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Rodrigo De Losso

O auxílio emergencial deveria ser prorrogado em 2021? NÃO

Sem ajustes, gerações futuras pagarão pela irresponsabilidade presente

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Rodrigo De Losso

Doutor pela Universidade de Chicago, é professor titular do Departamento de Economia da USP

A pandemia de Covid-19 promoveu uma situação ímpar e requereu a adoção de medidas extremas: o confinamento horizontal obrigatório da população, seguido de restrições de atividades econômicas. Como resultado, muitas pessoas ficaram sem sustento e, por isso, demandaram ações como o auxílio emergencial.

O auxílio emergencial começou com R$ 600 mensais, tendo sido reduzido em setembro a R$ 300, com algumas exceções como mães solteiras. A ideia foi a de minimizar os efeitos da pandemia, especialmente nas populações mais vulneráveis.

O auxílio foi um sucesso em várias dimensões. Manteve ou estimulou o nível de consumo das pessoas, reduziu a miséria e aumentou a popularidade do presidente da República.

Entretanto, passado o desespero inicial, é hora de avaliar os efeitos dessa política no presente e no futuro e tomar as medidas necessárias para restabelecer a normalidade ao país.

Em primeiro lugar, parece que o auxílio emergencial excedeu às reais necessidades da população vulnerável. Prova disso é que, no mês de agosto deste 2020, essa mesma população estava recebendo 138% do seu rendimento médio habitual.

Em segundo lugar, o Brasil gastou 10% do PIB com o enfrentamento à pandemia. Peru e Chile gastaram o mesmo, porém a dívida pública/PIB é muito menor, cerca de 20% neles e 80% aqui. De fato, grande parte de países de desenvolvimento similar ao Brasil gastou menos de 5% do PIB com medidas contra a pandemia, todos eles com dívida/PIB inferiores à deste país.

Finalmente, é preciso notar que o Brasil acabará o ano com uma relação dívida/PIB de aproximadamente 100%, ante 76% em 2019. É um salto expressivo e de proporções potencialmente catastróficas. E esta é a principal razão para não prorrogar o auxílio emergencial em 2021.

A adoção das medidas iniciais excedeu a capacidade de financiamento do país. Os juros baixos ofuscam os danosos efeitos de longo prazo dessas medidas, hoje refletidas nos preços do atacado, que aumentaram cerca de 20% neste ano. A taxa de juros aumentará no ano que vem, gerando um serviço da dívida que precisará ser honrado.

Ora, se era inevitável algum paliativo, teria sido melhor algo mais prudente e contido, evitando-se a presente situação de potencial descontrole inflacionário e das contas públicas. Portanto, enquanto houve um benefício excessivo no início, inclusive com estímulo ao consumo, agora vem o inevitável custo de ajuste, a ser feito com rigor e coragem, bens escassos nestas terras.

Manter o auxílio, ainda que parcialmente, hipotecará às gerações futuras elevados custos de ajuste que o brasileiro mediano insiste em ignorar. As gerações futuras pagarão pela irresponsabilidade presente, seja pela incapacidade de enfrentar a pandemia com 10% do PIB, seja por insistir na insanidade de desequilibrar ainda mais as contas públicas para manter o auxílio, inclusive comprometendo a Lei de Responsabilidade Fiscal.

E como pagarão? Pagarão com mais impostos e menos crescimento econômico, pagarão com menos capacidade de investir, empreender e de inovar, postergando ao futuro o desenvolvimento da nação.

É preciso contrariar interesses, diminuir gastos em todos os Poderes, avançar com o plano de desestatização, planejar uma redução gradual de impostos e promover as reformas administrativa e tributária. Essas medidas mais do que compensariam a suspensão do auxílio —com a vantagem de trazer benefícios duradouros ao país.

Se tudo isso é politicamente inviável, o destino do país é este ou pior, mas a situação a que chegamos é extrema, porque perigosa e disruptiva. E situações extremas requerem medidas extremas.

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