Liz Truss fala em erros, pede desculpas e descarta renúncia no Reino Unido

Troca de ministro não aplaca crise, e primeira-ministra se torna alvo de oposição e do próprio partido após se ausentar de debate

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Londres | Reuters

Entre o comunicado da renúncia de Boris Johnon e a posse, em seu lugar, de Liz Truss como primeira-ministra no Reino Unido passaram-se dois meses. Em menos tempo que isso a líder britânica conseguiu se afundar em uma crise tão ou mais grave do que aquelas cujo acúmulo levaram à queda do antecessor.

Nesta segunda-feira (17), Truss adotou uma retórica a que Boris também recorreu: pediu desculpas pelo que chamou de erros e negou que pretenda deixar o cargo. As declarações foram dadas à rede BBC ao final de um dia em que ela agravou as críticas que vinha recebendo, da oposição e mesmo de correligionários, por seu pacote econômico agora revertido.

"Eu assumo a responsabilidade e quero pedir desculpas por erros que foram cometidos", afirmou. "Eu queria agir para ajudar as pessoas com suas contas de energia e para lidar com a questão dos altos impostos, mas fomos longe demais e rápido demais."

Primeira-ministra do Reino Unido, Liz Truss, em sessão do Parlamento do Reino Unido
Primeira-ministra do Reino Unido, Liz Truss, em sessão do Parlamento do Reino Unido - Parlamento do Reino Unido -17.out.22/AFP

Truss assumiu em setembro, prometendo reformas fiscais e cortes de impostos para conter a alta da inflação no país, puxada pelo aumento nos custos da energia —reflexos de uma tendência global desencadeada pela Guerra da Ucrânia, mas também dos planos de recuperação econômica pós-Covid.

Adiado em meio ao luto pela morte da rainha Elizabeth , o plano, porém, foi rejeitado por investidores e políticos, derrubando o valor da libra e os preços dos títulos do governo e forçando o Banco da Inglaterra a intervir para proteger fundos de pensão. A reação só começou a ser contida quando Truss anunciou a suspensão do programa fiscal, demitiu o ministro das Finanças Kwasi Kwarteng e nomeou para o cargo Jeremy Hunt, aliado de Rishi Sunak, seu adversário na campanha.

Nesta segunda, o novo titular reverteu quase todo o miniorçamento da primeira-ministra e optou por limitar o vasto plano de subsídio à energia, dizendo que o país precisa recuperar a confiança dos investidores e gerar estabilidade. As mudanças nos cortes de impostos planejados levantarão 32 bilhões de libras (R$ 190,1 bilhões) por ano, e cortes de gastos do governo ajudarão a reduzir um buraco nas finanças públicas.

Na entrevista à BBC, a primeira-ministra prometeu que o programa de subsídios para aliviar a conta de luz —que duraria dois anos e agora deve durar só até abril de 2023— vai garantir "a proteção dos mais vulneráveis no próximo inverno [do hemisfério Norte]".

Truss disse ainda que nomeou Hunt porque sabia que precisava mudar a direção de sua gestão. "Teria sido completamente irresponsável da minha parte não agir no interesse nacional da maneira que agi. Foi o certo mudar a política [econômica]", afirmou, ao ser perguntada se seria a primeira-ministra apenas no nome —ou seja, sem poder.

Mais cedo, ela ouviu críticas de opositores de que estava deixando um vácuo de poder no Reino Unido. Isso porque se ausentou da maior parte do debate no Parlamento. Coube à líder do governo no Legislativo, Penny Mordaunt, responder às críticas. Segundo ela, a ausência de Truss se dava por "questões urgentes" —justificativa que arrancou risadas de parlamentares.

"É hora de os líderes liderarem, mas onde está a primeira-ministra?", questionou o líder trabalhista, Keir Starmer. Outros opositores a acusaram de "estar com medo da própria sombra".

Mordaunt, por sua vez, respondeu que Truss "não estava debaixo de uma mesa". A líder do governo ainda disse que a decisão de suspender o corte dos impostos "teria sido muito difícil [para a primeira-ministra], política e pessoalmente". "No entanto, ela aceitou e o fez porque é do interesse nacional", acrescentou.

Mordaunt chegou a disputar a liderança do partido com Truss e Sunak, após a renúncia de Boris.

A primeira-ministra voltou ao Parlamento apenas no final do debate, para ouvir a declaração do novo ministro das Finanças. Ela, porém, não falou e ficou menos de meia hora na sessão. Segundo o jornal britânico The Guardian, sua ausência se deveu a um encontro com Graham Brady, que chefia o colegiado do Partido Conservador encarregado de conduzir as disputas da liderança da legenda.

Fontes do jornal disseram que a reunião não era emergencial e já estava planejada, mas outros veículos já noticiam que os parlamentares estudam iniciar um processo de destituição da primeira-ministra ainda nesta semana.

Uma saída dela do cargo precisa reunir 54 cartas de correligionários pedindo a votação de uma moção de confiança, a qual precisaria do apoio de mais da metade dos conservadores —180 cédulas. Boris passou pelo processo pouco antes de renunciar e sobreviveu.

Nesta segunda, Truss minimizou o risco de deixar o posto. "Vou continuar, porque fui eleita para comandar esse país e é isso que estou determinada a fazer", disse à BBC, prometendo se manter como primeira-ministra até as próximas eleições gerais,

Segundo a imprensa britânica, Graham Brady também estaria se mostrando reticente com uma possível nova mudança na liderança do partido, destacando que Truss e Hunt merecem a chance de definir uma estratégia econômica até 31 de outubro, quando será apresentado o plano fiscal para os próximos meses.

Enquanto isso, continua a transmissão ao vivo do tabloide Daily Star que, inspirada em um questionamento da revista The Economist, promove uma corrida para ver quem dura mais: Truss, que seria uma das mais voláteis primeiras-ministras, ou um pé de alface.

Tabloide Daily Star transmite vídeo de uma alface ao lado de uma fotografia da primeira-ministra britânica, Liz Truss, com a pergunta: 'Liz Truss consegue durar mais que essa alface?' - Reprodução/Daily Star no YouTube
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