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Golpe em Mianmar completa um ano com explosão e mortos em evento militar

Greve silenciosa deixou ruas de centro comercial desertas, e países anunciaram sanções

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Rangoon (Mianmar) | AFP e Reuters

No dia em que se completa um ano do golpe militar em Mianmar, que gerou uma onda de violência e a prisão da principal líder civil do país, Aung San Suu Kyi, uma explosão em uma passeata pró-Exército deixou dois mortos e mais de 30 feridos, ilustrando o estado das tensões no país do Sudeste Asiático.

O episódio aconteceu nesta terça (1º), em Tachileik, cidade no leste de Mianmar que faz fronteira com a Tailândia, durante um ato em apoio aos militares. Nenhum grupo reivindicou a responsabilidade pela explosão. Segundo a imprensa local, um soldado morreu e há veteranos de guerra entre os feridos.

Centro comercial de Rangoon, importante cidade de Mianmar, fica vazio em meio a greve silenciosa em protesto contra golpe militar - AFP

O episódio fez com que o chefe da junta militar que tomou o poder, Min Aung Hlaing, prorrogasse por mais seis meses o estado de emergência imposto desde o golpe, em meio a ameaças de "sabotadores internos e externos" e "ataques terroristas e destruição", nas palavras da imprensa oficial.

Estimativas indicam que a violenta repressão que sucedeu o golpe já deixou mais de 1.500 mortos. Ainda assim, o governo não tem conseguido conter a resistência, que aderiu à luta armada em várias frentes.

O aniversário do golpe ainda foi marcado por outros tipos de protestos, como em Kyaukdataung, na região central do país, onde um homem ateou fogo a si próprio e foi internado em estado grave.

O mal-estar ficou evidente também de forma menos barulhenta. O movimento pró-democracia convocou uma greve silenciosa que deixou as ruas de algumas das principais cidades de Mianmar desertas, como em Rangoon, principal centro econômico do país, Mandalay, na região central, e Myitkyina, ao norte.

"Ninguém sai do bairro. As forças de segurança patrulham", disse um morador de Rangoon. "O silêncio é o grito mais forte que podemos dar contra os soldados e a violenta repressão", escreveu uma opositora no Twitter. O contraste foi evidente em Rangoon depois que a cidade, que amanheceu agitada, viu suas ruas subitamente se esvaziarem por volta das 10h, horário marcado para começar o protesto.

A junta ameaçou confiscar produtos de estabelecimentos que fechassem as portas e alertou que manifestações ou exibições de "propaganda antimilitar" poderão levar a acusações de traição e terrorismo. O governo diz que dez pessoas foram presas em Rangoon. "Podemos ser presos e passar a vida na cadeia se tivermos sorte. Ou torturados e mortos se não tivermos sorte", disse o ativista Nan Lin.

Imagens veiculadas em redes sociais mostraram ruas tranquilas em várias cidades do país. Portais de notícias também registraram manifestações em apoio aos militares na capital, ​Naypyitaw, onde milhares compareceram a um comício com faixas em apoio ao chefe da junta. Episódios de violência se tornaram comuns em Mianmar desde que Suu Kyi, vencedora do Nobel da Paz, e colegas de partido foram presos depois de vencer as eleições de 2020, que os militares acusaram de fraude.

Em reação, houve greves e protestos, que levaram à morte de cerca de 1.500 civis, além de prisões ilegais de 11.787 pessoas, segundo dados divulgados pela ONU nesta terça —os militares contestam as cifras.

A pressão aumenta contra a ditadura, investigada pela ONU por crimes contra a humanidade. Países como EUA, Reino Unido e Canadá aproveitaram o aniversário do golpe para impor novas sanções contra a junta militar que assumiu o poder e pediram uma suspensão da venda de armas para o governo.

"A justiça internacional tem memória muito longa, e um dia os autores dos mais graves crimes cometidos em Mianmar serão responsabilizados", disse Nicholas Koumjian, diretor do Mecanismo de Investigação Independente da ONU para Mianmar. A iniciativa, criada em 2018, tem mandato para compilar evidências de crimes internacionais cometidos em Mianmar e que o direito internacional foi violado.

Nesta terça, o presidente americano, Joe Biden, afirmou que, "enquanto o regime privar o povo de Mianmar de sua voz democrática, faremos com que os militares e seus apoiadores paguem por isso". As sanções anunciadas por Washington afetam sete pessoas e duas entidades, informou o Departamento do Tesouro.

Entre eles estão os principais funcionários da Justiça do país: o procurador-geral, Thida Oo, o presidente da Suprema Corte, Tun Tun Oo, e o chefe da comissão anticorrupção, Tin Oo, vinculados ao julgamento de Suu Kyi. Países do Sudeste Asiático iniciaram um esforço para resolver a crise, mas não houve avanços.

Tom Andrews, especialista em direitos humanos da ONU em Mianmar, afirmou que a junta militar está funcionando como uma empresa criminosa. "A comunidade internacional deve tomar medidas fortes e significativas para cortar o acesso da junta a armas, fundos e legitimidade", disse ele.

Os militares acusaram a ONU de parcialidade e interferência e se recusam a ceder à pressão internacional. Após décadas no comando do país depois de um golpe em 1962, os militares começaram a se retirar da política em 2010, libertando Suu Kyi da prisão domiciliar em que estava havia 15 anos.

O partido da líder civil formou um governo após as eleições de 2015, mas foi obrigado a dividir o poder com o exército, até que os militares encerraram abruptamente o processo de abertura há um ano. Desde então, a economia entrou em colapso e há cortes regulares de energia e restrições de acesso à internet.

O governo tem repetido o compromisso de convocar eleições "livres e justas" em agosto de 2023 caso a estabilidade seja restabelecida, voltou a dizer na terça o jornal estatal Global New Light of Myanmar. Suu Kyi, 76, está sendo julgada por mais de uma dúzia de crimes, que podem somar até 150 anos de prisão —acusações que críticos dizem ter como objetivo garantir que ela nunca mais retome a atividade política.

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