Episódios recentes em órgãos federais atestam o ânimo incessante do governo Jair Bolsonaro de fustigar as liberdades e o conhecimento.
Apenas neste mês de março, casos inquietantes foram registrados na Universidade Federal de Pelotas, no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Na instituição de ensino superior, foram abertos processos para investigar professores que criticaram o presidente em evento transmitido pela internet; no instituto da área econômica, emitiu-se comunicado interno prevendo sanções a pesquisadores que divulguem estudos sem autorização.
Já no órgão ambiental, uma portaria passou a obrigar, a partir de abril, que a produção científica de seus quadros seja aprovada por uma diretoria antes de publicada.
Em Pelotas, as investigações foram iniciadas pela Controladoria-Geral da União com base no pressuposto de que os docentes proferiram “manifestação desrespeitosa e de desapreço direcionada ao presidente da República”.
Dois docentes, que criticaram o fato de a escolha do reitor pelo presidente não ter confirmado o nome internamente mais votado, se viram obrigados a assinar termos de ajustamento de conduta.
O Ministério da Educação, no mês passado, já havia encaminhado às universidades federais ofício —depois cancelado— solicitando providências para “prevenir e punir atos político-partidários”.
As medidas no âmbito universitário não são compatíveis com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que determinou a inconstitucionalidade de atos que atentem contra a liberdade de expressão e promovam o cerceamento ideológico em instituições de ensino.
No que tange ao Ipea e ao ICMBio, seria mais que razoável a preocupação com os corretos procedimentos para a produção intelectual de seus servidores —mas as providências tomadas parecem mais intimidação e tentação censória.
É preciso assegurar a liberdade, a autonomia e a diversidade de pensamento nos órgãos de Estado, que não deve se confundir com a politização indevida e o aparelhamento da máquina pública.
É notório que o governo Bolsonaro tem atuado com intolerável viés ideológico na área educacional e científica. As consequências desastrosas que se verificam no combate à pandemia de Covid-19 são uma evidência dessa tendência obscurantista. Sempre pronto a rejeitar o uso da máscara protetora, o atual mandatário mostra-se um entusiasta das mordaças.
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