Descrição de chapéu Folha Mulher aborto

ONG de pilotos de avião nos EUA leva grávidas a estados onde aborto é permitido

Elevated Access transporta mulheres em aviões particulares e arca com altos custos da operação

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Washington

Um ano após a Suprema Corte decidir que os americanos não têm um direito constitucional ao aborto, indivíduos e a sociedade civil vêm se unindo para ajudar mulheres a abortar. São coletivos que discordam da interpretação dos juízes e dizem que existe, sim, o direito de decidir quando interromper uma gravidez.

A recém-fundada Elevated Access, por exemplo, transporta grávidas em aviões particulares até estados onde o aborto é permitido. Os pilotos são todos voluntários e arcam com os altos custos.

Manifestante pró-aborto exibe cartaz com a frase 'homens de bem apoiam igualdade para mulheres' em protesto no dia em que a decisão da Suprema Corte contrária ao aborto completou um ano, em Washington
Manifestante pró-aborto exibe cartaz com a frase 'homens de bem apoiam igualdade para mulheres' em protesto no dia em que a decisão da Suprema Corte contrária ao aborto completou um ano, em Washington - Andrew Caballero-Reynolds - 24.jun.23/AFP

A Suprema Corte havia decidido, em 1973, que o governo não podia interferir numa gestação. A decisão, conhecida pelo nome do caso Roe v. Wade, foi entendida como um direito ao aborto.

Em uma guinada conservadora, porém, a corte reverteu, em junho de 2022, sua interpretação. Hoje, 13 estados —entre os quais Kentucky, Louisiana e Texas— banem a prática, salvo raras exceções. Outros tantos têm restrições parciais. Na Carolina do Norte, por exemplo, mulheres não podem abortar após 12 semanas de gravidez.

Segundo relatório publicado pela Human Rights Watch em abril, cerca de 22 milhões de americanas em idade reprodutiva vivem em estados onde há duras restrições ao aborto. Para a organização, o cenário ameaça a saúde das mulheres —por exemplo, elevando a taxa de mortalidade na maternidade.

Assim, algumas mulheres têm viajado para ter acesso ao aborto em outros estados, onde muitas vezes não conhecem ninguém. Os EUA são um dos países mais extensos do mundo, e as viagens envolvem tempo e dinheiro que muitas não têm. Diante dessa situação, um piloto chamado Mike decidiu criar o Elevated Access. Chamou colegas e começou a organizar voos para ajudar essas mulheres a abortar.

Como a situação é delicada, o sobrenome de Mike segue em sigilo, assim como o de sua porta-voz Fiona, que falou com a Folha alguns estados punem quem ajudar mulheres a chegar às clínicas de aborto.

O Elevated Access trabalha em parceria com clínicas de aborto, que lhes encaminham seus pacientes. Os contextos são variados. Fiona menciona casos de vítimas de violência doméstica e sexual, que decidem não ter uma criança —mas não conseguem arcar sozinhas com uma viagem, cruzando estados.

A organização tem crescido. A ideia inicial era ter 12 pilotos. Mike colocou um post numa rede social e diz ter recebido dezenas de respostas. O Elevated Access afirma ter hoje 1.300 pilotos e 2.500 doadores.

Há também uma centena de voluntários, como a porta-voz, para burocracias. Fiona diz que essas cifras dão conta do quão impopular foi a decisão judicial. Foi impopular em alguns círculos, mas segue popular em outros: houve celebrações quando, no último dia 24, a queda do Roe v. Wade completou um ano.

Uma pesquisa do Gallup aponta que 34% dos americanos afirmam que a prática deveria ser legal em qualquer circunstância; 51%, legal em algumas circunstâncias apenas; e 13%, nunca deveria ser legal. A sondagem sugere ainda que 52% dizem que o aborto é moralmente aceitável. O Gallup ouviu 1.011 adultos de 1 a 14 de maio pelo telefone. A margem de erro é de 4 pontos percentuais, para baixo ou para cima.

Os membros do Elevated Access evitam dar muita informação —à imprensa e uns aos outros. Pilotos não sabem o nome do passageiro nem se estão levando uma médica ou uma mulher em busca de aborto.

Os voluntários usam seus próprios aviões e não cobram nada. Arcam, ainda, com centenas de dólares de combustível. Como as aeronaves são pequenas, é preciso fazer paradas e se coordenar com outros voluntários, no caminho. O serviço deve ficar ainda mais popular no futuro, com a perspectiva da chegada de novas restrições ao país. A Flórida, por exemplo, aguarda a decisão de uma corte estadual para impedir o aborto depois da sexta semana de gravidez —o que ativistas consideram uma proibição virtual de qualquer aborto, já que muitas mulheres nem sabem que estão grávidas nesta etapa da gestação.

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