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Roberto Livianu

Desqualificação da defesa da sociedade

Não houve o cuidado de examinar supostas provas

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O promotor de Justiça Roberto Livianu - Zanone Fraissat - 12.abr.18/Folhapress

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Eram previsíveis terríveis reações a partir do momento em que membros do sistema de Justiça e da Receita Federal se deram conta da magnitude do alcance dos fatos apurados pela Lava Jato, que nos seus mais de cinco anos viveu por um fio, sob ataque permanente por ter investigado, processado e punido aqueles que sempre se consideraram intocáveis.
 
Já se pretendeu proibir por lei delações premiadas de presos, ao arrepio do princípio constitucional da isonomia, assim como criminalizar membros da magistratura em virtude da mera interpretação da lei, o que o mundo ocidental democrático aboliu há séculos, a partir da consolidação dos ideais iluministas.

Eis que agora o site The Intercept divulga o suposto fruto de devassas ilegalmente feitas por hackers em aparelhos de celulares de membros do Ministério Público Federal (MPF) e do então juiz Sergio Moro. E, imediatamente, já se formulam pedidos de anulação de provas e de solturas imediatas de condenados.

Não houve o cuidado de examinar profundamente tais “novos elementos de prova”, desconsiderando que acusações foram julgadas nas quatro instâncias, não sendo as condenações obra de um único indivíduo, mas, sim, fruto da análise criteriosa da Justiça, observado o devido processo legal, o duplo grau de jurisdição e a inexistência da previsão legal do direito à impunidade.

Além de se tratar de prova ilícita, vale destacar em caráter hipotético que sequer há condições para sabermos se tais diálogos tiveram divulgação seletiva, se são íntegros ou foram mutilados ou adulterados. No entanto, ocorre que —além de ser criminosa a invasão a diálogos privados, bem como sua divulgação— não se sabe com segurança quem os obteve e quem deles participou.

Ademais, para argumentar, ainda que não recomendáveis, tais diálogos, como foram divulgados, não revelam conluio devastador entre o órgão que defende a sociedade e o que julga para que possa gerar a conclusão apressada de quebra de imparcialidade do atual ministro Sergio Moro e da necessidade inexorável de rever processos já examinados em todas as instâncias. 

É comum e razoável que, no dia a dia da distribuição da Justiça, magistrados dialoguem com procuradores e com advogados, especialmente numa situação como esta em que se constituiu uma força-tarefa, com trabalhos realizados de forma colaborativa entre MPF, Polícia Federal, magistratura e Receita Federal.

Enfatiza-se a importância do pleno cumprimento dos papéis do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que podem e devem agir, sempre de forma cautelosa diante das circunstâncias, sendo de bom alvitre, antes de mais nada, pedir informações detalhadas aos mencionados. 

Sem a pretensão de querer defender os envolvidos, merece aplausos o trabalho feito pela Lava Jato, que mudou nossa história no combate à corrupção e reversão da impunidade. Não é tolerável a velha estratégia de desqualificar quem defende a sociedade quando é impossível enfrentar a robustez das provas incriminatórias.

Roberto Livianu

Procurador de Justiça e doutor em direito pela USP, é idealizador e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção

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