Campanhas políticas nos EUA recorrem a influenciadores digitais para passar suas mensagens

Estrategistas dizem que uso de personalidades da internet aumenta engajamento e pode definir disputas eleitorais

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Stephanie Lai
Washington | The New York Times

Entre posts fazendo exercícios, Ky’Wuan Dukes, 20, jogador de futebol americano na Universidade Johnson C. Smith, diz a seus 21 mil seguidores no Instagram que eles precisam votar.

Ele também já se manifestou sobre controle de armas e direito ao aborto, parte de uma campanha da qual é pago para participar pelo comitê de ação política (PAC) e grupo de defesa democrata NextGenAmerica.

Jogador de futebol americano e influenciador digital, Ky'wuan Dukes, 20, em Charlotte, na Carolina do Norte
Jogador de futebol americano e influenciador digital, Ky'wuan Dukes, 20, em Charlotte, na Carolina do Norte - Logan R Cyrus - 27.out.22/The New York Times

Luke Stone, participante do reality show "Bachelor in Paradise", compartilhou com seus 33 mil seguidores um anúncio sobre direitos reprodutivos das mulheres pago por outro PAC democrata, American Bridge.

E, em julho, Grace Hunter, que tem 4 milhões de seguidores no TikTok, publicou um vídeo mostrando as respostas que recebeu num aplicativo de namoro quando perguntou às pessoas com quem ela deu "match" qual era a opinião delas sobre o aborto. Então, como parte de uma campanha patrocinada intitulada "Hot Girls Vote" (garotas sexies votam), ela incentivou seus seguidores a irem às urnas votar.

Esses influenciadores digitais e microinfluenciadores —pessoas que não são celebridades mas que atraem um número relativamente grande de seguidores nas redes sociais— estão recebendo centenas e às vezes milhares de dólares por publicação para difundir mensagens políticas.

Eles integram um grupo crescente de pessoas pagas por operadores de campanhas políticas para criar conteúdos que visam a influenciar as midterms, as eleições de meio de mandato nos EUA.

De acordo com pesquisadores, firmas políticas, principalmente as que se alinham com os democratas e com causas progressistas, têm se voltado cada vez mais aos influenciadores digitais, numa tentativa de alcançar os eleitores da geração Z e os que não falam inglês. Os influenciadores representam uma maneira nova e não regulamentada de promover mensagens políticas.

Estrategistas dizem que o uso de influenciadores digitais pode aumentar o engajamento das campanhas com eleitores cruciais que podem definir os rumos de disputas apertadas. Eles são uma maneira de baixo custo de se comunicar com plateias grandes e localizadas, algo que atrai engajamento maior e contorna a proibição de divulgação de propaganda política em plataformas como Twitter, TikTok e Instagram.

"Os influenciadores digitais conhecem seu público melhor que ninguém", diz Jessica Floyd, presidente do American Bridge. "Eles dialogam com pessoas todos os dias sobre assuntos que interessam às pessoas."

Os eleitores jovens tendem a favorecer os democratas, tendo votado em Joe Biden na última eleição presidencial por uma margem de 60% contra 36% para Donald Trump. Mas formam a faixa etária que tem maior probabilidade de não comparecer para votar. Numa pesquisa New York Times/Siena College feita em setembro, apenas 30% dos eleitores jovens disseram ter "quase certeza" de que votarão nas midterms.

A People First, firma de viés progressista especializada em parcerias com influenciadores, constatou num estudo que 43% dos entrevistados confiam mais nos influenciadores que nas próprias campanhas.

O CEO Curtis Hougland disse que a People First trabalhou com cerca de 10 mil influenciadores neste ciclo eleitoral para cobrir sete disputas para o Congresso e uma dúzia de outras campanhas ao nível estadual.

O PAC NextGen separou US$ 2 milhões para custear sua estratégia digital e seus programas com influenciadores digitais, nos quais formou parcerias com atletas universitários e usuários do TikTok. Como parte do acordo, os influenciadores precisam revelar que as publicações são pagas e por quem.

