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Quênia suspende envio de policiais ao Haiti após renúncia de premiê

País africano diz não poder seguir com envio de agentes depois de 'ruptura total da lei e da ordem' em Porto Príncipe

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Boa Vista

O Quênia suspendeu o envio de 1.000 policiais ao Haiti previsto como parte da missão multinacional aprovada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, informou nesta terça-feira (12) o Ministério das Relações Exteriores de Nairóbi.

Korir Singoei, primeiro secretário da pasta no país africano, afirmou que houve uma "mudança fundamental nas circunstâncias como consequência da ruptura total da lei e da ordem e da posterior renúncia do primeiro-ministro do Haiti".

Na noite desta segunda-feira (11), o premiê haitiano, Ariel Henry, anunciou sua renúncia em meio ao aprofundamento agudo da crise securitária e política no país, mergulhado em caos devido a confrontos entre a polícia e gangues armadas, que ameaçaram "guerra civil" caso Henry não deixasse o cargo.

Membros da Polícia Nacional do Haiti na capital Porto Príncipe em meio a crise de violência
Membros da Polícia Nacional do Haiti na capital Porto Príncipe em meio a crise de violência - Clarens Siffroy - 9.mar.2024/AFP

"Sem uma administração política no Haiti, não há nenhum alicerce sobre o qual o envio de policiais possa se apoiar. Portanto, o governo aguardará a instalação de uma nova autoridade constitucional no Haiti antes de tomar novas decisões a esse respeito", acrescentou Singoei.

O secretário da chancelaria queniana assegurou, porém, que o país continua comprometido em "fornecer liderança" à missão internacional, aprovada pelo Conselho de Segurança da ONU em outubro, e que teria Nairóbi como cabeça.

Após o anúncio do Quênia, os Estados Unidos afirmaram que não viam a necessidade de adiar a missão. "Claro, eu ficaria preocupado com qualquer atraso, mas não acreditamos que isso seja necessário", disse a jornalistas o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller.

Henry será substituído por um "conselho de transição presidencial" cujo objetivo é abrir caminho para as primeiras eleições no país desde 2016.

Além de políticos, membros de diversos grupos sociais, como a iniciativa privada, a sociedade civil e entidades religiosas devem integrar o colegiado. Suas tarefas incluem a nomeação de um primeiro-ministro interino e de um gabinete, além do estabelecimento de um órgão eleitoral provisório para facilitar o pleito presidencial no futuro.

A missão multinacional para o Haiti foi pedida pelo próprio Henry, impopular e criticado pela população e pelos grupos armados, e aprovada em outubro passado pelo Conselho de Segurança da ONU depois de polarizada negociação e seis anos após o fim da Minustah, a missão de paz da organização liderada pelo Brasil.

De lá para cá, o Haiti só viu recrudescer a violência que assola principalmente a capital, Porto Príncipe, e deteriorar as condições políticas e institucionais —o país caribenho é amplamente reconhecido como um Estado na prática falido ou inexistente e é palco de grave e persistente crise humanitária entrelaçada à brutalidade das gangues.

No último dia 3, milhares de presos fugiram de uma prisão na capital depois que grupos armados invadiram o local e libertaram quase todos os detentos. O país decretou estado de emergência e toque de recolher em Porto Príncipe após a fuga.

A missão multinacional atual, entretanto, difere significativamente daquela protagonizada pelo Exército brasileiro, a começar pelo seu aspecto policial e não militar: não está previsto o envio dos capacetes azuis da ONU, mas de forças policiais de outros países para treinar a Polícia Nacional do Haiti e compor as forças de segurança e o comando técnico de operações.

A liderança queniana da missão ora suspensa é resultado de oferta do próprio presidente da nação africana, William Ruto, que tem visto obstáculos à proposta dentro e fora do país.

A espiral de violência e dificuldades institucionais de Henry é a mais imediata, já que a missão foi aprovada para funcionar em cooperação com o governo haitiano, agora de fato inapto para tal após a renúncia.

A oposição queniana tem contestado a decisão em tribunais, e a Justiça vetou o envio de policiais no fim de janeiro sob o argumento de que a ausência de um acordo com o Haiti tornava a medida inconstitucional. No dia 1º de março, Ruto e Henry anunciaram um trato para contornar o argumento.

A missão também tem sofrido com a falta de apoio internacional. Além dos mil agentes oferecidos pelo Quênia, apenas o Benin (1.500) e Bahamas (150) anunciaram o envio de policiais para compor a operação. Chade, Bangladesh, Barbados, Suriname e Antigua e Barbuda também afirmaram que irão fornecer agentes, mas não especificaram quantos.

Financeiramente, o cenário também é ruim. O fundo estabelecido para a missão tinha, até o último dia 5, apenas US$ 78 milhões formalmente anunciados e menos de US$ 11 milhões de fato depositados, segundo porta-voz da ONU.

Nesta segunda, o chefe da diplomacia dos EUA, Antony Blinken, afirmou que Washington contribuiria com mais US$ 100 milhões, além de US$ 33 milhões para ajuda humanitária ao Haiti. Ele esteve em Kingston, na Jamaica, em encontro de emergência da Comunidade do Caribe (Caricom) para discutir a crise haitiana.

O Itamaraty anunciou nesta terça que suspendeu o atendimento presencial consular na embaixada em Porto Príncipe desde o último dia 4 em meio à crise.

"A embaixada, com o objetivo de minimizar os riscos à vida e segurança do público e dos funcionários da repartição, viu-se obrigada a suspender, desde o último dia 4 de março, o atendimento presencial do seu Setor Consular. A Embaixada segue funcionando e monitora permanentemente a evolução da crise", diz nota divulgada nesta terça pelo ministério.

Com AFP e Reuters

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