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André Czitrom

A ineficiência como vilã da habitação em São Paulo

Prédio que desabou simboliza falta de agilidade na gestão pública

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A cidade de São Paulo pode perder, mais uma vez, a chance de dar um passo transformador no uso do centro da cidade. Desde que o edifício Wilton Paes de Almeida desabou, em maio de 2018, no largo do Paissandu, muito foi dito sobre os problemas que levaram à queda, mas pouco se discutiu sobre o que poderia ser feito dali em diante.

A presença do entulho que permanece no terreno, como noticiou reportagem desta Folha em 8 de janeiro, sinaliza um dos maiores problemas para o desenvolvimento do centro da metrópole: o excesso de amarras legais e burocráticas.

André Czitrom é CEO da Magik JC, incorporadora focada na implantação de projetos Minha Casa Minha Vida no centro de São Paulo
O empresário André Czitrom, presidente da Magik JC - Divulgação

A prefeitura anunciou para o terreno a construção de um prédio com 56 unidades dentro do recém-anunciado programa Pode Entrar. Os detalhes do projeto ainda não foram divulgados, mas como exercício podemos supor que os apartamentos terão a mesma metragem média de empreendimentos realizados nesse tamanho de terreno pela gestão pública, que é de aproximadamente 40 m², totalizando cerca de 2.200 m² de área construída útil. O Wilton Paes era um prédio de 24 andares e 12 mil m² de área construída, mais de cinco vezes o que se pretende de seu substituto.

Ele foi erguido numa época onde uso e ocupação de solo privilegiava justamente o que se deveria mirar hoje: um adensamento maior, permitindo que mais pessoas trabalhem ou vivam no mesmo empreendimento a ser construído. Fazendo uma matemática rápida, seria possível incluir na versão antiga 300 unidades com o mesmo perfil das 56 que o município propõe erguer ali agora. E mesmo se não for utilizado o potencial construído do projeto original, o lote está inserido dentro da Operação Urbana Centro, que já possibilita a construção de seis vezes a área do terreno, resultando em um total de unidades muito maior do que 56.

O novo edifício enfrentará ainda deliberações dos órgãos de patrimônio que analisarão as restrições causadas pelo tombamento do entorno, como o do bairro vizinho de Santa Ifigênia . O mesmo problema se repete com a vizinhança do Parque Dom Pedro e da Liberdade.

Há, no Brasil, um perigoso preciosismo de tombar por tombar sem pensar nos usos futuros. A consequência desse engessamento é impedir que se alcance justamente o objetivo inicial de preservar, condenando boa parte do nosso patrimônio à degradação. Temos excelentes equipes atuando no Condephaat e no Conpresp, respectivamente órgãos estadual e municipal, que merecem confiança da sociedade e autonomia para propor e implantar novas fórmulas de convivência entre o novo e o antigo.

Não se trata de permitir ou liberar qualquer tipo de atividade ou construção, e sim de estudar e estabelecer, de forma rápida e prática, restrições e legislação que permitam novos usos —pois nem isso hoje é possível.

O que parece inviável é deixar sob responsabilidade apenas do poder público a criação de soluções de moradia popular. A iniciativa privada tem o expertise, foco e tempo para isso, podendo contribuir através de parcerias para liberar o Estado para pensar a forma de legislar a favor do desenvolvimento sustentável e equilibrado.

Já temos vários casos bem-sucedidos de cooperação entre empresas e governo, como os próprios programas de habitação Minha Casa, Minha Vida (PPP ou empreendimentos privados com subsídios), do governo federal; Nossa Casa, do governo paulista; e, agora, torçamos pelo Pode Entrar, da gestão municipal.

Todos podem e devem ser aprimorados, mas já existem como ponto de partida. Inaceitável é levarmos dois anos para decidir o que fazer com o terreno de um prédio que desabou justamente pela falta de agilidade na política pública.

André Czitrom

Presidente da Magik JC, incorporadora que atua na implantação de projetos do programa Minha Casa, Minha Vida no centro de São Paulo

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