Resultado da paralisação dos caminhoneiros de maio de 2018, a esdrúxula tabela de preços mínimos para o frete rodoviário se aproxima de completar dois anos sem que haja sinais de maior racionalidade no enfrentamento do problema.
Neste fevereiro, como havia feito em setembro do ano passado, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, adiou o julgamento de ações que questionam a constitucionalidade do dispositivo, movidas por entidades do empresariado. Ficou marcada para 10 de março uma audiência de conciliação entre as partes.
O ministro do STF atendeu a um pedido do governo Jair Bolsonaro —que está longe de ser um agente de moderação nesse debate.
Quando presidenciável, Bolsonaro apoiou de início o movimento dos caminhoneiros. Quando já se faziam evidentes os impactos traumáticos sobre o abastecimento e a economia, pediu o fim da paralisação. Sua aliança com a categoria, entretanto, permanece.
Ela se reflete, por exemplo, no empenho que o presidente dedica a investidas temerárias contra multas de trânsito e radares de controle de velocidade em estradas, felizmente contidas pelo Legislativo e pelo Judiciário.
Neste mês, o populismo rodoviário de Bolsonaro se manifestou em um desafio farsesco aos governadores pela eliminação simultânea dos tributos federais e estaduais sobre os combustíveis —cujo encarecimento mantém elevada a insatisfação dos caminhoneiros.
Mais recentemente, o chefe do Executivo fez aceno também aos taxistas, com a demissão espalhafatosa do comando do Inmetro. “Mandei todo mundo embora”, gabou-se, relatando que o órgão federal decidira fazer uma imposição —de fato questionável— de troca de tacógrafos.
Esse voluntarismo bravateiro em nada contribui para um desfecho sereno dos processos relativos à tabela do frete, ainda mais porque parece provável que a medida, digna de uma burocracia soviética, venha a cair no STF.
A oficialmente chamada Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas constitui, afinal, ingerência do Estado numa atividade essencialmente privada, o que só se justifica em situações excepcionais como a concessão de serviços públicos ou a formação de oligopólios.
Caminhoneiros têm feito protestos pontuais e especulado sobre nova paralisação em redes sociais. A negociação é complexa em razão da pulverização de lideranças e do poder de fogo da categoria.
Tudo fica mais difícil quando o presidente demonstra que seus instintos corporativistas e intervencionistas sobrevivem à agenda liberal de seu governo.
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