O PAC Democratic Majority Action concentrou seus esforços nas disputas para o Congresso nos estados de Wisconsin e Pensilvânia, oferecendo a influenciadores digitais entre US$ 300 e US$ 500 por cada publicação, disse Sannie Overly, ex-deputada estadual pelo Kentucky que lidera a organização.

E algumas campanhas contrataram influenciadores digitais para integrar suas equipes, reconhecendo o poder dado por uma grande base de seguidores em redes sociais para difundir suas mensagens.

Luke Stone, participante dos reality shows 'Bachelorette' e 'Bachelor no Paraíso', em sua casa em Los Angeles
Luke Stone, participante dos reality shows 'Bachelorette' e 'Bachelor no Paraíso', em sua casa em Los Angeles - Bethany Mollenkof - 27.out.22/The New York Times

Muitas organizações exigem que os influenciadores que eles pagam para emitir publicações revelem que o material é patrocinado. Mesmo assim, as parcerias criam dilemas, já que nunca foi publicada uma orientação federal sobre aspectos específicos de anúncios políticos publicados por influenciadores.

Na prática, isso significa que usuários e campanhas políticas só têm um dever de honra de divulgar quando um conteúdo foi pago por uma campanha ou organização política. Especialistas receiam que esse fato possa exacerbar a disseminação de desinformação e a difusão de mensagens políticas dúbias.

G.L. DiVittorio, 27, é uma tiktoker que tem uma conta política chamada The Pocket Report e já formou parceria com grupos de defesa para criar conteúdos. Para ela, essa área toda é como um "Velho Oeste".

Ela diz que as empresas de mídia social e as firmas políticas ainda estudam como implementar regras de divulgação. PACs como a PeopleFirst reveem publicações de seus influenciadores digitais antes de elas serem colocadas no ar para assegurar que o usuário tenha divulgado que o conteúdo foi pago, segundo Hougland, mas em geral não mexem na mensagem, para que ela possa seguir personalizada e genuína.

A Comissão Eleitoral Federal (FEC), que fiscaliza a lei de financiamento de campanhas, incluindo a publicidade política, não prevê regulamentos específicos para influenciadores digitais, de modo que eles não estão sujeitos às mesmas normas aplicadas à publicidade tradicional, como anúncios de televisão e rádio, que devem obrigatoriamente revelar quem pagou pelo conteúdo.

Os comitês de ação política precisam informar como gastam seu dinheiro, mas não são obrigados a revelar os nomes de influenciadores digitais ou contas individuais com quem têm parcerias. E as pessoas que recebem dinheiro de campanhas ou PAC não têm a obrigação legal de informar o que recebem.

Segundo dados da FEC, campanhas e PACs já gastaram mais de US$ 300 milhões neste ciclo eleitoral com consultoria e publicidade digital e em plataformas sociais. É impossível discernir quanto disso foi pago diretamente a influenciadores digitais, porque os PACs e as campanhas geralmente pagam firmas que então contratam o trabalho dos influenciadores.

Plataformas como Twitter e TikTok proibiram anúncios políticos. O TikTok proibiu até anúncios políticos de influenciadores digitais pagos. Mas Eric Han, diretor de segurança nos EUA da plataforma, admitiu em nota antes das midterms que publicidade política de influenciadores não informada ainda é um problema.

Mesmo quando as empresas de mídia social tentam identificar conteúdos políticos patrocinados, pode ser difícil determinar se um post é pago ou se apenas reflete as posições do usuário, diz Laura Edelson, codiretora de cibersegurança para a democracia na Escola Tandon de Engenharia da New York University.

Segundo ela, o monitoramento de conteúdos políticos publicados por influenciadores digitais muitas vezes deixa a desejar, porque "os conteúdos de influenciadores rompem completamente com o modelo".

Tradução de Clara Allain

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