chineses alimentam o sentimento nacionalista, inclusive por meio da demonstração de poder militar.

O dirigente Xi Jinping falou ao povo da Praça da Paz Celestial, conhecida como Tiananmen, tradicionalmente o centro de gravidade do poder na China. A praça fica em frente à Cidade Proibida, de onde os imperadores governavam a China dinástica.

Militares marcham em formação durante comemoração dos 70 anos do regime comunista na China
Militares marcham em formação durante comemoração dos 70 anos do regime comunista na China - Jason Lee/Reuters

Também lá que Mao Tse-tung proclamou a República Popular da China, uma vitória conquistada quatro anos após o fim da ocupação japonesa durante a Segunda Guerra Mundial, enquanto os nacionalistas —cujas investidas contaram com apoio do governo americano— batiam em retirada para a ilha de Taiwan.

Xi, que no ano passado alterou a Constituição de forma a eliminar os limites do mandato da liderança do regime, permitindo que permaneça no cargo por tempo indefinido, estima as demonstrações públicas do poder do Estado.

O líder chinês já presidiu mais desfiles militares do que seus três antecessores juntos. E o aniversário de 70 anos da República oferece a oportunidade de mostrar ao mundo não apenas o quão poderosa a China se tornou desde a sua fundação, mas também o quão longevo é o regime comunista. 

O partido persiste no poder, de forma contínua, há mais tempo do que a União Soviética durou. Perde em longevidade no poder apenas para o regime comunista da Coreia do Norte, fundado em 1948.

Durante as sete décadas no poder, o Partido Comunista chinês enfrentou grandes convulsões tanto no plano doméstico quanto no externo. 

O Grande Salto para Frente, que buscou transformar a China em potência industrial em tempo recorde, matou de fome dezenas de milhões; a Revolução Cultural fechou as universidades e criou uma “geração perdida”. 

 

O regime comunista também sobreviveu às reformas de abertura, assim como aos protestos liderados por estudantes que resultaram no massacre da Praça da Paz Celestial, em junho de 1989.

Hoje, além de ser uma potência nuclear e deter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, a China atua de forma cada vez mais proativa em debates globais, por exemplo sobre mudanças climáticas, governança econômica e operações de paz.

Pequim administra um portfólio de cooperação que se estende por praticamente todo o planeta e que se consolida por meio da Iniciativa do Cinturão e Rota. As Forças Armadas chinesas, outrora consideradas limitadas, hoje gozam de alcance global e desenvolvem tecnologias de ponta.

Mas, sob os reluzentes estandartes, nem tudo está sob controle. O crescimento da economia chinesa encontra-se no nível mais baixo desde 1990. 

Há quatro meses manifestações colossais mobilizam milhões de pessoas pelas ruas de Hong Kong. A guerra comercial lançada por Donald Trump gera novas incertezas. 

Pesam também as críticas contundentes ao regime pelos abusos de direitos humanos, especialmente contra os tibetanos e os muçulmanos de Xinjiang. Resta ver se as comemorações dos 70 anos irão impulsionar também novas formas de enfrentar esses desafios —em vez de abafá-los.

Adriana Abdenur
Socióloga, compõe o Comitê de Políticas de Desenvolvimento das Nações Unidas

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